Embaixo dessa neve mora um coração

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Durante os quinze dias que se seguiram, eu e Solange nos tornamos companheiras inseparáveis de caminhadas e cada dia eu me sentia mais à vontade com ela.

Um dia, enquanto conversávamos na areia da praia, meu telefone tocou. Era Carol. Percebi que ela havia lido o nome no visor do telefone e na mesma hora levantou-se e fez sinal avisando que ia pegar mais uma água de coco.

Atendi. E ela me disse que estava voltando para o Brasil em uma semana. Limitei-me a perguntar se ela estava bem e se tinha defendido o projeto. Ela confirmou a defesa e disse que a dedicatória do trabalho foi para mim.

Agradeci e quis terminar a conversa. Mas ela insistiu e perguntou se podíamos conversar logo que voltasse.

Disse que não tínhamos o que conversar e que a chave da "nossa casa" estava na casa da mãe dela. Ela desligou, chorando.

Solange voltou e perguntou se estava tudo bem. Contei o que tinha acontecido e então ela disse:

- Lu, essa estória é de vocês e não sua. Ela tem o direito de ser ouvida.

- Ah! Agora você vai me dizer que ela é uma vítima? – perguntei.

- Meu bem, não acho que exista uma vítima neste caso. Acho que vocês duas estão sofrendo e que esse jogo de gato e rato só agrava a situação – opinou.

- Você não sabe de nada – disse eu me levantando e caminhando em direção ao carro.

- Luisa, deixe de ser infantil. Volta aqui! – gritou ela.

Não voltei e ela correu em minha direção até me alcançar, me segurar pelo braço e me fazer sentar na areia outra vez.

- Lu, você acha que assim você resolve sua vida? Presta atenção no que você está fazendo. Se você não quer mais ela, deixe isso claro, mas se ainda a quiser, dê uma chance – despejou.

- Eu já disse mil vezes que não quero mais ela – falei.

- Luisa, até onde eu sei, Carol é uma mulher inteligente e deve conhecer você muito bem. Dependendo de como você disse que não quer mais, ela pode achar que ainda há alguma esperança – analisou ela.

- Agora você vai querer conhecer meu relacionamento melhor do que eu? – perguntei.

- Não, Lu. Acontece que tenho mais anos de estrada do que você e conheço relacionamentos. Eles se repetem. Não ache que seu sofrimento é único. Todos os dias milhares de relacionamentos terminam e outros tantos começam e a vida segue – disse.

- Você ia se dar bem com ela. Mania de analisar o comportamento humano – alfinetei.

- Olha, Lu, vou fingir que nem ouvi sua provocação. Até porque você sabe que se eu quisesse me dar bem com alguém aqui, não ia ser com ela, não é? – perguntou me roubando um beijo.

Empurrei-a devagar e ela me olhou rindo, dizendo:

- Eita, sina que eu tenho de gostar de mulher complicada – falou ela levantando e me puxando pela mão.

- Mas sério, Lu, eu quero te ver feliz – completou.

- E você acha que para eu ser feliz eu tenho que perdoar Carol? – perguntei em tom de ironia.

- Talvez. O perdão é necessário para que você siga com sua vida sem ela ou até para que vocês se acertem de vez – falou.

- Vou pensar nisso – prometi.

Ela piscou pra mim como se tivesse cumprido seu dever.

- Ela disse que volta em uma semana – soltei.

- Olha ai! Quem sabe vocês não conversam – ponderou.

- Quem sabe – eu disse.

Ela me prendeu pelo pescoço e beijou minha cabeça.

Por AcasoOnde histórias criam vida. Descubra agora