Trinta e sete: Resistência.

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HENRY

Levanto no dia seguinte quando escuto os galos cantarem ao sinal do primeiro raio de sol. Ponho uma blusa branca e lavo o meu rosto com a água gelada, o que faz meus pelos arrepiarem pelo frio. Pego meu arco que está escorado na parede do canto do meu quarto e ponho a aljava pendurada em minhas costas, a mesma carregada de flechas.

Saio do cômodo e sinto o cheiro matinal dos pães diários assados. Observo minha mãe de costas, com um pano nos ombros e se dobrando sobre o forno, que foi construído por mim.

— Bom dia — escutei alguém dizer atrás de mim. Anabela. Virei-me para encarar seu rosto.

— Estas pronta? — pergunto-lhe, observando seu cabelo devidamente arrumado e sua roupa trocada.

— Há mais tempo que você — ela informa e passa por mim para cumprimentar a minha mãe.

— Bom dia, queridos, a primeira remessa de pães acabou de sair — Joana apontou para a mesa — estou preparando a segunda para levar ao Sr. Richard — ela acrescentou e nós assentimos, nos sentando a mesa para encher nossas barrigas.

Depois de satisfeitos, deixamos a nossa casa e seguimos para a fazenda.

— Não podemos deixar de trabalhar para treinar — eu digo enquanto puxo um balde com água do poço — então, vamos treinar enquanto trabalhamos — explico, tirando o objeto e o botando ao meu lado. Amarro outro balde com a corda e o lanço novamente no poço, o enchendo de água e o trazendo a superfície.

— Como vamos treinar com dois baldes? — Anabela perguntou com a testa franzida.

Pego um pedaço de madeira com tamanho suficiente para carregar os dois baldes. Coloco um em cada extremidade, tendo cuidado para não ficar muito perto da ponta e cair.

— A primeira lição que deves aprender sobre uma batalha: tens que ser resistente — levanto a madeira com os dois baldes e boto em suas costas. A vejo tremer um pouco pelo peso, mas logo se recompõe.

— O que devo fazer com isso? — diz com dificuldades.

— Leve-os ao curral e dei-lhes às vacas — ordeno e ela assente.

Enquanto a observo caminhar até o curral, deixo meu arco e minhas flechas em um canto e ponho dois sacos de rações em cada ombro. Caminho até onde ela está e a vejo derramar os dois baldes no local certo.

— Agora venha cá e me ajude a despejar essas rações — peço e lhe entrego um dos sacos. Anabela cambaleia para trás, mas se mantém firme.

Abro o meu saco e o dela com uma faca, juntos distribuímos as rações pelos potes de madeira dos porcos. Quando finalizamos, a puxo até o celeiro e lhe entrego uma pá.

— O que vamos fazer agora? — ela pergunta curiosa.

— Pegar dejetos dos cavalos — informo e sorrio com sua cara de espanto.

— Eu não vou mexer em coco de cavalo! — ela joga a pá no chão e cruza os braços.

— É claro que vai! Precisamos misturar os excrementos com as palhas para produzirmos adubo. — explico o porquê daquela tarefa — Além do mais, se você tem nojo de material fecal, como vai lhe dar com os corpos mortos e todo o sangue dos seus inimigos? — estreito os olhos e a vejo bufar, pegando de volta sua pá — Resistência, Anabela, resistência! — a lembro.

— Eu odeio você — ela diz, pegando o pano que estava prendendo seu cabelo para trás e o botando no rosto, para impedir que suas narinas sentissem aquele cheiro horrendo.

Depois de um bom tempo juntando coco de cavalo e palha seca, terminamos o serviço e saímos do celeiro. Não antes de Anabela conferir o estado de sua égua, a qual ela tem grande afeição. Pude perceber isso quando iniciou uma conversa com o animal e ele relinchava como resposta, o que para mim foi estranho e novo. Pensei que animais não tivessem pensamentos.

— Eu acho que terminamos por hoje — conclui quando observei ao nosso redor e percebi que os outros empregados já haviam feito todas as outras atividades.

— O quê? Você está falando sério? — ela pergunta incrédula — E eu realmente pensei que você fosse me ensinar a lutar — ela balança a cabeça, decepcionada.

— Mas eu te ensinei — rebato, confuso.

— Não, Henry, você me fez fazer metade do seu trabalho! — ela aponta, indignada.

— Anabela, existem várias coisas em jogo numa batalha do que apenas contatos entre espadas — tento lhe acalmar.

— Como o quê? Limpar o coco do meu adversário? — ela zomba e sai, mais irritada do que antes.

Respiro fundo, decidindo deixar ela se acalmar para tentar conversar novamente em outra oportunidade.

(...)

O dia estava quase em seu fim quando eu decidi ir atrás de Anabela. Fui até a minha casa, onde imaginei que ela estivesse, mas chegando lá, encontrei a mesma vazia. Eu sabia que minha mãe e Amélia deveriam estar fazendo alguma atividade na mansão, mas eu não sabia onde Bela havia se metido.

Para encontrá-la, usei minhas habilidades de caçador e seguir sua pegadas, que me levaram para uma árvore na entrada da floresta. Anabela tentava acertar a árvore com algumas facas que devia ter pego de minha casa, mas ela geralmente errava ou acertava quase perto da raiz.

Pego uma flecha, a posiciono no arco e faço uma trajetória mentalmente antes de soltá-la. A flecha passa ao lado do rosto de Anabela e acerta o meio do tronco da árvore, ela se vira em minha direção com os olhos arregalados.

— Nunca vais acertar o centro da árvore — digo, abaixando o arco.

— Ótimo — ela me ignora e volta a jogar às facas.

Me aproximo de suas costas e observo sua jogada, quando ela vai lançar a próxima faca, eu ponho as mãos em sua cintura e ela se afasta de imediato.

— O que, diabos, você pensa que está fazendo? — ela pergunta e eu vejo que suas mãos tremem.

— Eu estava te posicionando corretamente, você tem que virar a cintura de acordo com as facas que lança em direção ao adversário — eu explico.

— Não toque em mim de novo, se não a próxima faca eu acerto em você — ela me ameaça.

Droga, eu havia esquecido por um segundo o porquê de primeiramente estarmos aqui. Ela estava traumatizada, é claro que responderia grosseiramente ao meu toque.

— Desculpe-me, não foi minha intenção — eu pedi e ela assentiu.

A verdade é que depois daquilo, Anabela se tornou uma garota assustada e ela usa o medo para se proteger. Ela teme de que alguém faça aquilo de novo, e é por isso que agora está na defensiva. Ela não está sendo grossa, ela só está machucada. E eu entendo perfeitamente.

— Você tem que colocar essa perna aqui e a outra aqui para ter mais impulso quando for lançar a faca. Também deve fechar o seu olho esquerdo para ter uma mira melhor, pois você é destra. — lhe ensino.

Ela tenta imitar minha posição.

— Você deve limpar sua mente antes de entrar numa luta. Então, respire fundo e espere o tempo que for preciso para tentar acertar seu alvo — instruo e ela assente.

Seus ombros caem e ela espera o momento certo antes de jogar a faca, quando a lança, acerta o meio do tronco na primeira tentativa.

Ela sorri e gravo em minha cabeça a visão de seu sorriso contrastando com o pôr-do-sol atrás de si. Sorrio.

— Vem! Vamos para casa — a chamo.

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E aí, estão gostando da história? Vocês estão curtindo os capítulos narrados pelo Henry ou preferem pela Anabela?

Como podem perceber, estou tentando aumentar o tamanho dos capítulos para me redimir por passar tanto tempo para postar capítulos novos.

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