36 - SÉTIMO DIA - O FIM

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Confesso meu lapso de memória ao deixar meu pouco lado racional e permitir que meus instintos animalescos me guiassem.

Não me lembro da conversa que tive com Daniel naquela tarde ventosa mais, muito menos como ou quando chegamos ao meu apartamento. Não sei o que disse ao porteiro, ou se pessoas curiosas tentaram nos bloquear o caminho. O que eu sei é que eu tinha um único foco e Daniel me acompanhava, pois, mal havíamos entrado, ele me puxou com ferocidade, me cobrindo com seu calor e me fazendo enlouquecer com os seus anseios por mim. Estava diferente da noite passada, na qual eu suspirava e gemia com sua ternura e seu cuidado em me fazer sentir segura e amada em seus braços. Naquele momento, porém, eu pude perceber o quanto Daniel me desejava e notava o que poderia ser o cúmulo do meu desejo por ele. Eu já não tinha o mínimo controle das minhas ações e estava morrendo, no ponto mais alto das minhas vontades, por isso.

– O que você está fazendo comigo? – Perguntou ofegante.

– Não... – Delirei. – É você! Você está me mudando.

Por ele eu havia percebido minha existência. Por ele eu estava respirando...

– Você descobriu um coração em mim – murmurei em certo momento. – Abriu uma porta... Por favor, não a feche!

Meu êxtase não me permitiu perceber a expressão de Daniel ou o que ele poderia ter dito mais, que não feito. Percebi apenas que ainda nos amávamos quando um novo sol despontou no horizonte. ... Oh não! Era o sétimo dia! Também era o meu último... Eu podia não me lembrar de muita coisa dita, mas eu tinha certeza que não contara a ele sobre mim, muito menos sobre aquela "brincadeira" que o envolvia.

– O que foi Vic? Você ficou séria de repente...

Agitei um pouco a cabeça, esbocei um sorriso e, mesmo com a visão um tanto embaçada após aquela noite louca e inacreditável, procurei fita-lo para dizer:

– Preciso ir ao banheiro.

Sem me importar como eu estava, me levantei e me afastei. Eu podia perceber cada passo que eu dava e me senti adoecer... Era como se eu estivesse caminhando para a morte.

No banheiro coloquei um roupão e usei da pia para me amparar, não conseguindo suportar meu próprio peso, assim abaixei a cabeça. Meu incômodo estava tão grande que senti que todas as lágrimas do mundo não seriam suficientes para me fazer amenizar o mínimo que fosse do meu tormento. Elevei um pouco o rosto para me ver no espelho. Ali eu percebi... Eu estava mais repugnante do que nunca! Eu me odiava tanto! Eu, somente eu, havia cavado minha própria sepultura e ela viria logo, eu tinha certeza disso. Eu não me importava comigo, há muito tempo deixei de me importar, mas o mal que eu estava fazendo para o homem que despertou minha existência estava me arrasando.

O tempo estava passando e eu ainda me recriminava no banheiro e lamentava profundamente não ser como qualquer outra pessoa. Eu não tinha liberdade para amar... Na verdade, como eu poderia saber o que é isso? Eu nunca havia tido qualquer exemplo, até os últimos dias em que me deixei levar pela ilusão daquele amor platônico com ele. Em meio a tudo isso, não pude ouvir nada que pudesse vir de Daniel. Eu não sabia se ele havia saído da minha cama ou se me esperava nela ainda. Mas, não achei estranho... Era um sinal! O sinal do meu fim.

Me recompus no máximo que pude e voltei, disposta a enfrentar o que eu havia feito, mas eu não conseguia erguer minha cabeça como antes.

Era incrível perceber que eu não conseguia falar, ainda assim, eu sabia que Daniel descobriria tudo. Na verdade, eu podia apostar que ele já havia descoberto, embora não soubesse dos detalhes... Ah, "apostar"!

FRAGILIZADO - Livro 3 [COMPLETO] - Trilogia Irmãos AmâncioOnde histórias criam vida. Descubra agora