Amélia olhava para a janela tão pensativa como se algo de interessante a paisagem tivesse. A chuva cai, fazendo com que pequenas gotas escorreguem pela janela. A sua mão ao tocar no vidro sentia o frio de um dia de inverno. O vento sopra com força como se fosse um fantasma, despindo as árvores altas e velhas do seu belo jardim. Ao mesmo tempo que assistia a tudo isto, via também o seu jardineiro a varrer as folhas que tinham caído das árvores e ele com toneladas de roupa em cima para se proteger do frio. As nuvens estavam tão cinzentas que parecia que iam tornar o mundo num inferno. Amélia nunca gostara do inverno, era tão pobre e raivoso... E não lhe agradava o facto de ter de estar sempre em casa e assustar-se com os trovões enquanto dormia. Ao menos não se lembrava muito bem os maus tempos que passava sempre no inverno com constipações e dores de cabeça. Mal podia esperar pela primavera! Altura de quando a natureza renasce cheia de cor. Ela gostava de recordar os bons momentos que passara na infância mas não o poderia fazer sozinha. Não havia melhor pessoa no mundo senão sua mãe que poderia contar-lhe histórias como se tivessem passado ontem. Normalmente, quando somos crianças, imaginamos o inverno como a altura do ano de fazer os bonecos de neve, os anjinhos e as lutas de bolas de neve, mas não é nada como imaginávamos ser. Nunca há épocas do ano perfeitas! Todas tem as suas desvantagens e temos de ter sempre em atenção a esses perigos.
A chuva termina e o céu abre outra vez como se fosse aparecer um anjo do céu. Amélia sente-se tão chateada consigo própria que parecia que o seu cérebro iria explodir de tanto pensar. Ela sentia que já tinha visto esta paisagem, mas em que vida? O seu passado estava preenchido em páginas em branco, apesar de saber que estava lá algo escrito. Depois de o tempo acalmar, Amélia ouve uma voz a chamá-la do piso inferior:
- Amélia? Podes chegar aqui abaixo?
Amélia reconheceu que era a voz de sua mãe. Decide descer as escadas para ver o que se passava. Quando chega ao primeiro piso, vê a sua mãe a olhar para a janela maravilhada. Ela ao reparar que a sua filha ali estava, diz-lhe:
- Chega aqui, quero-te mostrar uma coisa...
Amélia que estava ao pé da porta, vai para o lado de Diana tal como lhe tinha pedido. Amélia confusa pergunta:
- O que foi? Não vejo nada... - Disse ela tentando encontrar alguma coisa fora do normal.
- Não vez ali em cima das nuvens? Um arco-íris!
Amélia aproxima-se esforçando a vista para tentar ver o arco-íris que sua mãe tanto gostava. Ao encontrá-lo, olha para a mãe e diz-lhe:
- Ah está ali! É difícil de encontrar.
- É lindo, não é?
- É muito bonito sem dúvida.
- Normalmente, não se encontram muitos nesta zona.
De repente, surge uma pausa durante a conversa, deixando as duas um pouco desconfortáveis a olhar para a janela. Amélia, curiosa por descobrir mais acerca do seu passado, não podia guardar mais a sua vontade e foi directa ao assunto com Diana:
- Sabe mãe, eu gostava que me contasse mais sobre o meu passado... Cada dia que passa sinto-me infeliz por não saber quem eu era.
- Amélia eu compreendo que queiras saber mas, deixemos este assunto para mais tarde, pode ser?
- Não, eu quero saber agora. Já não aguento mais a minha curiosidade, por favor conte-me.
- Está bem, mas não aqui.
Mãe e filha foram conversar na sala do assunto onde costumava haver reuniões de família ou com outras pessoas importantes. Esta sala guardava manuscritos valiosos com muita importância histórica. Era decorada com azulejos e candeeiros de cristal. Nas paredes, havia pinturas das pessoas que pertenciam à família e aos antepassados dos Miranda de Carvalho. No centro estava uma mesa com duas cadeiras onde Diana e Amélia iriam recordar os momentos mais importantes que passaram nesta casa. Enquanto Amélia ficava a conhecer um pouco mais acerca desta sala, Diana foi buscar um livro onde estavam guardadas inúmeras fotos tiradas quando Amélia era pequena, guardado numa gaveta de um armário de madeira muito grande. Ao se sentar ao pé da filha disse-lhe:
- Toma este é o teu boletim fotográfico e quero que o guardes para a vida. - Disse a sua mãe limpando o pó acumulado em cima do livro de estar tanto tempo guardado.
Amélia fica muito pensativa a olhar para aquele livro velho que guardava todos os seus tempos de infância. Ela abriu-o devagarinho, como se não pudesse descobrir alguma coisa que ali estava dentro, era como se fosse uma informação secreta... Ao abrir na primeira página, vê uma fotografia de quando ela era bebé, ao colo de seus pais. Amélia ri-se e diz para sua mãe:
- Eu era mesmo rechonchuda.
- Essa foto foi tirada no dia do teu baptizado.
Amélia continua a observar aquelas fotos todas com muita atenção, ficando muito satisfeita com o que via. Até que, a meio do livro, encontra uma foto que a deixou em dúvida. Ela vira o livro para sua mãe e pergunta-lhe:
- Mãe, quem é esta criança que está ao seu lado? Não sou eu, pois não?
Diana fica calada e liberta uma lágrima, o que faz com que ela desate a chorar. Amélia arrependida de ter perguntado diz tentando evitar o contacto visual:
- Pronto, já percebi que não devia ter perguntado.
- Não, pelo contrário filha, fizeste muito bem em ter perguntado porque já não podia esconder isto durante mais tempo. Acabarias por descobrir a qualquer altura.
- Então quem é mãe? - Diz Amélia limpando as lágrimas de sua mãe.
- É o teu irmão... - Diz Diana baixando a cabeça.
Nisto, entra Alice que não podia ter aparecido em pior altura e pergunta-lhes:
-As meninas querem uma chávena de chá? Olhem que está frio e fazia-vos bem!
- Alice pode esperar um pouco, estou a ter uma conversa importante com a minha filha. - Diz Diana muito incomodada.
- Ai desculpe não sabia que estavam ocupadas, peço imensa desculpa dona. - Diz a empregada envergonhada.
Mal Alice sai da sala, Amélia levanta-se e diz para sua mãe muito contrariada:
- O quê o meu irmão? A mãe nunca me disse que tinha um irmão!
- Desculpa filha mas ele morreu poucas horas depois de nascer e se ele estivesse vivo, seria hoje o teu irmão mais velho.
- Mas porque é que não me disse antes que eu tinha tido um irmão?
- Olha não sei mas na altura eu e o teu pai decidimos não te contar para não ficares com esta mágoa a vida toda.
- Preferia que me contasses antes do que descobrir assim.
- Desculpa Amélia perdoa-me.
- A mãe tem mais alguma para me dizer ou ainda há mais mentiras que eu tenho de descobrir sozinha?
Diana não diz nada e vai-se embora muito magoada. Amélia, sem saber como reagir à situação, pegou no boletim fotográfico atirando-o contra a parede.
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A Minha Motivação |livro 1|
Ficción histórica| A Minha Motivação livro 1 | Amélia de Carvalho, a primeira mulher a frequentar a Universidade de Coimbra (1871-1966). Amélia é uma jovem de 23 anos de finais do século XIX, que vive à frente do seu tempo. Ela quer muito ter uma vida que não é típi...