Era estranho ver dois elementos feitos de fogo, tendo paciência para uma conversa sobre juros de boleto, o depósito bancário esquecido, um raio que caiu no pasto e matou três bois, o FGTS que esse mês venceu antecipado, dona Sandra que trancava a boca pra não comer, Bruno que ameaçou que pegar um advogado pra levar a mãe embora da fazenda, Mariana que três vezes pegara Lucas e Pedro abraçados e aos cochichos, seu João que tava pra chegar a qualquer momento para uma visita e Amanda que "ressuscitou dos mortos" e estava interessada no futuro do filho de uma hora pra outra...
— Quanto mais eu rezo, mais me aparece assombração, guri. Que a tua mãe tem na cabeça? Olha, eu não posso proibir você de ir com ela até que tenha uns dezoito anos, mas se tu não quer, eu me meto e falo.
— Não vou morar com ela, já escolhi um curso de Letras mesmo.
— Letras? Pra quê?
— Ai Pedro, eu faço o que eu quiser.
— Eu sei... mas vai fazer o que com esse tipo de faculdade, vai virar professor. Faz outra coisa que depois te dê retorno.
— Não quero! — Pedro ficava puto quando Lucas terminava uma conversa assim.
Enfim, Amanda não veio à fazenda, mas ligava e até mesmo se ofereceu para custear a viagem do rapaz até São José dos Pinhais (PR) onde estava morando com marido e filhos e levou uma resposta ao estilo seco de Lucas:
— Depois de doze anos que me largou aqui, a mãe acha que é assim? Nunca me levou na sua casa quando eu pedia, se eu ver o Leonardo e a Yara na rua, nem reconheço mais...
— Tá, Lucas... mas eu te expliquei que não dava.
— Eu tinha até febre quando a mãe ia embora e dizia assim: "na próxima eu te levo".
— Só venha me fazer uma visita quando pegar férias de julho, piá. Não precisa morar aqui se não quiser. Mas venha.
Lucas haveria de ceder naquele ano, pois queria abraçar um pouco alguém da sua família. Das quatro tias que tinha e que moravam mais perto, apenas a Ariane que lembrava de lhe trazer um presentinho nos aniversários e natal. As demais ligavam uma vez a cada ano ou dois.
Seu João não trouxe a "famosa" namorada que estava "louca de paixão" por ele. Olhava penalizado para sua ex esposa que parecia ter envelhecido uns vinte anos.
— Porque ela tá assim, Pedro?
— Pai, a mãe teve três AVC, o pai sabe disso.
— Porque não deixa o Bruno levar ela pra Joaçaba, pra morar com ele? Ele tem mais condições financeiras.
— Olha pai, pelo respeito que eu ainda tenho pelo pai, não vou responder. Pergunta se ela quer ir.
— Ela tá dormindo. Mas eu acho...
— O senhor largou a mulher, não tem que achar mais nada. E o Bruno que vá tomar no cu. Te roubou, mandou o Zequinha da imobiliária intermediar a compra daquele pedaço onde o milho tava bom pra colher, só porque eu estava me lascando para colocar tudo em dia e precisava de dinheiro.
— Só falta dizer que a culpa é minha, piá. O Bruno que vendeu aquele monte de coisa e não pagou, por isso que a fazenda ficou assim.
— Eu tô cansado desse assunto. Vocês se fazem de bobos. Daqui a mãe não sai, nem que eu tenha que chamar a polícia.
O pai de Pedro passou apenas um dia por ali e nem mesmo dona Sandra quis vê-lo quando acordou. Ela ouvia e entendia perfeitamente tudo a sua volta, com movimentos limitados e balbucios disse que não queria visita dele. Seu João foi embora sentido com a ex esposa que obviamente tinha mais motivo que ele pra ficar magoada.
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Te carreguei no colo...
RomanceFinalizado! Romance ambientado no Meio Oeste Catarinense. Afeição pode se transformar em afinidade. A afinidade pode se tornar uma paixão. Romance adulto. Contém descrição de cenas de sexo entre homens. LGBT. Se você estiver lendo esta história em...