Capítulo 4 (segunda parte)

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II

Antes que eu pudesse me recuperar da surpresa de vê-lo no meu quarto, o Igor se defendeu.

— Sua mãe me mandou entrar, juro!

— Mandou, é? — me sentei, vestindo a camisa que estava na cabeceira — E como você se apresentou quando ela te atendeu no portão? Falou que era meu amigão da escola e que eu não via a hora de te ver?

— Eu só disse que era o Igor e que você estava me esperando.

— E eu contente achando que você não viria... — Suspirei, cheguei para um canto da cama e o convidei para se sentar na outra ponta — Mas então, o que você quer conversar?

— Só queria ter uma conversa normal com você.

— Coisa que nunca tivemos, né?

— Claro que sim, a gente conversava muito, esqueceu?

— Cara a cara a gente nunca teve uma conversa normal, Igor. Isso quer dizer que não somos amigos.

— Cara, por que nós não nos falamos mais?

Tive que rir da pergunta dele. A coisa era tão óbvia que, ou ele estava se fazendo de besta ou tinha perdido a memória, só pode. Me encostei na parede e me espreguicei enquanto ele esperava a resposta.

— Da sua parte, acho que foi porque eu soquei a sua cara na frente de um monte de gente. E da minha, acho que foi por causa da dor de corno mesmo.

— Por que a "dor de corno" se a gente não tinha nenhum compromisso?

— Deixa eu desenhar pra você: eu passei seis meses conversando contigo todos os dias, você veio, a gente ficou e eu achava que pelo menos a gente ia conversar mais, mas não, você estava ocupado, "se é que me entende" com a minha amiga. Fiquei puto? Demais. Mas esquece isso, já foi, é passado.

Ele pôs as duas mãos na boca e levantou o lábio superior, mostrando a parte interna, eu me aproximei e, com alguma dificuldade, vi uma pequena cicatriz. Acho que o aparelho ortodôntico que ele usava na época ajudou no estrago.

— Ficou cicatriz, é? — Olhei e voltei para onde estava antes, bem longe dele — Me falaram que você até jogou depois, então eu achei que não tinha sido nada grave.

— Não foi grave, mas talvez, se tivesse ido ao hospital, eu levaria alguns pontos. Tomei uns sorvetes para melhorar e fui pro jogo, só que isso infeccionou e demorou a sarar depois.

— Foi bom que você se lembrou de mim por mais tempo.

— Não foi com saudades, se quer saber.

— Entendo. Eu também não queria te ver nem pintado de ouro.

— Isso que eu demorei a entender, essa sua revolta, como se eu tivesse feito alguma coisa grave.

— Nunca se sentiu traído na vida? — Perguntei.

— Já, e bastante, mas eu não achava que as coisas fossem assim. De onde você tirou que a gente namorava e tinha compromisso um com o outro? E quem te disse que eu ia te substituir pela Amanda?

Eu baixei os olhos, mas depois o encarei.

— É, você tá certo, eu fui um idiota. Garoto bobo e iludido, não é? — Me levantei, fui até a janela e abri a cortina, depois me virei para vê-lo. — Parabéns Igor, depois de anos e anos eu admito, você tá certinho!

— Não é isso o que estou dizendo.

— Claro que é. A gente era inimigo e acabou ficando, a gente virou amigo e na primeira oportunidade fomos pro hotel lá...

Meu Mais ou Menos Inimigo (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora