Capítulo 12 - Feitiço

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(Hayley)

Cheguei em casa no horário normal, já que agora não precisava mais das sessões com a Srta. Weiss. Isso é às 15h50min da tarde e com Anna buzinando na minha orelha.

– Onde você foi? – Anna me seguiu até o quarto. Ela entrou e jogou sua bolsa ao lado da minha cama.

– Já disse... Fui até a galeria. Precisava ver uma coisa.

– O quê? – Anna colocou a mão na cintura. – Sabe muito bem que esse seu sumiço foi muito suspeito. Todo mundo na escola ficou falando.

– Falando o quê? – O que aquele povo fofoqueiro andou falando?

– Ah, que o Sr. Coulson faltou e de repente, a queridinha dele sumiu do nada. O pessoal ficou falando que vocês... Sabe?

– Aí, que bando de... – Calei-me. – Se eu quisesse ou fosse num motel com ele, acha que eu iria no horário de aula? O povo não tem criatividade nem pra espalhar fofoca. Na verdade, eu fui à galeria ver um emprego para as férias de verão. – Odeio mentir, mas era necessário. Pelo menos não estava fazendo loucuras com o Sr. Coulson.

– Onde? – Parece que a mentira colou, Anna ficou animada.

– Naquela loja de chás.

– Naquela espelunca? Papai e mamãe vão ficar tão orgulhosos. – Disse Anna com desdém na voz.

– Sim, na espelunca. Mas ainda assim é um trabalho. – Retruquei séria. – Será que dá para dar licença? – Comecei a tirar a roupa.

Anna fez uma careta, pegou a bolsa e saiu.

Mal ela deixou o quarto, tranquei a porta. Abri a mochila e peguei a sacola. Dei mais uma lida no feitiço e depois guardei tudo no guarda-roupa.

Se fosse por mim faria agora mesmo, mas precisava esperar pelo momento certo. Se não me engano hoje é o jantar na biblioteca da cidade e minha mãe como organizadora do evento e administradora do local, teria que estar presente.

Todos os anos ela organiza esse jantar beneficente, onde além de encher a cara, os visitantes faziam pequenas doações para a biblioteca. Seja com dinheiro ou com livros novos ou usados.

Todos os anos eu e Anna acompanhávamos nossos pais ao evento, mas este ano não, quer dizer, ao menos eu não iria. Tinha que aproveitar a ocasião. Ficaria com a casa só para mim e poderia fazer o feitiço sem correr o risco de ser interrompida.

Por volta das cinco da tarde minha mãe chegou em casa e como sempre carregada de caixas. Ela quase caiu ao entrar em casa.

– Deixa que eu pego pra você, mãe. – Disse ao segurá-la com uma mão e com a outra as caixas.

– Queria saber como consegue fazer isso? – Eu também gostaria. Sempre tive ótimos reflexos e força. Acho que é por isso que todas as vezes que batia no Max, deixava o cara irreconhecível.

– Talvez eu tenha algum poder sobrenatural. Quem sabe não sou um X-Men? – Disse ao colocar as caixas ao lado da escada.

– Seja o que for, você é a minha menina. – Minha mãe segurou meu rosto com as mãos e me deu um beijo em cada bochecha. – Animada para o jantar de hoje?

– Então... – Suspirei. – Eu não vou.

– Por quê? – Minha mãe que caminhava em direção à cozinha parou no meio do corredor.

– Não estou me sentindo bem. Acho que estou pegando uma gripe.

– Mas não está quente. – Minha mãe tocou minha testa.

– Só estou com o corpo dolorido.

– Ela deve ter pegado gripe com o Ryan. – Disse Anna ao sair da cozinha com uma lata de refrigerante nas mãos.

– Ryan! – Minha mãe me observou com um sorriso bobo. – O bonitão da carona?

– Para! – Fiz uma careta. – Vocês falam como se ele fosse algo meu. Só que não é!

– Porque você não quer.

– Cala a boca, Anna!

– Ah, filha! Dê uma chance. Ele é tão bonito. – Minha mãe pegou na minha mão.

– Mãe!

– O cara é uma loucura. – Anna se sentou no sofá.

