Capitulo 44

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Nem o céu azul com o maior sol que eu já tinha visto desde que cheguei em San Diego me animava naquela manhã. Eu estava um caco. Com olheiras. Dor de cabeça. Eu estava literalmente fodida. Enquanto Kim e Justin tagarelavam sobre Shawn, eu apenas conseguia prestar atenção no teto do quarto de Kim, que, naquele momento, me parecia a coisa mais interessante do mundo.
— Sei que você está na fossa, mas o Lucas precisa de você. —Jade falava, me fazendo despertar, e só então eu me lembrei do aniversário de Nate.
— Ah, que ótimo... — me levantei da cama, sentindo um peso em meus olhos por não ter dormido direito durante a noite. Além de estar um caco, eu ainda teria que ajudar na festa, sorrir para os convidados e aturar Hailey com seu teatro. Por favor, alguém me ajude.
— Eu não vou poder ir hoje, Mila. — Justin dizia, fazendo um bico feito uma criança, e eu repeti sua expressão.
— Eu sei... Jade já tinha me dito. — falei, sorrindo fraco, mencionando o fato de que Justin não poderia participar da festinha de Nate, já que teria que buscar uma tia em outra cidade.
— Vai com ela, Jade. — Justin falava, balançando a cabeça em direção à porta.
— Eu vou! —Jade dizia se, levantando. — Vou ficar do seu lado o dia inteiro hoje, ok? — ela me abraçava e eu apenas sorri em agradecimento.
— Vocês deviam se casar, sabia? — falei, olhando para os dois, sorrindo, mesmo estando um pouco desanimada. — Se eu for embora, vou morrer de saudade de vocês dois e...
— Você não vai embora! — Justin me interrompia, vindo em minha direção.
— E se você for eu embora, eu vou dar um jeito de ir para o Brasil te ver! — minha amiga falava, me encarando, já chorosa.
— Tira isso da sua cabeça, Mila... Vai dar tudo certo. — o homem passava a mão em meu ombro carinhosamente e eu sorri fraco, sem acreditar em sua frase. Passei a manhã conversando com Justin sobre Shawn. Ninguém melhor para desabafar sobre Shawn do que com o melhor amigo dele. Justin insistiu em dizer que tudo ficaria bem, que Shawn estava apenas passando por uma fase ruim, mas que, no fundo, ele me amava. Eu acreditava nisso. Shawn já tinha me provado antes que era apaixonado por mim só por ser quem ele era. Eu só não conseguia entender o que havia acontecido com ele. O sentimento havia acabado? Ou ele estava enlouquecendo assim com sua ex-mulher? Estava difícil para eu assimilar tudo. Eu só queria, no fundo, que toda essa tempestade passasse e que Shawn voltasse a ser o homem maravilhoso por quem eu me encantei.
O aniversário de Nate rolou normalmente. Exatamente como eu havia dito que aconteceria, Hailey andava pela casa, sorrindo, se fazendo de boa mãe. Na hora do bolo, Leah ficou atrás da mesa, ao lado de Lucas, com Nate no colo. Shawn assistiu a cena com os olhos perdidos. Talvez tentando aceitar ou entender. Meu coração me mandava ficar ao seu lado naquele momento, para apoiá-lo. Mas, na situação que eu estava, meu orgulho falava mais alto, e a única coisa que eu fiz foi ir para perto de Kylie e ouvir comentários insignificantes de como Lucas estava lindo com a camisa social escura que ele usava.
— Então é ele? O escolhido? — perguntei enquanto cutucava Ky, tentando me distrair.
— Não sei, Mila... — ela falava, balançando a cabeça, fazendo uma expressão triste.
— Quer a minha opinião? — cochichei para a menina, que apenas afirmou com a cabeça. — Eu não vejo o mesmo brilho nos seus olhos quando você fala do Matt igual eu vi agora enquanto você elogiava a camisa do Lucas. — falei, sorrindo, olhando para Kylie, que agora suspirava encarando Lucas. — Entendeu? — cochichei novamente a abraçando de lado, que abriu um largo sorriso. Eu tentei ao máximo não me socializar, porque com a cara de enterro que eu estava, qualquer um perceberia que algo de errado estava acontecendo. Eu não queria que a família de Shawn ou a de Hailey soubesse dos meus problemas. Já bastavam os meus amigos, que viviam me escutando choramingar pelos cantos. Eu não queria mais meter ninguém nisso.
