Capítulo 23

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Os óculos escuros pareciam ser a melhor opção naquele momento. Após deixar North na escola, voltei ao centro da cidade à procura de algum curso, porém agora sozinha. Em mãos, uma lista de endereços de alguns cursos que eu havia pesquisado na internet e o objetivo era ir de porta em porta. O sol quente daquela manhã não combinava nada com a chuva do dia anterior e muito menos com meu humor.

— Vai à merda, então! — xinguei em português mesmo quando me negaram o primeiro curso assim que escutaram a palavra brasileira. Hipócritas. Após andar mais um pouco, encontrei dois cursos que seriam perfeitos, se não fossem pela duração. Só me restavam quatro meses nos Estados Unidos e eu precisava de algum mais ou menos com esse período. Mais um curso negado, por não aceitarem intercambistas. E mais dois, que, além de não ter encontrado o endereço, eu ainda havia me perdido. Naquele momento, eu não fazia ideia de onde estava. Avistei uma lanchonete na primeira esquina e resolvi entrar, não só para pedir informação, mas também para comer algo. Estava morta de fome.
— Poderia me dar uma informação, por favor? — perguntei ao atendente, que prontamente me atendeu. — Qual o nome dessa rua? — perguntei, mordendo meu lábio inferior sem graça. O rapaz deu uma risadinha fraca e me respondeu. Sorri em agradecimento e fiz meu pedido, logo me virando em direção alguma mesa.
— Perdida? — escutei uma voz atrás de mim e logo me virei dando de cara com Lucas. O moreno estava de bermuda, camisa e chinelos. — Escutei sua conversa e... Sério que alguém consegue se perder aqui? — ele se aproximou, rindo. Prendi meu riso e disse:
— Alô, eu sou de outro país! — me defendi. Lucas imediatamente me chamou para se juntar com ele em sua mesa e não pensei duas vezes. — O que faz aqui? — perguntei, tirando meus óculos escuros e colocando minha bolsa em cima da cadeira.
— Minha casa é a um quarteirão daqui. — me respondeu. — E você? Veio me visitar? — Lucas disse, convencido, e eu rolei os olhos.
— Como se eu soubesse onde você mora. — ri e logo peguei o papel com os endereços dos cursos que eu estava à procura. — Estou desesperadamente procurando algum curso para fazer... — falei, jogando meu cabelo para trás e Lucas me olhava atentamente.
— Que tipo de curso você quer fazer? — debruçou seus braços em cima da mesa e o atendente nos interrompeu por um minuto com o meu pedido.
— Eu fazia faculdade de arquitetura, então queria algo relacionado a isso... — respondi, já me preparando para comer. Mostrei a ele o papel com a lista dos cursos.
— Essa última aqui é uma empresa de designer de interiores. — ele disse.
— Como você sabe? — perguntei, curiosa, mas sem tirar atenção do que eu estava fazendo.
— É da minha família. — falou, rindo, e eu mal pude acreditar. — Se você quiser, eu posso te levar lá...
— Ai, vai ser ótimo! — nem deixei Lucas terminar sua frase e ambos rimos com minha euforia.
— Mas antes preciso passar em casa... Você me acompanha? — ele perguntou, já se levantando. Acompanhei Lucas com o olhar e tive certeza de que qualquer uma amaria estar no meu lugar.
— Não posso demorar... — respondi, logo o acompanhando depois. Chegamos ao apartamento de Lucas cinco minutos depois. Ele me deixou na sala enquanto foi se trocar. Realmente deu para perceber que ele entendia do assunto. A casa de Lucas era maravilhosamente decorada. Cada espaço era preenchido com alguma coisa, eu mal sabia para onde olhar.
— Curtiu? — ele apareceu de supetão, me pegando babando pela decoração.
— Acho que estou apaixonada... — falei, rindo e olhando ao redor.