– Aí, chega! – Subi correndo as escadas.

– Fale mais dele. Vamos finalmente usar o jogo de jantar chique? – Perguntou minha mãe do andar debaixo.

Meus pais tinham uma piada. Eles compraram no Natal passado um jogo de jantar extremamente chique e caro. Quando perguntei por que eles gastaram tanto? Eles disseram “Compramos este jogo para quando você trouxer seu namorado em casa”.

Por volta das sete da noite meus pais e Anna estavam prontos, mas antes de saírem, deram uma passada no meu quarto.

– Já vamos, querida. – Disse minha mãe.

– Qualquer coisa é só ligar nos nossos celulares. – Disse meu pai.

– Pode deixar. Divirtam-se.

Eles deram um beijo no topo da minha cabeça, já que estava deitada na cama e coberta com a colcha.

Meia hora após eles partirem, comecei a preparar o feitiço.

Retirei o tapete que ficava no meio do meu quarto. Ajoelhei no chão e fiz o círculo. Calculei o meio e coloquei a vela. Depois fiz os quatros círculos, que representavam norte, sul, leste e oeste.

– Devo estar louca? – Disse quando preparava para acender a vela.

“E está”

Dei um pulo e virei em direção a porta. Não havia ninguém.

– Quem está aí? – Perguntei olhando para a porta fechada.

“Como pode fazer isso comigo? Você deveria me proteger. Vai se arrepender.”

– Quem é você? – Gritei para o nada.

“Olhe para baixo”

Obedeci e vi que a chave brilhava embaixo de minha blusa. Peguei-a. A fênix estava com os olhos abertos.

“Protegi você todos estes anos. Apaguei o que a machucava e afastei quem poderia. Te dei uma nova família. Se fizer isso vai se arrepender”

– O que vai fazer?

“Eu? Nada, mas os que a procuram vão te encontrar. A única maneira de se manter e a mim a salvo, é comigo em volta do seu pescoço.”

– Mas é para isso que estou fazendo o feitiço. Para te proteger.

“Acha que uma poção vai te ajudar a lembrar de tudo? O que foi? Está com saudades dele? Ele te esqueceu e não é mais o mesmo.”

– Quem?

“Tristan”

– Você o conhece? Onde ele está?

“Sim,  mas  não  vai querer saber no que ele se transformou. Acredite em mim, se lembrar dele e o encontrar, não vai gostar do que descobrirá. Você vai sofrer muito. Pare!”

Kim tinha razão. Aquela coisa estava me impedindo de acessar minhas lembranças. Estava me mantendo  num estado de dormência. Era ela que me mantinha entorpecida. Presa numa vida que não me pertencia.

Peguei-a e a arranquei do meu pescoço e a atirei em cima da cama. Voltei a me ajoelhar diante da vela. Peguei os frascos coloridos e comecei a colocá-los nos círculos menores.

“Não faça isso. Me escute!”

Peguei o caderno e abri na página do feitiço. Coloquei-o no chão, enquanto acendia a vela. Quando a chama se acendeu, peguei o caderno e comecei a dizer as palavras.

– Peço a luz do norte, que se altere e se torne a sombra.

“Pare! Já!”

– Assim como a do sul, que ela cubra meus segredos como um lençol negro.

“Estou implorando. Pare! Não cometa os mesmos erros que eu. Você não é forte o suficiente para suportar a maldição”

– E as luzes do leste e oeste selem este pedido, que somente...

“Pare!”

– Que somente meu toque pode quebrar. – Gritei a última frase e joguei o pó negro sobre a vela.

Pensei que a chama aumentaria lentamente, mas não. Ela ficou alta e densa. Até adquirir um tom vermelho e se apagar. E junto com ela todas as luzes da casa e da rua.

Continuei ajoelhada no chão, no quarto escuro. Não havia som algum, nem mesmo a voz grave da chave falante. Não sei se foi a escolha certa. Quero me lembrar do meu passado. Sempre digo que não me importo com ele, mas na verdade, lá no fundo, eu me importo. Quero saber o por quê fui abandonada? Qual é o meu nome verdadeiro? Quem eram meus pais? E quem é Tristan? Pelo jeito que a chave falou ele deve ou devia ser importante.

