Capítulo II - Parte 2

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   Desespero-me ao ver que o chão que piso não é de pedras, e nem de espinhos, mas sim de corpos humanos costurados uns aos outros. É macio, porém, perverso e repugnante. Sinto calafrios e medos. A estrada é rodeada por árvores secas, e corvos sobrevoam o céu. Olho rapidamente para trás e tento voltar ao caminho de antes, mas sou impedido de me virar. Por mais que eu me esforce, uma força invisível não me deixa voltar para trás. Mais uma vez tomei uma decisão errada, e agora, sou obrigado a trilhar um caminho de corpos humanos como castigo.

   Mas... A placa... Ela era bem clara. Dizia que ambos levariam ao meu destino, ao fim da minha jornada. Que destino me aguarda?

   Que Deus tenha piedade de mim!

   Sem poder retroceder ou desfazer minha decisão, eu inicio meus passos sobre os corpos de milhares de condenados. O que tais almas fizeram para merecerem tal castigo?

   Sinto nojo de mim mesmo por fazer dos copos dos outros meu chão, porém sinto alívio em meus pés, que já não sangram mais.

   Já estou a algum tempo seguindo por esse caminho tenebroso e, até agora, nada de mal me aconteceu. O que vejo, é uma paisagem desprovida de cores e vida, na qual, parece ter sido consumida pelo fogo, e agora só restaram carcaças de animais e árvores mortas nas margens da estrada. É monótono e cheira a podre.

   Recordo-me vagarosamente que, em um estágio mais calmo e límpido de minha caminhada, um homem que desconheço quem fora me acompanhava a minha direita e me dizia coisas que já não me recordo mais quais são. Estou há tanto tempo aqui que já não lembro mais qual fora a última vez que o vi. Já não reconheço mais sua voz, nem seu rosto. Devido às minhas atitudes e decisões, ele parece ter desistido de mim, e duvido que volte a aparecer em um lugar tão imundo quanto este.

   Os corvos grunhem no céu acinzentado, como se me dessem as boas-vindas a este lugar. Corvos de penas tão negras quanto o sol daqui, que parece ter se apagado, e olhos tão vermelhos quanto o sangue que minava de meus pés. Piso nas costas, no tórax, e nas faces mortas dos que agora são meu chão. Cadáveres não sentem dor, mas a cada passo que dou, sinto o peso dos meus pés em mim mesmo. E sigo andando, sem parar, temendo o que pode vir a frente.

   Durante toda a minha jornada me senti incomodado pelo fato da estrada nunca ter uma curva. Hoje, me encontro a poucos passos de uma. Aproximo-me dela com incerteza.

   Das poucas palavras de um homem de que me lembro, uma vez, ele me dissera que sempre estaria à minha direita, contanto que eu jamais duvidasse de meu caminho e sempre fizesse as escolhas certas. Assim que encontrei minha primeira dificuldade duvidei de meu caminho, e, quando precisei fazer minha primeira escolha fiz a errada. Reconheço que mereço tudo o que venha a acontecer a mim. 

No Meio do CaminhoOnde histórias criam vida. Descubra agora