O perdão do poeta

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Cheguei em casa e a primeira coisa que fiz depois de desfazer minha grande mala foi retornar as 850 ligações da minha mãe que, desta vez, devo admitir, estava em cólicas, com razão, pela minha falta de notícias. Ela quase sempre exagerava nos pedidos de satisfação, mas eu já estava há quase 24 horas sem me pronunciar.

Quando me atendeu, tive que ouvir que ela já tinha tomado 2 comprimidos de rivotril, além de ter passado a noite em claro, chorando, e estar coberta de urticária de preocupação. Menti, dizendo que meu telefone não conseguia completar as ligações, mas que havia chegado bem.

Já passava das 21h quando recorri à LAE – Liga dos Assessores Emocionais. Às 21h30, eu, Marcos e Marina já estávamos sentados em nossa sede, o bar na esquina da minha casa. Depois de narrar todos os acontecimentos das últimas 48 horas, nos mínimos detalhes, a decisão foi unânime: não havia dúvida, o acaso havia me surpreendido, me tomado de assalto.

Apressei-me em esclarecer que eu não havia sido tomada, que continuava reticente e desconfiada e, sendo assim, preferia manter distância.

Marina me olhou, enquanto tragava um cigarro e resumiu:

– Desconfiada pode ser, mas também apaixonada, encantada.

Marcos limitou-se a completar dizendo:

– Ai, amiga, acho que você devia dar uma chance a ela. Sei lá, ela parece tão fofa.

E eu:

– Ai, gente, não sei. No começo todo mundo é fofo. Depois, acaba todo mundo machucado.

– Bom, você quem sabe, mas acho que já faz tempo demais que a senhorita está sozinha e já está correndo o risco de ficar amarga – fulminou Marina.

– Também acho. Se joga, amiga, e vê no que dá. Qualquer coisa a gente está aqui para te levantar – aconselhou Marcos.

– Vou pensar. O pior é que saí da casa dela sem nem deixar meu telefone – disse.

– Não tem desculpa, não. Ela lhe deu o telefone dela e você sabe onde ela mora. Vá lá e surpreenda essa mulher – arrematou Marina.

– Ir lá? Não sei. Acho que é muito oferecimento – ponderei.

– Você dormiu na cama dela! – atirou Marina

– Eu estava praticamente inconsciente. E, você disse muito bem, DOR-MI – esclareci.

– Pois pronto. Vá lá e fique acordada – riu ela.

– Também acho – concordou Marcos.

– Se eu for ouvir vocês, é capaz de virar uma desfrutável – brinquei.

– Na-nã-não. Se você ouvir a gente é capaz de ser feliz – disse Marina, tomando um gole de cerveja.

Voltei para casa pensando que de repente eles estariam certos e que, de fato, aquilo podia ser uma oportunidade. Um convite do acaso ou uma peça do destino.

Demorei a dormir e acabei aproveitando para trabalhar um pouco. Meu celular emitiu um sinal de mensagem e, quando fui pegá-lo na cabeceira, ao lado na cama, vi um guardanapo dobrado embaixo da luminária. Lembrei imediatamente do bilhete de Carol em nosso primeiro encontro.

Embora em péssimas condições, depois de submetido à máquina de lavar, ainda era possível ver as informações: o número de um telefone celular e um endereço de email. Segurei o papel e pensei em mandar um email, mas desisti, pois achei que a ansiedade da espera pela resposta poderia causar muitas expectativas em mim.

Ao mesmo tempo, ponderei se ligar não pareceria íntimo demais. Afinal, já passava das 23h e ela podia estar dormindo ou na companhia de alguém.

Por AcasoOnde histórias criam vida. Descubra agora