Levantei-me. Peguei a vela e na hora em que caminhei em direção a cama, senti alguém segurar meu braço. Soltei um grito e olhei para trás. Mesmo no escuro, eu podia ver a silhueta de uma mulher alta, com belas curvas e com longos cabelos ondulados. Tentei soltar meu braço, mas a mulher intensificou o aperto ainda mais.

– Ainda pode desistir. – Ela tinha a voz igual à da chave. – Esqueça-o. Não vale a pena.

– Me solta! – Puxei o braço. – A vida é minha e faço o que eu quiser. – Consegui soltar meu braço e corri até a cama à procura do frasco com a poção. Tateei a cama, quando meus dedos se fecharam em torno do frasco, a mulher puxou minhas pernas. Cai com tudo no chão.

– Você não vai beber isso. – Ela subiu em cima de mim tentando arrancar o frasco das minhas mãos.

– Me solta! Não! – Gritei o mais alto que pude.

Ela começou a dobrar meus dedos para abrir minha mão.

– Socorro! – Gritei mais uma vez.

De repente ouvi um estrondo no andar debaixo.

– Você não vai fazer isso. – O frasco estava quase para fora da minha mão.

– Fora! – Alguém gritou ao abrir a porta do quarto. A mulher foi erguida no ar e atirada em direção ao guarda-roupa.

– Como se atreve? Ninguém me desafia. Sou Mila. – A mulher ficou furiosa.

– Não interessa. – A pessoa que entrou era Sr. Coulson.

Eu me arrastei até encostar as costas no criado-mudo. Respirei fundo, abri o frasco e de uma só vez bebi a poção.

A mulher ainda tentou avançar mais uma vez, mas acabou sendo erguida no ar e com um grito de dor desapareceu.

Aos poucos a luz da rua voltou e a da casa também.

– O que você estava aprontando? – Perguntou o Sr. Coulson ao pegar a vela caída no chão. Ele olhou para o círculo desenhado no chão e pegou o caderno com o feitiço. – Fez um feitiço de ocultação?

– Sim. Algo contra? – Perguntei ao tentar me levantar.

Ele se aproximou para me ajudar.

– Não encosta em mim. – Disse ao empurrá-lo. Corri para o outro lado do quarto.

– Sabe, isso já encheu! – Disse ele bravo. – Não vou machucá-la e não custa nada agradecer.

– Obrigada! E agora... Cai fora. – Sai correndo.

Estava na metade da escada, quando senti suas mãos no meu braço.

– Será que a gente pode conversar?

– Me larga! – Puxei meu braço e acabei caindo de bunda no chão.

– Toma! – Ele riu.

– Cala a boca! E vê se some! – Levantei e fui em direção à cozinha. Sendo seguida por ele, é claro.

– Você é surdo ou o quê? – Abri a geladeira e tirei de lá uma garrafa pequena de água.

– Vamos conversar? – Disse ele.

– Não! – Hoje o mar não estava para peixe. O Sr. Coulson  se aproximou de mim e me colocou em seu ombro. Ele parecia um daqueles homens das cavernas.

Comecei a dar socos em suas costas, mas ele não se importou. E com muito cuidado e calma, jogou-me no sofá.

– Agora vamos conversar. Ou quer que eu te amarre numa cadeira? – Eu apenas o observei com ódio. – Ótimo! – Ele se sentou na mesinha de centro, diante de mim. – Primeiro, quero deixar uma coisa bem clara: Não vou te machucar. Não tenho, não tive e nunca terei a intenção de te matar. Só vou matar quem tentar algo contra minha vida ou contra alguém que gosto. Entendeu? – Balancei a cabeça concordando. – Segundo, não fuja mais. Quero que confie em mim. Você deve estar cheia de dúvidas, e eu posso te ajudar. E terceiro e último... Que diabos você fez hoje á noite?

– O cara da loja de ervas... – Comecei a estalar os dedos.

– Kim?

– Isso! Ele me deu uma poção para que eu me lembrasse do meu passado.

– Fez o quê? – O Sr. Coulson deu um berro. – Onde está? – Ele começou a me apalpar à procura da poção.

