Onze

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O cheiro de café requentado, misturado com o aroma de rosas, que a faxineira borrifava a cada meia hora no consultório e o frio quase cortante do ar condicionado já estavam ficando quase tão familiares quanto a minha casa. O barulho do relógio pendurado na parede, durava exatas duas horas e era interrompido por um som frenético indicando que a seção havia chegado ao fim. Rupi movimentou a cabeça lentamente e fechou os olhos por alguns segundos, logo em seguida anotou algo em seu caderninho vermelho.

- Você já tentou se aproximar e questiona-lo sobre o que houve? - perguntou com aquele tom de voz manso e delicado de sempre.

- Rupi, ele não responde minhas mensagens há uma semana, as nossas aulas não coincidem mais e sempre que o encontro pelos corredores ele está com a garota misteriosa. Até o Robert não está tendo tanto tempo para mim por causa do campeonato e quase não existem pessoas dispostas a falar comigo naquele colégio. Sabe aquela dor no fundo do peito, que eu costumava sentir?

- A dor cortante? - Ela arregalou os olhos devagar.

- Não, a dor da solidão. Aquela que encosta no coração e machuca um pouquinho.

- Lembra de como resolviamos isso?

- Sim, Rupi. Me dando um pouco de atenção e carinho, antes de tentar conversar com alguém que me desperte interesse.

- Muito bem.

O relógio disparou mais uma vez, estava na minha hora de ir embora, porém as conversas com a Rupi, minha terapeuta, rendem demais. Exatamente por isso, meus pais decidiram dobrar a hora e eu tenho um pouco mais de atenção que os outros pacientes, mas acho que esse tempo já não está sendo suficiente.

- Tem conversado com aquelas pessoas de novo?

- Elas desapareceram para nunca mais voltarem, Rupi.

- Ótimo. Então, contando com hoje fazem exatamente oito meses...

- Seis dias, quinze horas e quarenta e cinco minutos.

- Estou orgulhosa de você, querida. Agora pode repetir para mim qual foi a lição que aprendeu na seção de hoje?

- Não dar asas para pensamentos bobos, tudo tem sempre uma boa explicação e se a dúvida surgir, preciso buscá-la.

Sempre faço o que a Rupi manda, mesmo quando certas coisas parecem difíceis ou embaraçosas demais para serem executadas. Ela é quase como um anjo da guarda, sempre sabe o que é bom para mim e magicamente sempre acerta quando diz que suas lições irão funcionar. As vezes quando faço tudo errado, Rupi sabe como consertar, sabe como juntar os caquinhos do meu coração e me fazer renascer das cinzas. Todo mundo deveria ter uma doutora Rupi para conversar.

Desço as escadas devagar, tentando voltar para a realidade fora da terapia. Minha vida havia mudado bastante nos últimos tempos, tenho trilhado caminhos melhores e me aceitado como sou. Aprendi a valorizar os pequenos momentos e achar o lado positivo das coisas, mesmo quando parece impossível.
Eu estive no fundo do poço por muito tempo, mas tudo parece melhor agora, exceto por uma garota misteriosa, que surgiu quando ninguém esperava e meio que interferiu no mais próximo que cheguei de um relacionamento amoroso. Não sei quem ela é, de onde ela veio e muito menos qual é a relação dela com Josh e com o resto da escola, que parece odia-la fervorosamente. Tudo que sei é que ela parece ter sido arrancada de uma revista adolescente dos anos 90, com aquele visual grunge e aquele olhar fatal, que quando não te seduz, te destrói.

- Mamãe, o que veio fazer aqui? - quando cheguei na porta de saída, minha mãe estava a me esperar com uma expressão um tanto indecifrável. Segurava a bolsa Gucci com as duas mãos, de uma forma que aparentava nervosismo, mas ao mesmo tempo esbanjava um sorriso caloroso e incrivelmente sincero.

GAROTA ARCO-ÍRISOnde histórias criam vida. Descubra agora