Dois dias depois
Seus apressados e barulhentos passos ecoavam pela escadaria do edifício. Sem se preocupar com a falta de elegância, Eva pulava os degraus de dois em dois, equilibrando o violoncelo de um lado e sua bolsa de outro, atenta ao toque insistente do telefone em seu apartamento.
- Quem achou boa ideia comprar um apartamento em prédio antigo? – resmungou contra si mesma – E tudo porque ficou encantada com o elevador de porta de ferro sanfonada do início do século passado? - praguejava ao pegar a chave – E daí descobre que “a coisa” vive quebrada – continuava falando sozinha.
Abriu apressadamente a porta, equilibrando de forma desajeitada o instrumento e a bolsa em uma única mão. A campainha do aparelho soava em timbre quase desesperado. Entrou no apartamento e correu para atender ao telefone sem se preocupar em fechar a porta.
- Alô! - disse com a voz ofegante.
Em resposta ouviu o tum tum tum do tom de ocupado. Seja quem for que estivesse do outro lado da linha, desistira.
- Droga! - Praguejou - Tanta correria para nada - resmungou ao colocar o aparelho sem fio sobre a base. Seguiu com o violoncelo para o cômodo que chamava de sala de música e com todo cuidado retirou o instrumento da capa protetora e o depositou junto aos outros dois, no apoio esculpido especialmente para esse fim. A sala de música era seu lugar de estudo e criação.
Retornou à sala de estar. Intrigada, mirou o telefone sem fio com os olhos semicerrados. O aparelho vintage, imitava a forma dos antigos aparelhos com discador. Fora um presente de Laura e claro, não possuía identificador de chamadas. A mulher era contra tal recurso tecnológico e justificava sua posição com um argumento mais mirabolante que o outro.
Na noite anterior acontecera à mesma coisa, pensou com os olhos ainda fixos no aparelho.
Parecia ser alguém que sabia que aquele horário já estaria em casa. Porém nos ultimo dois dias, chegara bem mais tarde.
- Bom, se você quiser mesmo falar comigo, vai ligar de novo – ponderou.
Os olhos contemplaram a porta que esquecera aberta na pressa para atender a ligação. Ao trancar a porta notou o papel dobrado sobre o chão. Ao pegar e abrir, constatou ser a ordem de serviço de sua operadora de internet. O documento avisava que o reparo solicitado por ela há cinco dias, não fora realizado, pois o técnico não teve acesso ao apartamento para testes e possível substituição do modem.
- Perfeito! – resmungou encostada à porta fechada.
Consultou o relógio em seu pulso e respirou cansadamente ao constatar o avançado da hora. Ponderou se deveria o não desmarcar o encontro com Laura e Rafaela. Tivera um dia cansativo, não estava com ânimo, nem espírito para barzinho ou boate. Queria mesmo era um longo banho quente, vestir sua ridícula camisola de algodão com o tema dos smurfs e assistir vários episódios da série The Mentalist em sua TV.
O protagonista a fazia lembrar-se do desconhecido do metrô.
Estava impressionada e talvez um pouco obcecada por ele, admitiu para si mesma. Todas as vezes que avistava um homem de cabelos loiros seu coração acelerava.
Naquela manhã, esteve mais uma vez, na universidade na qual ele dava aulas de literatura. E mais uma vez não viu qualquer sinal dele entre o mar de estudantes e professores que circulavam pelo campus.
- Porque esse homem não me sai da cabeça? – Perguntou-se frustrada por reconhecer o quão improvável seria esbarrar com o sujeito uma segunda vez, em uma cidade do tamanho de São Paulo.
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DEGUSTAÇÃO - Meu Destino é Você
Fiction généraleVocê acredita em amor à primeira vista? Ele não. Theodoro Santini, apesar de pertencer a uma família com uma confortável situação financeira, sempre apreciou as coisas simples da vida: família, amigos, uma cerveja gelada, sexo sem compromisso e suj...