Noites para Recordar

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Nós partimos debaixo de um Hork inchado, assim como Osdrid havia dito. Éramos seiscentos homens que se juntariam com outros novecentos que saíam de Forte Garand e acampariam em Aftmantir.

Eu percebia os olhares sobre mim, desde que matei os escravos. Olhares de desconfiança, suspeita, respeito e admiração. A história da morte de catorze homens pelas mãos do Meio-aço estava na boca de todos, e eu mesmo tratei de me exibir um pouco: Esqueci de mencionar que eles estavam se cagando por causa das pimentas; aumentei para cinco o número de inimigos que me cercaram de uma vez; e enfaixei um ombro para mostrar que os havia enfrentado, mesmo ferido.

Mentirinhas inocentes.

Nosso objetivo naquela expedição era simples: recuperar a ponte do rio Baldur. Uma vitória essencial para nossa campanha de conquista das Terras de Sangue, pois o rio serviria para o tráfego de nossas tropas marítimas, diminuindo o tempo de deslocamento de provisões e de reforços para nossas bases mais ao sul.

Osdrid dissera que levaríamos três dias de caminhada até Bosque Grande, onde poderíamos nos reabastecer na Fortaleza Wokden, e de lá seriam cinco dias até as planícies.

Meio círculo de Hork, pensei, será outra viagem longa.

Fora de Swiftangale não havia nada além de um vasto planalto muito irregular. Um gramado sem nenhum tipo de marca de trilha podia ser visto por todos os lados, com algumas ervas daninhas tentando sobreviver em pontos isolados. Quando o sol se aproximava do horizonte, pintava o verde de um dourado opaco, mas muito esplendoroso. À noite, o brilho dos Horks transformava tudo em cinza cintilante, quase como a prata.

Podia-se ver porque os jarls desejavam tanto aquelas terras. A vida pulsava de forma revigorante com tanta fartura de fauna, flora e solo para plantio. Apesar de ainda ser Wstengard, o clima parecia ser bem mais definido do que em qualquer outro lugar daquela ilha gigante: Neve no inverno, Sol no verão, flores na primavera e chuvas no outono; tudo bem delimitado, com poucas interferências de uma estação sobre a outra.


O percurso foi longo e entediante. Andávamos em enormes fileiras com poucas carroças puxadas por bois, levando nossos pertences: Uma enorme mancha cinza, preta e marrom no meio daquele mar verde. Em um momento estávamos em terreno baixo, em outro estávamos no alto... poucas vezes uma ruína parecida com uma casa ou cabana de madeira, com um cercado para animais era vista.

"Não acha bom darmos uma olhada?" Perguntei a Osdrid, na primeira ruína que vi.

"Você acha que é o primeiro a ter essa ideia? Essa terra já não tem nada para oferecer além dela mesma," retrucou ele.

Quando a noite do último dia chegou, eu já estava enfadado da paisagem. Descemos o último trecho elevado e vimos, a sudeste, silhuetas de árvores se adensarem, mas não muito, formando uma pequena floresta.

"Bosque Grande," disse-me Osdrid.

"Quanto tempo até a fortaleza?" Questionei.

"Não muito. Se não formos acampar, e acredito que não vamos, chegaremos pouco antes dos primeiros raios de sol." A experiência que ele tinha sobre aquelas terras era impressionante. Eu já havia dito a ele que se ele parasse com aquela mania ridícula de tirar o cabelo da testa como as garotas fazem, ele aparentaria ser um guerreiro de verdade.

Aproximamo-nos do bosque, mas sem entrar, apenas caminhamos numa trilha que se formava do lado direito. Mesmo com a luz pálida dos Horks, era possível observar as folhas dos carvalhos tornando-se secas, como prenúncio do outono. No lado oposto, um imenso campo arado servia de hospedeiro para ervas daninhas que se espalhavam como as pragas que eram.

Confissões de um Rei - ExílioOnde histórias criam vida. Descubra agora