Vem cá, Luísa

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Cheguei em casa e me debrucei no computador. Estava fechando a máquina quando a campainha tocou. Abri a porta.

– Oi! Trouxe alguma coisa para você comer – disse Carol.

– Como você subiu sem ser anunciada pelo porteiro? – perguntei, me sentindo invadida.

– Desculpe. Posso ir embora – falou, voltando para a porta, sem graça.

– Não. Só achei estranho – conclui – Entra – liberei.

– Você parece incomodada. Posso ir embora, sem problema, se você preferir – disse.

– Não. Desculpa, de verdade. Só sou meio desconfiada mesmo – esclareci.

– Eu disse ao porteiro que era uma surpresa e como ele já me conhecia da outra noite...me deixou subir – explicou.

– Tudo bem. O que vamos comer? – descontrai.

– Sushi! – anunciou.

– Você adivinha pensamento, é? – perguntei.

– Me esforço – respondeu.

Comemos, conversamos sobre trabalho, mas nos despedimos antes da meia noite e cada uma foi para sua cama.

E assim foi a semana. Cada uma para o seu lado. Nos falamos todos os dias, mas não nos vimos.

Essa distância, embora não tenha sido proposital, foi boa, parece que nos aproximou mais. A saudade virou uma constante. O desejo, uma sensação, e a vontade de estar junto, uma necessidade.

Até que, no sábado, resolvi surpreender. Fui até a casa dela levando pipoca de microondas e alguns DVDs. Repeti a ideia dela e pedi para não ser anunciada pelo porteiro. Toquei a campainha.

Para minha surpresa ou decepção, não sei dizer ao certo, quem abriu a porta foi outra mulher. Fiquei tão desconcertada, sentindo-me ridícula segurando aqueles pacotes de pipoca, sem saber o que falar. Então, a minha anfitriã, percebendo o meu desconforto, encarregou-se de fazê-lo:

– Oi, acho que você está procurando por Carol, né? – disse ela, com uma desenvoltura de quem se sentia em casa.

Então, chamou:

– Carol, acho que é pra você! – anunciou.

Tive vontade de correr dali e sumir, mas ela permaneceu me olhando até Carol chegar.

Nesse meio tempo, eu percebi que a mulher, apesar de não ser bonita, era muito vistosa, mais velha, com os cabelos loiros cacheados que pareciam propositalmente cortados de forma assimétrica. Carol apareceu correndo por trás da minha recepcionista.

– Oi, Lu, que surpresa boa! Entra – disse me puxando pela mão.

– Ah! Então você é a famosa Luisa? – perguntou a outra mulher.

– Sou Luisa, mas não acho que seja famosa – disse, sem muita simpatia.

– Pois saiba que seu nome é o mais pronunciado dentro dessa casa – disse ela.

Sorri, sem esconder o orgulho diante daquela informação.

Carol passou o braço pelo meu ombro e beijou meu rosto.

A mulher então disse:

– Carol não fez as honras da casa, mas eu sou Beatriz, muito prazer – apresentou-se estendendo a mão.

Apertei a mão da mulher e respondi:

– O prazer é meu.

– Bom, estou indo embora – disse Beatriz pegando a bolsa em cima do sofá e uma sacola com um pacote de ração para gatos e uma cama destinada a felinos. – aproveitem a pipoca – disse ela apontando para o saco que eu ainda trazia nas mãos.

Ela então olhou para Carol e disse:

– Você continua com bom gosto! – disse, dessa vez apontando pra mim.

– E você continua igual, Bia! Dá um beijo no Bob – disse Carol abraçando a mulher, que agora se revelava completamente para mim: era a ex.

Quando a mulher bateu a porta, eu joguei os pacotes de pipoca na mesa e disse:

– Acho que não devia ter vindo, vou embora – falei caminhando na direção da porta.

– Ei, ei, ei! – disse ela me detendo com a mão em meu punho.

– Me solte! – falei baixo, mas com firmeza, olhando para a mão dela na minha.

– Meu beeeem, não faça assim não. Você veio porque queria me ver. Bia veio pegar as coisas de Bob, sobre as quais já tínhamos conversado – explicou.

– Não entendi que isso significava que encontraria sua ex abrindo a porta da sua casa com tamanha desenvoltura – reclamei.

– Meu bem, eu estava no banheiro quando a campainha tocou – disse ela, soltando minha mão.

– OK – eu disse rodando a maçaneta da porta, louca para ser persuadida a ficar com um argumento mais eficiente.

– Olha, estou te dizendo que a minha história de amor com Bia acabou, continuamos amigas, mas a mulher que eu quero é você – declarou ela.

– Você tem razão. Eu sou a mulher que você quer, mas não a que você ama – analisei.

– Meu amor, não faça assim – pediu ela.

– E ela continua abrindo a porta da sua casa? daqui a um mês, quando eu chegar aqui, ela vai abrir a porta de calcinha? – provoquei.

– Não, Lu. Eu espero que daqui a um mês quem abra essa porta de calcinha pra mim seja você – disse me puxando pelo braço e batendo a porta atrás de mim. – Vem cá, Luisa, você quer namorar comigo? Estamos há um mês nesse chove não molha, gostosíssimo, diga-se de passagem, mas acho que toda essa insegurança é fruto da falta de um compromisso, que embora exista silenciosamente, não é oficial nem público – pressionou ela.

– Quero – respondi – E você quer mesmo namorar essa mulher insuportável, que sou eu? – perguntei.

– Você não é insuportável, só está insegura. Mas, agora sou sua namorada, devo satisfação a você e vou ter toda a paciência para conquistar a sua confiança – analisou.

Abracei-a com tanta força, que acho que foi até desconfortável para ela. Mas ela não reclamou. Permaneceu dentro dos meus braços até eu querer soltá-la.

Com os braços livres, ela colocou as mãos em minha nuca, por baixo dos meus cabelos, olhou nos meus olhos e disse:

– Eu estou completamente apaixonada por você. Não quero te machucar – disse ela, beijando a minha boca.

Um beijo rápido, mas cheio de carinho e cuidado. Então, olhou pra mim e disse:

– O que vamos ver? – perguntou apontando para os DVDs.

– Filmes açucarados – eu disse, mostrando os títulos.

– A pipoca pode deixar que eu faço – disse ela, pegando o pacote na mesa.

– É de microondas! – eu disse.

– Quero dizer que sua namorada é a melhor fazedora de pipoca de microondas em linha reta do mundo – se gabou ela.

Rimos muito com meus filmes açucarados e comemos pipoca. Quando o filme acabou, ela me puxou para a cama e perguntou baixinho, mordendo minha orelha:

– Vamos fazer amor pela primeira vez como namoradas?

Ao invés de responder, tirei a camiseta e coloquei a mão dela no meu peito.

Fizemos amor sem pressa, como se a vida estivesse só começando.

Por AcasoOnde histórias criam vida. Descubra agora