Capítulo oito 💠

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  Ao fechar a porta atrás de mim, sinto o arrependimento começar a me consumir. Eu sei que ela está indo embora. Também sei que, provavelmente desta vez é definitivo e o mais importante de tudo, eu não estou fazendo nada para impedi-la.

  Tento fazer meu corpo se mover, as minhas pernas agirem, meus braços se mexerem. Tento até gritar, qualquer reação que demonstre o que eu estou sentindo de verdade. Mas nada.

   Sempre soube que esse segredo que eu guardo a sete chaves, em um fosso guardado por uma versão de mim muito mais sombria e dolorosa, seria a nossa destruição. Eu sei o quanto pacientemente ela esperou. Me dando tempo para confiar nela. Mas eu sempre estava ali, escondendo, desviando. Deixando que ela preenchesse o silêncio com suas próprias questões ao invés das minhas, enquanto eu me assegurava.

  E triste saber que eu guardei por um bom tempo o pensamento de que se um dia eu precisasse me livrar dela, ela não levaria nada de mim com ela, por que eu não havia compartilhado nada.

  A movimentação na sala parou, sua conversa no celular também. Então a porta foi aberta.

  Mexa-se!

  Silêncio.

  Anda, não seja covarde!

  Silêncio.

  Corpo estúpido, mente estúpida!

  Barulho de porta se fechando.

  Me sentei no chão gélido. Sem lágrimas, sem gritos. Somente... sentindo um vazio, enquanto a realidade me atingia.

  Agora não sobrara ninguém.

💠

  Quando o despertador tocou novamente, ás sete, eu ainda estava acordada. Os olhos ardendo, o corpo tão pesado como chumbo, os sentimentos muito confusos. Era como uma premonição, eu sabia que no momento em que eu pegasse no sono, os pesadelos viriam com tudo. Então eu simplesmente me mantive acordada. Não foi tão difícil. Na verdade, foi assustadoramente fácil. Mas eu sabia que estava na hora de levantar. O mundo não iria parar só por que eu havia acabado de perder a única pessoa que ainda se importava comigo.

  Tentei reprimir o bocejo que veio assim que meus pés encontraram o chão frio e o calafrio que perpassou pelo meu corpo. O apartamento agora parecia do jeitinho que eu o havia decorado para ser. Sombrio, solitário e autossuficiente. Passei as mãos pelos cabelos, meus ouvidos pareciam zunir.

  Pensando rápido demais.

  Então, para esvaziar a mente, eu comecei a procurar pelo meu celular e pelo o fone de ouvido.

   Encontrei-os, algum tempo depois, jogados de qualquer jeito no sofá da sala, bem na hora em a porta fez um barulho.

  Eu parei, estática no lugar, milhões de pensamentos se passando pelo minha cabeça. E todos eles tinham haver com Bruna.

  Será que eu havia me enganado, que a nossa briga não houvesse sido tão ruim assim? Ela estaria de volta?

  Esperança me inundou até meu último fio de cabelo, só para ver dona Joaquinaa mulher que me ajudava a sobreviver aqui, sem deixar que a minha casa virasse um chiqueiro ou que eu morresse de fome — passar pela porta.

  Ela era uma mulher baixinha, barriguda de cabelo castanho claro, que pareciam oleosos. As bochechas muito rosadas. Sua aparência lembrava a de uma senhora gentil, que provavelmente comia muito doce.

Minha estrela particularOnde histórias criam vida. Descubra agora