Capítulo 2

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30 de Novembro de 2017

Narrado por Clara

A claridade dos relâmpagos juntamente com o som estrondoso dos trovões impedem-me de dormir.

Nunca gostei de tempestades, deixam-me inquieta e nervosa, dou mais uma volta na cama e vejo o relógio por cima da mesa de cabeceira marcar as três da manhã.

Opto por me levantar, caminho em direção à cozinha e reparo que Eleonora também não está no quarto a descansar, desço as escadas lentamente encontrando-a na sala a escrever freneticamente no seu computador portátil enquanto beberica um copo de whisky.

– Também não consegues dormir? – sussurro assustando-a. Sorrio com a sua reação.

– Não avó. Esta tempestade está a deixar-me com os cabelos em pé. Tentei começar o meu novo romance, mas nem assim o sono quer aparecer. – diz demonstrando a sua frustração e o seu estado de embriaguez.

– Vou buscar uma chávena de chá, queres?

– Deixa estar avó, eu faço-te o chá. Senta-te aqui. – a minha neta retira todos os papeis que ocupavam o lugar a seu lado no sofá. – Queres de quê? – questiona desaparecendo para a cozinha.

– Camomila, faz para ti também meu amor. – convido-a a acompanhar-me no chá para que a sua pequena bebedeira passe.

Varro o meu olhar pelas letras que se destacam no ecrã brilhante do portátil, a Eleonora é uma escritora conhecida em toda a Itália, os seus romances transformaram-se em best sellers em questões de dias.

Recordo-me da evolução que a sua carreira tem tido, o primeiro livro que a Eleonora escreveu foi numa plataforma na internet, o wattpad. Na altura a minha neta tinha 20 anos, aquela obra foi um sucesso com milhões de visualizações on-line.

Como todo o escritor amador, Eleonora queria mais. Então num certo dia, apresentou o seu trabalho a uma editora, durante o tempo em que aguardou a resposta da mesma os nervos consumiram-na, porém o futuro foi risonho para a minha neta e o seu livro foi publicado fisicamente e nesse dia a coitadinha quase desmaiou com a emoção de ter nas suas mãos o seu sonho! O seu livro!

Tenho bastante orgulho na minha neta!

Começo a ler os parágrafos que escreveu à minutos atrás quando Eleonora entra na sala com duas chávenas de chá a fumegar. O pequeno texto descreve uma mulher que sofreu recentemente uma traição, tal como aconteceu com ela.

Minha bela menina!

– Ainda não está terminado. – comenta sentando-se a meu lado. – Estou sem inspiração!

– Tem calma meu amor, isso vai passar. – conforto-a. – Porque escreveste sobre ti?

– Eu não revelo o que sinto com facilidade, opto por transmitir tudo para um papel ou para o computador. – explica fechando a tampa do portátil impedindo-me de continuar a leitura. – Mas, estava a pensar... - sorri largamente, vem aí pedido. – Podias contar-me a tua história como avô. Isso sim dava um belo livro. – arregalo os olhos e engasgo-me com o chá.

– Nem pensar. – declaro firme.

– Mas avó... - insiste com olhar meigo.

– Nem, mas, nem meio mas minha menina. - interrompo-a – O whisky está a subir-te ao cérebro. – resmungo e levanto-me do sofá. – Vamos dormir. – mando e começo a subir as escadas, Eleonora segue-me em silencio.

Deito-me novamente, reparo que a tempestade acalmou, permitindo que eu consiga dormir. Observo a fotografia de Benito ao lado do relógio e adormeço.


*****


Acordo assustada com os gritos de Eleonora que vêm do andar debaixo, visto o robe preto que descansava por cima da cama e caminha ao seu encontro.

– O QUE ESTÁS A FAZER NA CASA DA MINHA AVÓ? NÃO IREI PERGUNTAR NOVAMENTE. – ouço a minha neta gritar.

– Só vim entregar o jornal. – defende-se a voz que eu conheço ser do Marco.

Gargalho ao deparar-me com Eleonora a impedir qualquer movimento do jovem ameaçando-o com o cutelo da cozinha.

– Eleonora, deixa o pobre rapaz em paz. – peço com calma, o olhar aterrorizado de Marco suaviza ao ver-me à sua frente.

– Mas avó, ele entrou na tua casa sem permissão. ­– Eleonora justifica-se movimentando o cutelo o que apavora novamente o jovem.

– Anda, vamos sentar-nos e eu explico tudo. – digo e pego a arma de defesa das mãos da minha neta, Marco protege-se atrás de mim enquanto caminhamos para a sala.

Eleonora avalia meticulosamente Marco com o olhar, sorrio ao relembrar-me que tive a mesma reação quando conheci o Benito.

– Eleonora, este encantador rapaz é o Marco. – apresento-o colocando o meu braço sob o seu ombro. – Marco, esta jovem linda é a minha neta Eleonora. – vejo o olhar malicioso que Marco lança a Eleonora que não muda a sua expressão avaliadora.

Menina teimosa e desconfiada!

– Porque ele entrou aqui sem permissão? – a minha neta vai direta à questão que tanto a confunde.

– O Marco é jornalista e o vizinho da casa da frente, todos os dias pela manhã enquanto o teu avô foi vivo ele vinha cá trazer o jornal e conferir se tudo estava bem, com a morte do teu avô ele continua a vir cá para ver como eu estou. – explico e a expressão de Eleonora vai suavizando. – Eu e o teu avô estávamos aqui sozinhos, sem nenhum familiar por perto, então o Marco garantia que nada de mal nos acontecia, é como um neto para mim. – concluo e sorrio para o rapaz.

– Como vês não sou nenhum ladrão como me acusas-te – alfineta Marco.

Eleonora fica em pé à frente do rapaz e oferece-lhe a sua mão que desaparece quando Marco a envolve na dele.

– Peço desculpa pela minha atitude. – a minha neta lamenta e Marco sorri aceitando as suas desculpas.

Realmente esta era a atitude correta a se fazer e eu sabia que Eleonora tomaria essa decisão. A minha neta sempre foi uma rapariga demasiado justa e correta.

– Quem já tomou o pequeno almoço? – pergunto mudando de assunto enquanto os jovens a meu lado se continuam a encarar, encolho os ombros e caminho para a cozinha. – QUANDO ACABAREM O VOSSO MOMENTO ROMÂNTICO VENHAM COMER. – brinco.

Posso estar enganada, mas acho que entre aqueles dois algo vai surgir. Um romance talvez!

Esta minha veia de casamenteira...

Só desejo que a minha neta seja feliz.


O Despertar do PassadoOnde histórias criam vida. Descubra agora