— Shawn, vem tirar uma foto com a gente! — escutei a voz de Hailey, que estava atrás da mesa do bolo com os filhos, enquanto a mãe de Shawn esperava ansiosa por seu filho para fotografar a linda família. Quem vê, realmente acredita.
No final da noite, eu resolvi levar Ky e Jade para casa, já que elas estavam sem carro naquele dia. Todos os convidados já tinha ido embora, apenas os pais de Hailey estavam conosco. Aproximei-me de Shawn, que conversava com a Sra. Felder, para pedir o carro emprestado para que eu pudesse levar as meninas em casa.
— Claro. — ele falou, sorrindo, tentando ser amigável, avisando que North iria para casa de sua mãe e Nate, para a casa dos pais de Hailey. Sem as crianças, seria muito mais fácil nós arrumarmos toda a bagunça da festa no dia seguinte.
— Fala sério, você está apaixonadinha pelo Lucas,Kylie... — Jade implicava com a amiga, que rolava os olhos, tentando não rir.
— Eu não sei da onde ela tirou isso de Mattheww, nada a ver. — fiz uma careta, sem tirar os olhos da estrada.
— Você fala isso porque já teve um rolo com ele... — Ky se defendia, tentando me atacar. — Nossa, claro que não... — falei, já estacionando em frente à casa das meninas. — Hoje em dia eu não sinto mais nada por ele. — me justifiquei e Jade concordou comigo. Minhas amigas insistiram para que eu entrasse um pouco, no mínimo elas queriam me animar, me ajudar a se distrair, mas eu realmente não queria.
— Você vai ficar bem? — Jade perguntou, levantando uma sobrancelha, e eu balbuciei algo em afirmação. Acompanhei com o olhar as garotas entrando, rindo de Kylie levando um empurrão de Jade antes de entrarem em casa, e suspirei sentindo um aperto no peito. Balancei a cabeça antes que minha mente começasse a me fazer pensar em coisas negativas e rapidamente dirigi de volta para casa de Shawn, estacionando o carro na rua.
— Boa noite! — retribuí a saudação de um vizinho ao passar por ele, sorrindo visivelmente forçado. Quando botei os pés na cozinha, ouvi algumas risadas e estranhei, já que não havia mais nenhum convidado na casa. Andei lentamente até a sala, dando de cara com Hailey e Shawn sentados no tapete da sala. Encostei-me na parede que dividia os dois cômodos e olhei atentamente, sem acreditar na cena que eu via. Hailey estava com a câmera na mão, provavelmente mostrando as fotos da festa que havia acabado de acontecer. Shawn olhava as fotos e fazia comentários, recebendo risadas de Hailey. Senti meu corpo travar ao ver aquela cena. Fechei meus olhos e levei minhas mãos até meu rosto, tentando me controlar. Era uma típica cena de família e Shawn aparentava feliz. Como se nada tivesse acontecido, como se Hailey não tivesse tornado sua vida um inferno. Shawn estava ali, sorrindo para ela, como exatamente sorria para mim. Abri os olhos para encará-los novamente, para encarar a realidade e percebi que era melhor ter ficado com os olhos fechado, talvez para sempre. Minhas pernas tremeram com a cena que eu tinha acabado de assistir e, por um momento, eu havia me esquecido como respirar. Hailey havia acabado de beijar Shawn. Ele não se afastou. Ele não recusou. E foi com aquela cena que eu percebi que não havia mais espaço para mim ali. Minha respiração falhou e eu tive vontade de ir embora. Na verdade, uma vontade que já me consumia há muito tempo. Meus olhos imediatamente se encheram d'água e eu comecei a fazer a única coisa que eu vinha fazendo nos últimos dias... Chorar. Levei minhas duas mãos até a boca e tentei segurar o choro, para que ninguém me ouvisse. Meu peito se fechou em uma dor inexplicável. Minhas lágrimas rolavam tão rapidamente que eu já não enxergava nada. Apenas tentei manter minha sanidade e minha respiração para que eu não desmaiasse naquele momento. Despertei do meu transe ao escutar um barulho e rapidamente me escondi atrás do armário, vendo Shawn passar pela cozinha e logo batendo a porta. Eu estava estática, encolhida no canto da cozinha, com a boca entreaberta, em estado de choque.