— Nossa, já? E olha que eu nem te levei no quarto, hein... — Lucas brincou e eu fiz careta do comentário do rapaz. — Vamos? — concordei com a cabeça e fomos para o nosso objetivo. Fomos em seu carro e tenho que admitir, era impossível ficar ao lado de Lucas sem rir, ele realmente conseguia fazer uma pessoa se sentir bem. Chegamos à empresa de designer de interiores. Lucas entrou cumprimentando todos, e logo me apresentou a seu pai. Ele explicou que eu era do Brasil e que fazia faculdade de arquitetura. Andei pela empresa inteira com Lucas e seu pai. Ambos me mostraram alguns projetos e eu lembrei o quanto amava isso. O pai de Lucas disse que infelizmente não tinha nenhum curso para me oferecer, ainda mais com a pouca duração que eu queria, mas que o que ele poderia me oferecer era um estágio. Meu peito se encheu de alegria, isso seria perfeito. Não seria remunerado, até porque o programa de intercâmbio não permitia, mas seria um estágio em que eu obteria conhecimento, ou seja, quase um curso.
— Lucas, eu nem sei como te agradecer. — falei, assim que saímos da empresa.
— Eu sei... — ele falou, rindo, e eu dei um leve tapa em seu braço. — Calma, Mila... Não é nada do que você está pensando. — era minha vez de rir, passando a mão em meus cabelos.
— Eu não estou pensando em nada. — fiz uma cara inocente.
— Um jantar, que tal? — ele perguntou, galanteador. Abri a boca em contestação e Lucas me interrompeu. — Não precisa me responder de imediato... Agora você faz estágio onde eu trabalho e digamos que nós vamos nos ver muito. — ele explicou e eu assenti. Depois de algumas explicações de Lucas em como chegar à escola de North, eu logo fiz, buscando a pequena e voltando para casa. Passei o resto do dia com a menina em seu quarto. Primeiro, a ajudei com seus exercícios de casa, que não eram poucos, e depois ficamos jogando videogame. Já era mais de dez horas quando coloquei North na cama depois de ter a ajudado no banho e dado de jantar para ela. Fui em direção ao meu quarto, porém antes parei em frente à porta do quarto de Shawn e senti um aperto no peito. Eu não queria que ficasse esse clima ruim entre nós dois, e ele tinha que acreditar em mim. Bati duas vezes na porta e ele nem sequer me respondeu. Ousei em abrir, porém Shawn não estava ali, o que fez com que eu desse uma volta na casa à procura de Shawn, e logo o encontrei nos fundos da casa.
— Será que a gente pode conversar? — perguntei, andando pela beirada da piscina até chegar à espreguiçadeira em que Shawn se encontrava. Ele, que estava com um livro em mãos, fechou na mesma hora e se ajeitou, dizendo em seguida:
— Se tiver a ver com North ou com a casa... Claro. — me encarou. Senti minha garganta fechar naquele instante e todas as palavras sumiram naquela hora. Encarei a piscina e imediatamente uma noite me veio na memória, de quando eu e Shawn ficamos pela segunda vez. — Então? — escutei sua voz longe.
— Shawn... — despertei do transe e me sentei na espreguiçadeira ao seu lado. — Eu quero te explicar o que realmente aconteceu. — falei, juntando meus braços no corpo, já que o vento estava gelado e minha roupa não era apropriada para aquele clima.
— Você não tem que me explicar nada. — ele disse, seco. Shawn sentou na espreguiçadeira, virando de frente para mim. Suspirou e me encarou. — Camila, nós cometemos um grande erro... — ele começava e eu podia ver como ele estava inquieto. — Não sei o que deu em mim em me relacionar com você, quando, na verdade, eu tinha que ser só o cara que te acolheria. — meus olhos já se enchiam de lágrimas de novo, porém eu me negava a chorar. — Acho que o maior erro foi meu em ter te dado tanta intimidade...
— Shawn, eu não acre...
— Eu não terminei! — ele falava, seco. Olhei assustada para Shawn e apreensiva. — Eu passei por um momento difícil na minha vida, e você estava comigo, acontece... As pessoas são fracas e eu me deixei levar. — ele continuava e eu engoli a seco, recebendo todas aquelas duras verdades que Shawn dizia. — Vamos voltar no tempo e fazer tudo certo, ok? — Shawn juntou suas mãos como se concluísse uma ideia. — Você é a au pair que cuida da minha filha e me ajuda em casa e eu sou a pessoa que te acolhe nos Estados Unidos, fim. — finalizou. Eu abri a boca para responder, mas não saiu palavra alguma. Eu estava completamente decepcionada e abalada, mas jamais deixaria que Shawn reparasse isso. Eu não iria insistir mais. Não me humilharia.
— Tudo bem... Sr. Mendes. — levantei-me, dando as costas para Shawn. Se era assim que ele queria, era assim que ia ser.

Au Pair • shawmila << adaptada >>Onde histórias criam vida. Descubra agora