O Destino

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Dirigia para uma audiência, como sempre, quando escutei uma notícia no rádio. Não sei por que aquilo me chocou. Um homem, de 42 anos, que passava na calçada da Avenida Paulista, foi atingido na cabeça, por um jarro de cerâmica, com crisântemos plantados.

Na mesma hora, comecei a pensar acerca do acaso. Seria aquilo acaso ou destino?

Bom, sempre achei que o destino estivesse relacionado a um fatalismo inexplicável, concebido como uma sucessão inevitável de acontecimentos ligados a uma possível ordem cósmica. Nesse caso, a vida das pessoas seria conduzida a partir de uma ordem natural, da qual nada que existe pode escapar. Ou seja, destino para mim é algo quase mitológico.

Já o acaso seria algo que acontece a esmo, sem motivo ou explicação aparente. O que me confunde no acaso é imaginar suas diferentes aplicações, pois em algum sentido o acaso parece ser algo que acontece sem finalidade; mas em outro sentido pode ser algo que não é, por si só, consequência, ou seja, não tem em si uma determinação precedente; e ainda pode não guardar relação com coisa alguma, opondo-se completamente ao determinismo.

Dessa forma, acho que o nosso homem foi vítima de um acaso programado pelo destino. Mas, e eu? Estou há anos esperando o acaso acontecer e tudo me parece predestinado, inexplicável, traçado, fatalista. Na verdade, já estou achando tudo muito previsível na minha vida, tanto que qualquer dia recebo um WhatsApp do destino, mandando um resumo consolidado da minha vida, de tão desinteressante que ela é. Eu era um caso de destino mal traçado, sem participação do acaso. Bom, pelo menos, eu nunca levei um jarro na cabeça por obra do acaso.

Naquele dia, vez por outra, era tomada pela lembrança do nosso jovem homem, vítima de um destino inexorável e de um acaso bem planejado. E ainda dizem que o acaso acontece a esmo. Imagine o trabalho que dá você colocar o homem, o jarro e a morte juntos, ao mesmo tempo, em um dado lugar no universo. Se aquele senhor tivesse andado um pouco mais rápido, espirrado, ou qualquer coisa do tipo, teria mudado seu destino.

Seria possível mudar o destino ou forjar o acaso?

Aí outras coisas me vieram à lembrança. E aqueles acasos onde o avião cai e depois sempre aparece alguém que deixou de embarcar na última hora? Teria esse indivíduo burlado o destino? Ganhado mais uma chance, talvez?

O que eu sei é que estava aqui, à espera de um sinal do destino que me guiasse para o sentido da vida, que me desse uma chance de mostrar o meu potencial para viver. E nada. Nem um tropeção que me fizesse cair nos braços de alguém, ninguém na fila do chá.

E eis que, em meio a todas essas elucubrações, o telefone da minha sala toca e do outro lado, Michele, minha secretária, decreta:

– Sua passagem está marcada para às 6h30 da manhã. A reunião é às 10h, no escritório da Paulista. Só consegui passagem de volta para às 00h40, mas como depois de amanhã você não tem nada na agenda, acho que não vai ter problema. Tudo certo?

– OK. Fazer o quê? Meu destino está selado – respondi.

Por AcasoOnde histórias criam vida. Descubra agora