— Camila? — escutei a voz de Hailey e drasticamente levantei minha cabeça. Tremi de ódio ao encontrá-la me olhando com um sorriso torto e um olhar que eu nem conseguia decifrar. — Espero que você não fique chateada com o que acabou de ver... — ela dizia, passando a mão por seus cabelos.
— CALA A BOCA! — gritei enquanto me levantava, indo em direção de Hailey.
— Você vai fazer o quê? Me bater? — ela falava, fingindo estar ofendida. — Era só o que me faltava. — a mulher falou, virando-se de costas para mim.
— Você não sabe como eu queria poder acabar com você agora. — disse, já de pé, com o rosto encharcado.
— Por quê? — Hailey me olhou, cínica, com os braços cruzados. — Por causa do beijo que você viu? Você acha que foi o primeiro desde que eu voltei? — ela perguntou enquanto ria e a única coisa que eu conseguia fazer era chorar. Mas no fundo tinha uma voz dizendo que eu não podia aceitar aquilo. Eu não podia permitir que aquelas palavras me tornassem inútil. — Não adianta chorar, Camila... — a mulher falava, se aproximando de mim. — Você perdeu. — Hailey estava com a cabeça erguida e seu tom de voz realmente era de um vencedor. — Eu não disse que sua vida ia estar longe de ser um conto de fadas? — seus olhos ardiam de ódio, assim como os meus.
— Por que você me odeia tanto? — perguntei, balançando a cabeça, e recebi mais uma risada como resposta.
— Simplesmente porque eu não consigo aceitar o fato de que uma vadia como você conseguiu pegar o meu lugar. — suas palavras entraram em meu ouvido como um choque de realidade. E eu nem tentei evitar quando senti meu braço erguido e minha mão indo de encontro ao rosto de Hailey. Eu tinha acabado de realizar um sonho. Meter a mão na cara de Hailey.
— CALA A SUA BOCA! — repeti a frase que iniciou nossa amigável conversa. — Quem você pensa que é para falar alguma coisa de mim? — foi a minha vez de encher o peito e ir para cima dela.
— Camila, você acabou com o meu casamento, tirou meu marido de mim, ATÉ MEUS FILHOS VOCÊ CONSEGUIU TIRAR DE MIM! — ela falava com a mão no local em que eu havia batido. Os olhos de Hailey também estavam cheios de água e eu percebi que naquele momento nós duas estávamos desabafando o que havíamos segurado por muito tempo.
— Tudo bem, Hailey... — eu disse, secando minhas lágrimas e respirando fundo. — Não tiro sua razão... — falei, balançando a cabeça freneticamente. — Me desculpa. — disse, soluçando. — O que eu fiz não foi certo e eu admito isso... Mas, Hailey, eu nunca te tratei mal, eu nunca te coloquei para baixo, eu nunca te humilhei... — a mulher me escutava atentamente, mesmo sem me encarar. — Eu sempre fiz de tudo para te ajudar, mesmo não te suportando. — eu tentava não gritar quando, na verdade, era essa minha vontade. Eu estava jogando toda realidade na cara de Hails e o que eu mais queria era berrar para o mundo ouvir. — Eu não acabei com o seu casamento porque não se pode acabar com algo que já acabou... E, Hailey, você nem sequer gosta do Shawn... — eu disse, gesticulando com as mãos. — O que acontece é que você não consegue suportar vê-lo feliz com outra pessoa... E era isso que ele estava sendo... que NÓS estávamos sendo... Felizes... — eu disse, engolindo o choro. — Até você voltar. — falei, sentindo uma última lágrima descer pelo meu rosto, que já fervia.
