I. Dan's

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WILL

Céus, que coisa mais maravilhosa! Sabe quando você percebe que a vida não poderia ser mais justa e esplêndida do que já é? Quando percebe que não há outro lugar no mundo em que prefere estar, a não ser...

Dei um pulo ao sentir uma bolsa esmagar meu rosto. Olhei ao redor, localizando-me, antes de suspirar. Não, não estava em meu trono sendo bajulado por serviçais. Estava sentado em um ônibus lotado sendo atingido por cotovelos e bolsas.

Ah moça, que gentileza a sua me trazer de volta à realidade de forma tão sutil quanto uma manada de elefantes!

Desci na parada próxima de casa equilibrando minha mochila, meu casaco e meus projetos da faculdade. Comecei a percorrer as oito quadras até em casa pensando em como diabos eu conseguiria passar de semestre desta vez. A matéria do Dragão era apenas a ponta do iceberg. Por mais que a culpa seja inteiramente dele por todo mundo se ferrar na prova, não é como se minhas notas estivessem muito melhores nas outras matérias. Já estávamos na metade do semestre e eu tinha que fazer milagre em pelo menos quatro delas.

Francamente, entrar para a lista de maus alunos do Sr. Turner não ajudou em muita coisa. Depois daquela cena humilhante, ele me encarou diversas vezes durante a aula. Eu podia ver o levíssimo indício de um sorriso em sua boca, como se acabasse de ganhar uma batalha. Imbecil!

Pode haver ganhado a batalha, mas a guerra era a que importava.

Dei uma olhada na rua pela qual percorri durante a vida inteira. Nunca fizeram uma parada de ônibus mais perto da minha casa do que há oito quadras. Era meio inclinada e cheia de buracos. Na verdade, melhorou com o tempo, já que agora tinha um asfalto mal feito. Antes, sequer era asfaltada. Costumávamos serpentear o caminho inteiro chutando pedras, eu e Caleb. Ou quando Gabe e Cenoura vinham pra cá, apostávamos corridas. Muito já chegamos em casa com os joelhos ralados. Bons tempos.

Apesar da péssima construção da rua, o bairro é bastante charmoso. Havia praças bem cuidadas e campos de futebol extensos. Há violência em qualquer lugar da cidade, mas me arriscaria a dizer que a nossa rua é bem segura. Afinal, quem em sua sã consciência viria para esse fim de mundo assaltar?

Talvez para jogar um corpo, quem sabe, seja favorável...

Pensando em corpos, caminhei o resto do caminho planejando diferentes formas de matar meu professor, usando o melhor da minha imaginação.

1- Bater aquela pasta ridícula dele em sua cabeça diversas vezes;

2- Fazer um boneco de Voodoo e ser criativo;

3- Macum...

— A vida não fácil pra ninguém, hein? — A voz que facilmente reconheceria em qualquer lugar chegou aos meus ouvidos. Sorri antes de virar e encarar os olhos puxados da minha japonesa preferida.

— Minha desgraça te diverte, K? — perguntei, enquanto tentava inutilmente abrir o portão de casa.

Kaori mora na casa ao lado há mais ou menos oito anos. Ao que parecia, sentada em um banco do pátio, estava aproveitando o sol do meio-dia. Já fazia um tempo que não nos víamos muito antes do anoitecer. Ao contrário de mim, K estudava à tarde. Lembro de ter perdido um pouco do tímpano quando ela descobriu ter passado em Engenharia Ambiental.

Observei, de canto, Kaori levantar-se e vir até mim.

— Claro — disse, rindo ao me ajudar com o portão. — Parece que um caminhão passou por cima de você, criatura!

Made of FireOnde histórias criam vida. Descubra agora