capítulo 9

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William


Era só mais um dia como qualquer outro, tirando o fato de ter passado o tempo todo pensando nela. Nora. Eu só precisava ir até a parada e esperar o ônibus para vê-la, mas no caminho, em um dos trechos menos movimentados, ouvi passos atrás de mim. Muitos passos. Andando juntos como numa passeata, porém mais apressados. Uma sensação incômoda me invadiu e eu tive que olhar para trás para me certificar de que não era nada demais. Mas era algo. Um grupo de cinco caras caminhando rápido e olhando para baixo, com capuz cobrindo suas cabeças.

Pensei: merda! E comecei a correr, ouvindo instantaneamente o som da corrida, forte e sincronizada atrás de mim. Não sou um atleta, nunca gostei de esportes, tenho asma, que no inverno me faz penar bastante. Estamos quase no inverno. Fui alcançado e eu sabia que seria.

Encurralado em uma ruela, só conseguia pensar na minha mãe. Ela sofreria quando descobrisse que eu tinha sido atacado e morto. Eu morreria, era certo.

Os caras chegaram perto e puxaram uma toca ninja para cobrir seus rostos. Como se eu não os conhecesse. Os mesmos babacas que me perseguiam desde o nono ano. Pelo visto tinham se tornado profissionais. Costumavam ser três, a equipe aumentou.

De costas eu encontrei a parede do fim do caminho. Estava gelada. Então seria assim? Assim que eu morreria? Pouco honrado e bastante covarde. Imaginava no futuro, os alunos do ensino médio pesquisando meu nome para um trabalho escolar. Num futuro onde eu seria um poeta famoso. E na minha biografia veriam que a causa da minha morte foi por espancamento no beco. Horrível.

Desculpa mãe.

Eu não falei nada. Não questionei nada. Só fiquei ali e aguardei, rezando para que fosse rápido. O primeiro veio trazendo o soco no estômago que me tirou o ar, me fazendo encolher e cair de joelhos com os braços ao redor da barriga. Seria rápido, muito rápido. Um soco e eu já estava no chão lutando pelo ar. Fraco. Mas isso não impediu meu agressor de me acertar outro soco, agora em cheio no olho. Caí deitado, praticamente fechando o caixão por sobre mim, consciente. Os chutes vieram de todas as direções, acertando todas as partes que se podia, até que eu não vi mais nada.

Não sei de que jeito, mas me acharam. Acordei com algumas vozes femininas e levantei, havia dor em todos os meus ossos. Caí de novo, sem forças de parar em pé e muito zonzo. As vozes diziam para eu não me movimentar, que a SAMU já estava a caminho. Perguntaram meu nome e eu respondi junto com o número de casa, precisava avisar meus pais. Ouvi a sirene ao longe, percebi que estavam mexendo em mim e depois eu dormi.

Acordei de novo, estava num quarto de hospital e minha mãe ao lado da cama. Tinham me dado remédios fortes, já não sentia mais dor. Logo o médico apareceu e eu teria alta, pois não tinha quebrado nada. Foi uma surra e tanto, disse ele, como se aquilo fosse corriqueiro e normal. Mas eu estava bem, só precisava descansar e não me meter mais em confusão.

Eu não respondi. Seria inútil. Mas minha mãe, ah a minha mãe, rodou a baiana.

— Quem o senhor pensa que é pra dizer isso do meu bebê?! Meu filho é um menino de ouro! Ele foi atacado por bandidos! Seu, seu babaca!

— Mãe...

Foi só o que eu disse. O médico a deixou falando sozinha e saiu, tinha mais coisas pra fazer. Minha mãe ficou gritando no corredor até ser retirada por alguns enfermeiros.

Ela estava muito braba. Muito! Como eu tinha visto poucas vezes. Fomos embora, meu pai dirigiu feito lesma, porque a mãe disse que os movimentos poderiam quebrar meus ossos. Eu não via a hora de chegar em casa e ficar sozinho no meu quarto com meu caderno. Queria saber se ainda conseguia escrever ou se aqueles idiotas tinham ferido minhas mãos.

Sentidos {DEGUSTAÇÃO}Onde histórias criam vida. Descubra agora