— Camila, presta atenção no que eu vou te dizer... — Hailey se aproximou de mim, segurando em meu braço com força. — Você foi um passatempo para o Shawn, uma diversão... O que vocês tiveram foi só um romancezinho de quinta, e quer saber? — ela me puxou para mais perto, aproximando nossos rostos. — Você nunca significou NADA para ele. — Hailey finalizou, me empurrando, enquanto largava meu braço, deixando uma marca vermelha ali.
— Quem não significou nada para ele foi você, Hailey... — eu disse, bem mais calma do que antes. — Não é à toa que ele largou você para ficar comigo. — disse, por fim, deixando Hailey sozinha, correndo em direção à rua. Eu não tinha certeza do que eu tinha acabado de dizer. Mas eu não ia deixar essa conversa terminar com a Hailey achando que era melhor do que eu. Eu assumi meu erro, fui sincera com ela, mas, mesmo assim, Hailey continuava provando que era a pior pessoa do mundo.
Fiz sinal para o primeiro táxi que passou e corri em direção à casa de Lucas. Um dos únicos que esteve ao meu lado nos últimos tempos. Lucas me recebeu assustado quando me viu aos prantos e demorou bastante tempo até que eu conseguisse me acalmar e contar tudo o que havia acontecido. Eu estava mais do que decidida a ir embora. Naquele momento, nada me prendia nos Estados Unidos. Nem o fato de que aquele era o maior sonho da minha vida. Eu só queria ir embora e me afastar de tudo e de todos.
Eu passaria a noite na casa de Lucas, estava fora de cogitação voltar para a casa de Shawn naquela noite. Depois de passar horas conversando com Lucas, eu telefonei para minha coordenadora do intercâmbio. Sem dúvidas ela devia ter me xingado mentalmente quando viu meu nome na tela do celular, já que o relógio marcava mais de uma hora da manhã. Mas era obrigação dela me atender a qualquer momento, ainda mais para o motivo daquela ligação.
— Você tem certeza disso? — foi a última pergunta dela depois de uma longa conversa.
— Sim. — respondi simplesmente. Para mim, o sonho tinha acabado e nada nem ninguém me faria mudar de opinião.
Lucas me entregou uma roupa qualquer para que eu pudesse tomar banho e finalmente relaxar, depois de tanto estresse. O homem insistiu que eu comesse algo, mas a última coisa que eu estava sentindo no momento era fome. Joguei meu corpo no sofá de Lucas, que era onde eu dormiria naquela noite e respirei fundo ao encarar meu celular em cima da mesinha de centro. Já tinha passado da hora de eu fazer aquilo e, no momento, eu não tinha outra solução. Minha consciência não só implorava como me obrigava a fazer aquela ligação. Peguei o celular e senti meu coração sair pela boca a cada chamada que dava.
— Alô? — ouvir aquela voz me fez cair no choro novamente. Eu não estava preparada para aquilo e não era o melhor momento, mas eu não podia mais adiar.
— Mãe? — falei em meio ao choro, que já tomava conta de mim novamente. — Eu preciso te contar uma coisa... — e foi com essa frase que eu iniciei uma longa conversa. Uma conversa contando toda a verdade sobre o meu intercâmbio para a única pessoa que merecia o melhor de mim. Foi difícil para minha mãe entender o que eu falava, já que minhas palavras estavam sendo atropeladas por soluços, mas finalmente eu havia sido sincera com a minha mãe.
— Pode ter certeza de que vou estar te esperando de braços abertos para você chorar no meu colo. — a voz doce da minha mãe do outro lado da linha fez com que eu abrisse um pequeno sorriso. Estava decidido. Meu voo de volta para o Brasil era no dia seguinte. Estava na hora de encarar a vida e voltar para minha realidade.

Au Pair • shawmila << adaptada >>Onde histórias criam vida. Descubra agora