II

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— Senhorita Nestari, poderia ir direto ao momento em que você e a senhorita Zumach se envolvem sexualmente?

— Senhor promotor, me perdoe por todos esses detalhes, eu poderia simplesmente dizer que fui aliciada por uma mulher bem mais velha do que eu, já que ela não se encontra entre nós, mas eu tenho uma dívida a ser paga, por isso eu insisto que o senhor me permita contar a história detalhadamente.

— Senhorita, não temos todo tempo do mundo.

— Eu entendo, apesar de todos os detalhes, minha história será mais breve do que o senhor imagina.

"O tempo foi passando e ir para o curso todos os dias se tornou uma rotina, nada de diferente acontecia. Eu era a aluna estranha da sala, os demais alunos me olhavam de forma esquisita, eu não sei se era por causa da minha cara de psicopata, ou se era por causa da minha timidez. Eu via medo nos olhos deles, mal sabiam que eu era um ser inofensivo e mal compreendido, mas já havia passado algum tempo e eu não tinha feito nenhuma amizade, nem mesmo alguém que eu poderia fazer um trabalho em dupla, eu via aquela sala cheia e ao mesmo tempo vazia. Era Segunda-Feira, estava chovendo muito forte, mas mesmo assim, peguei minha mochila e fui para o curso, na esperança de ao menos falar casualmente com alguém, algum aluno, professor, qualquer ser humano, mostrar para alguém quem era eu. Quando cheguei na sala naquela noite, só havia uma pessoa, talvez a única pessoa de fato que me importava naquele colégio. Eu não gostava de admitir isso para mim mesma, mas estar em uma sala sozinha com a bela Verônica, era minha oportunidade de pelo menos conhece-la um pouco, como ela era de fato, se tinha senso de humor, ou saber sua história, seus hobbies, suas paixões, mas minha timidez era enorme, e eu não tinha um assunto plausível para conversar, eu me sentia como uma pré-adolescente apaixonada, era uma coisa tão idiota, humilhante, mas a curiosidade sobre sua vida estava me corroendo por dentro, e eu, não poderia simplesmente perguntar, como se não bastasse minha aparência estranha, perguntar algo sobre ela só iria piorar minha imagem, resolvi ir até a biblioteca e pegar qualquer livro, acho que falar sobre leitura seria um bom começo, cheguei na porta da sala, respirei fundo e entrei, peguei uma cadeira e coloquei perto de sua mesa, ela olhou no fundo dos meus olhos, minhas mãos ficaram trêmulas de repente, apoiei meu livro na mesa, e quase gaguejando perguntei se ela lia com frequência. Ela sorriu, e me respondeu que gostaria de escrever e ler a própria história, ela acreditava que a sua vida daria um bom livro, meus olhos brilhavam feitos duas estrelas, eu fiquei imensamente interessada pela história daquela mulher, mas eu não poderia simplesmente pedir a ela que contasse, eu precisava conquistar a confiança dela, então eu simplesmente contei a minha. Falei sobre a minha experiência com a depressão e sobre todos meus amores impossíveis, sobre sofrer calada pois todos meus relacionamentos eram absurdos, falei também sobre o provável abandono que sofri de meus pais e de como eu me sentia sozinha naquela cidade. Ela não parecia impressionada com o resumo da minha vida, ela olhava com um certo "desdém", e disse que acreditava que minha vida era interessante o suficiente para ser escrita, mas que diferente da minha história, os amores de Verônica não eram impossíveis, eram necessários. Quando ela disse essas palavras, eu tive uma sensação de que Verônica era uma mulher infeliz, talvez havia passado por um casamento que não havia dado certo ou algo do tipo, mas não questionei, ela falou por si só. Verônica não era uma pessoa muito sentimental, talvez se não fosse imposição da família, Verônica nunca havia casado na vida. Ela dizia que teve um casamento que não deu certo desde o início, além de nunca ter pensado em se casar, seu ex-marido era um homem totalmente autoritário e detestável, fazendo-a viver em uma rotina totalmente estressante, seu casamento era regado de mentiras e traições o que fez ela tomar providências e se separar, ela disse também que era casada pela segunda vez, e se por um acaso o marido lhe pedisse o divórcio naquele momento, ela não iria se importar. Verônica era uma mulher fria demais para se envolver romanticamente com alguém, enquanto ela fazia um breve resumo sobre sua vida amorosa eu sentia que ela estava presa a um relacionamento, e que ela não odiava o marido necessariamente, ela só não estava vivendo da forma que ela gostaria de viver, por causa das críticas alheias. Sinceramente, eu nunca acreditei nessa balela de não se importar com seus casamentos, apesar de Verônica parecer uma mulher fria, eu tive a sensação, de que ela tentava ocultar certos sentimentos para não parecer uma mulher fraca e clichê. Quanto mais ela falava mais eu ficava concentrada na história. A frieza com que ela contava sobre seus casamentos me deixava ainda mais atraída por ela, alimentava inconscientemente a possibilidade de um dia eu tê-la nos meus braços, antes mesmo de admitir para eu mesma minha atração por ela.

Eu nunca gostei de clichês e Verônica era diferente de todas as pessoas que eu havia visto na vida, ao mesmo tempo que eu via uma mulher poderosa e com um certo nível de arrogância, por mais que ela tentava esconder, eu também via uma mulher simples e amorosa, mas em todas as vezes ela deixava explícito a frieza em relação aos seus relacionamentos, parecia que ela nunca houvesse sentido o amor de um outro ser humano de forma romântica. Durante toda a conversa, ela salientava que sua vida conjugal era mecânica e sem paixão, ela vivia numa rotina e era cômodo demais para ela tomar uma iniciativa de divórcio. Naquela mesma conversa, Verônica chegou a insinuar que talvez tenha casado pela segunda vez por causa de seu filho, Gregório, fruto de seu primeiro casamento, ela ressaltou que não seria capaz de educar o menino sozinha, já que depois do divórcio, seu ex-companheiro sumiu e nunca mais voltou para ver o filho.

Quando cheguei em casa naquela noite, antes de dormir, refleti sobre o que ela havia me dito, minha curiosidade sobre a vida de Veronica tinha aumentado ainda mais, inconscientemente eu criei um universo de fantasias na minha mente, onde Verônica vivia presa em um relacionamento que nunca deu certo, e talvez nunca tenha dado certo, de fato. Eu a imaginava presa a uma coisa tão difícil e tão fácil de se soltar, e que qualquer opção que ela escolhesse, iria ter consequências. E ela escolheu continuar presa e sacrificar sua própria felicidade. "

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