Capítulo 30

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   Conseguia ouvir a voz estridente do meu pai a chamar-nos para almoçar, todos comemos bastante pois estávamos exaustos, a casa ficou por fim arrumada. Como prometido, após o almoço íamos patinar, havia um recinto de patinagem não muito longe de casa, mas como iria estar frio vestimos algumas roupas quentes antes de sair. 
   Tudo estava finalmente pronto, eu tinha roupa o suficiente para aguentar o frio e a chuva que ainda insistia em cair no exterior. Ainda não sabia como reagir junto a ele, prometi a mim mesma que o ia tratar como uma pessoa completamente nova, no entanto, não consigo evitar olhar para ele como se o conhecesse desde sempre, o que era parcialmente verdade, no entanto ele estava quase que totalmente mudado.


   As ruas estavam bem silenciosas e vazias, apenas se ouviam os carros que passavam velozmente pelas estradas, o guarda-chuva era rigidamente erguido por ele, enquanto caminhava-mos lado a lado. Um pequeno sorriso mantinha-se aceso no seu rosto, o seu braço disponível encontrava-se apoiado no meu ombro, impulsionando-me para perto de si. O recinto de patinagem já era visível ao fundo da rua, caminhamos cada vez mais apressadamente na tentativa de chegar-mos ao ponto de abrigo.
  Uma vez lá dentro, ele guardou com cuidado o guarda-chuva e dirigiu-se ao balcão para receber os pares de patins que iria-mos usar. A sua voz, enquanto falava com a senhora do balcão, evidenciava um tom rígido, sério, mas ao mesmo tempo educado, assim que obteve os patins dirigiu-se a mim, contrastando todos os pontos anteriores e abrindo um grande sorriso, achei esta ação um pouco estranha, mas não me pronunciei, apenas retribuí e aceitei os objetos que empunhava na minha direção.


   O interior do recinto era preenchido por uma grande quantidade de pessoas, a maioria daqueles que nos rodeavam era casais, estou certa de que ele notou isso, pois a sua cara corou ligeiramente assim que olhou em volta. Decidi-mos não evidenciar esse assunto. Quando era mais nova tinha por hábito, no inverno, andar de patins com o meu pai, nós costumava-mos andar de mãos dadas enquanto patinava-mos lado a lado, agora que penso melhor no assunto, não me lembro de alguma vez ter andado sem a sua mão a segurar-me. Após a minha conclusão, inclino a minha cabeça um pouco para cima, direcionando o meu olhar para ele, que estava já de pé à espera que eu me levanta-se do pequeno banco.

   "-Então? Não te vais levantar?"- a sua expressão parecia impaciente, tenho a sensação que ele me estava a chamar há algum tempo mas o eco dos meus pensamentos não me permitiu ouvi-lo.

   "Ah-h, sim, vou me levantar"- após responder, com alguma dificuldade, tentei levantar-me e permanecer de pé nos patins, ERRO, um enorme ERRO, assim que as minhas mãos soltaram o pequeno varão de ferro que havia perto dos bancos, todo o meu corpo teve um doloroso encontro com a superfície gelada. 


   Tudo o que conseguia ouvir naquele momento eram os risos das pessoas, e conseguia sentir a pressão dos olhares postos sobre mim, ele não era excessão, a sua enorme gargalhada enchia o recinto e ecoava por todos os cantos. VERGONHA, era tudo o que conseguia sentir, estava tão envergonhada que consegui ignorar a dor que corria pelo meu corpo, e a sensação gelada do piso no meu rabo. Quando ele finalmente percebeu a minha expressão de desconforto, e reparou nas lágrimas que estavam prestes a rolar pelo meu rosto, rapidamente se baixou na tentativa de me cobrir, para que as pessoas parassem de olhar para mim.


   "-Calma, peço desculpa, está a doer?"- tudo o que consegui fazer foi abanar a cabeça em forma de confirmação e deixar algumas lágrimas correrem sobre o meu rosto, agora que a dor estava mais intensa.


  Nisto, sou levantada pelos seus braços firmes e fortes, que rapidamente me conseguem suportar, pondo-me de pé. A sua expressão de arrependimento por ter feito toda a multidão de casais à nossa volta encarar-me ás gargalhadas, estava a fazer-me sentir um tanto culpada. Uma vez de pé, o seu olhar encara-me seriamente e, quase que por um reflexo, os braços dele envolvem-se à volta dos meus ombros, abraçando-me fortemente e, empurrando-me contra o seu peito, que estava coberto por um enorme casaco de pelo. Uma das suas mãos acariciou calmamente o meu cabelo.


   "-Está tudo bem, já passou..."- disse, abrindo um enorme sorriso no rosto, o que, me fez sentir bastante melhor...



Pétalas de CerejeiraOnde histórias criam vida. Descubra agora