Capítulo 7

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Eu queria logo chegar aos 13 anos, e conseguir um emprego, nem que fosse de empacotar produtos em alguma lojinha de conveniência. Eu precisava ajudá-la.

Aqueles degraus faziam mais parte da vida dela do que eu. Todos os dias mamãe corria em direção ao centro da cidade, para a mesma rotina estressante e cansativa de sempre. Sacrificava sua vida buscando melhorar a minha. Eu era o foco, a missão a ser cumprida. A menina acanhada e descuidada, filha de uma mãe solteira, iria se formar em uma boa profissão e conquistar um futuro próspero. Que teria um casamento feliz e uma família amorosa. Como se isso fosse grande coisa.

"Depois do que havia feito com Isaque, quem sabe não entro em uma gang, ou a máfia talvez. Eu seria o "orgulho", o testemunho vivo de que os esforços de minha mãe, não serviram de nada".

Mamãe havia saído às pressas enquanto eu ainda estava no banho. Eu dançava no banheiro enquanto ensaboava meus cabelos. Não pensava em outra coisa que não fosse a tal surpresa que mamãe me escondia. Naquela tarde o telefone havia tocado de uma forma mais sombria que o normal. As poucas e raras vezes que alguém nos ligava, nunca tínhamos motivos para esperar algo bom. No geral eram sempre cobranças ou ligações enganadas. Certa vez, algumas semanas depois do meu aniversario de seis anos, o telefone toca justamente quando mamãe e eu assistíamos à novela:

"Desgraçado! Escuta aqui, ou você paga o que me deve, ou serei obrigado a cobrar a divida pessoalmente. E quando faço "cobrança a domicilio" meu amigo, eu não costumo voltar com dívida pendente. Ou você me dá o dinheiro ou irei socar tanto a sua cara, que irá precisar de uma cirurgia de reconstrução facial".

Desde o inicio ao final da ligação, eu não consegui dizer uma palavra sequer. Estava muda e sem ar. O senhor tinha uma voz rouca e medonha. Parecia um macabro chefe da máfia em busca de decepar cabeças inimigas.

- Quem era Isa?

- Ni... Ninguém... Mamãe...

Ela me olhou de lado percebendo minha voz trêmula. Eu estava com medo e meu olhar chorão era o primeiro a me dedurar.

- Isa... – Ela queria a verdade.

- Um senhor dizendo que iria socar meu rosto se não desse o dinheiro dele.

Mamãe estende os braços mostrando que se eu precisasse chorar de medo, que fosse nos braços dela.

- Calma minha pequena...

Mesmo eu estando em choque, mamãe conseguiu me fazer compreender que não passava de um engano, ou um trote até. Ela me abraçou dizendo que ninguém iria ter coragem de machucar sua pequena. Disse algo sobre girar aquele senhor pelas orelhas e lançá-lo de cara na calçada.

- Ele iria ter que usar maquiagem todos os dias para esconder a cara feia. – Disse ela com uma voz forte e divertida.

Imaginei a cena em minha cabeça. Seria engraçado um senhor usando maquiagem. Mamãe com seus superpoderes havia me distraído do medo e já estava me fazendo sorrir.

Depois daquele dia, fiquei um tempo com medo de atender ao telefone. Até o som da campainha me assustava. Geralmente quando o telefone tocava, antes de atender, sempre tentei adivinhar em minha cabeça quem estava ligando. Quando o som do toque causava certo incômodo, era minha forma automática de imaginar que a pessoa ligando do outro lado, não pretendia dar boas noticias.

- Mas Sr. Augustos eu...

Mamãe no telefone parecia receber uma noticia forte. Ainda com sabão no corpo e em minha cabeça, espio pela porta semiaberta.

- 30 minutos? Não posso chegar ai tão rápido. – Ela falava mais alto desta vez. Parecia estar nervosa, e com medo.

- Tudo bem. Estou saindo agora de casa. Tchau!

Volto para debaixo do chuveiro antes de ela bater o telefone. Ouço coisas caírem no chão. Seus passos duros e pesados de um lado para o outro mostravam sua inquietação.

- Isa!

- Já estou saindo mamãe. – Gritei enquanto pegava minha toalha.

- Isa eu preciso sair agora, e depressa. – Ela chega até a porta e me ajuda a se secar.

- Mas nós não iríamos...

- Eu fui... – Mamãe pairou seu olhar vazio diante do meu.

- Não iríamos sair agora? E a surpresa... – Eu sabia que ela diria algo ruim. O seu semblante mostrava isso.

- Fui demitida minha filha... – Mamãe não interrompeu só a mim, como todos os barulhos a nossa volta. O sorriso e a animação não existiam mais em seu rosto. A sensação de receber aquela noticia, era como se estivéssemos dentro de um elevador que havia acabado de arrebentar os cabos e despencava com toda força em direção ao chão.

- Foi o emprego da loja de sapatos Isa e...

- Então mamãe! – Eu disse alto, com uma falsa animação. – E o emprego na farmácia?

- Eu pedi demissão ontem... – Ela encheu os pulmões. – Não tenho mais emprego filha...

Naquele momento o elevador havia acabado de colidir com o chão.

Outras Proporções de Dor - Ato 1Onde histórias criam vida. Descubra agora