Capítulo 14 - Segunda Parte - Quando o coração fala

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- Não acha melhor irmos a um médico? – Já no carro, Theo voltou a perguntar, ao travar o cinto de segurança de Eva.

- Estou melhor Theo, juro. Prefiro ir para a minha casa – Eva respondeu sincera.

O fato de não estar respirando o mesmo ar do sujeito asqueroso a fazia respirar aliviada.

Ele hesitou por um instante.

Ela ainda tinha a pele gelada. Mas a mulher era teimosa. Poderia guiar o carro até o hospital mais próximo, isso seria simples. O difícil seria convencê-la a descer do veículo.

Por fim, respirou resignado, depositou um beijo rápido nos lábios ainda frios, contornou o carro e ocupou seu lugar atrás do volante

- Obrigada – Eva agradeceu.

Com um sorriso torto Theo deu a partida e colocou a Pajero em movimento.

Instantes depois ele recordou que tinha algo para mostrar a mulher sentada ao seu lado e ligou o som do utilitário. Os ricos e profundos acordes do cello invadiram o interior do automóvel. Uma sensação de prazer percorreu seu corpo, como acontecia sempre que ouvia essas faixas do CD.

Theo adorava ouvi-la tocar. Eva tinha um talento e sensibilidade únicos. Era como se ela conversasse com o instrumento. Ou como se o instrumento falasse com ela, ou melhor, através dela. 

Uma deliciosa emoção inundou o coração de Eva ao identificar a melodia que invadia o automóvel naquele instante. O som puro, régio e inconfundível do seu cello soou límpido, forte, intenso.

Surpreendida ela olhou para Theo que sorria abertamente de sua surpresa.

- Já ouvi tantas vezes as faixas em que você toca que aposto que o CD está mais fino nesses pontos – ele brincou – São composições próprias não são? – perguntou.

- Sim – ela respondeu agradecida pela percepção dele – Compus especialmente para esse CD.

- Você é uma violoncelista incrível. Não me canso de ouvi-la – confessou.

O sorriso dela se ampliou e chegou aos olhos, que brilharam em um tom denso de mel que roubou sua respiração e aqueceu seu sangue.

Mel, não. Ele corrigiu o próprio pensamento.

Whisky! Olhos cor do melhor whisky envelhecido. Porque decididamente ele se sentia embriagado todas às vezes em que os olhos dela brilhavam daquela maneira.

Eva recostou a cabeça no encosto de cabeça, com os olhos fechados, inspirou e expirou profundamente, deixando a música acalmar suas emoções e curar sua alma ferida pelo cruel e frio preconceito.

Theo respeitou seu momento.

Se por estar concentrado na direção, ou intuir sua necessidade, não sabia. Mas, sentia-se imensamente grata por aquele momento de intimidade com sua música. O momento em que a união de notas distintas desenhava uma melodia única era fascinante.

Eva se entregou de mente, corpo e alma a ação curadora da música.

Algum tempo depois, Theo estacionou em frente ao edifício antigo, e em silêncio observou Eva que permanecia de olhos fechados, entregue a algum ritual pessoal de cura.

Como ele sabia disso? Não fazia ideia.

A canção chegou ao fim, porém, ela se manteve imóvel por mais alguns segundos.

Eva sentia o peito mais leve, a alma restaurada. Sabia que estavam diante do prédio onde morava há algum tempo. Mais uma vez ficou agradecida por Theo compreender seu ritmo, seu tempo.

DEGUSTAÇÃO - Meu Destino é VocêOnde histórias criam vida. Descubra agora