– Tira essa mão boba. – Empurrei-o.

– Então me diga onde está?

– Já bebi.

– Quando?

– Na hora em que você entrou no quarto e brigou com aquela mulher. Afinal, o que era aquilo?

– Aquilo era o espírito de Mila. A primeira dona da chave, ou melhor, a dona legítima. Você é só uma hospedeira.

– Era um fantasma? – Perguntei surpresa. O Sr. Coulson concordou com a cabeça. – E para onde ela foi?

– Voltou para a chave. – O Sr. Coulson suspirou. – É por isso que as chaves são chamadas de relicários. Elas guardam os restos mortais de seus verdadeiros donos.

– Eu ando com uma urna funerária no pescoço? – Perguntei aos berros.

– É uma maneira de dizer. Tem muita coisa que não sabe e vou te deixar informada, mas aos poucos. Não quero que tenha um colapso. E quanto à poção...

– O que tem? – Ele parecia nervoso.

– Se começar a ter flashes, não se assuste. É normal. E principalmente, a qualquer mudança me avise. OK? – Ele tocou em minhas mãos.

Concordei com a cabeça.

Nós ficamos segurando a mão um do outro por vários minutos, até o telefone tocar.

– Eu já volto. – Soltei sua mão e me levantei. – Alô? – Era minha mãe querendo saber como eu estava. – Estou bem. A luz acabou aí também? – Perguntei surpresa. Mamãe disse que o jantar quase foi cancelado pela falta de luz. Pelas fofocas, parece que ocorreu um blecaute na cidade. – Quando vocês voltam? Não é nada.  –  Mamãe  ficou desconfiada. Ela até me perguntou se eu estava realmente sozinha em casa. – É claro que estou. – Não ia dizer que tinha companhia, ainda mais de quem se tratava – Estou bem. Divirtam-se, OK. Tchau!

– Era a minha mãe. – Disse ao colocar o telefone na base, já que o Sr. Coulson não parava de me observar. – Ela estava preocupada. Coisa de mãe. – Olhei em direção a porta da sala e vi que ela estava toda arrebentada. Como não vi aquilo antes? – O que você fez?

– Estava vindo para cá, quando as luzes da rua foram se apagando. Comecei a correr, afinal, senti “cheiro” de magia no ar, e pensei que pudesse estar com problemas. Quando cheguei à varanda, a ouvi gritando, não tive dúvidas, arrombei a porta.

– Como assim “cheiro” de magia? – Perguntei.

– É... Me dê a sua mão.

– O quê?

– Vem aqui. – Ele fez sinal para que eu me aproximasse. Caminhei lentamente até ele. – Agora... Fiquei diante de mim. Assim. – Ele me segurou pelos ombros e me colocou no lugar correto. – Me dê a sua mão.

– O que vai fazer? – Perguntei com desconfiança.

– Vai ver. – Ele sorriu.

Estiquei a mão direita e antes de segurar sua mão, ele a virou com a palma para cima. Ele a segurou com a esquerda.

– Feche os olhos.

Levantei a sobrancelha.

– Confie em mim. – Obedeci um pouco contrariada.

– Pense nos móveis que compõem a sala e não pense na sua mão.

Ele começou a passar o dedo na palma e eu soltei uma risada.

– Não ria.

– Faz cócegas.


Aos poucos senti como se meus pés estivessem descalços, na beira de uma praia, com a areia por baixo e sendo levada pela água do mar. Depois senti que meu corpo começou a ficar mais leve, junto com o ar. Também senti um cheiro agradável de flores e grama molhada.

– Abra os olhos. – Obedeci e o que vi me deixou maravilhada. Eu estava em pé num riacho e cercada de grama verde e com várias flores.

– Isso é real? – Perguntei.

– Não. Ainda está na sua casa. É só uma ilusão.

– A Srta. Weiss pode fazer algo do tipo? – Perguntei ao mexer os pés.

– Fadas, Elfos, Bruxos e Banshees podem criar mundos próprios. O que é muito perigoso, pois eles podem te jogar num mundo cheio de coisas... Não legais. Eu escolhi uma paisagem, mas poderia ter criado algo mais assustador.

– O que é bansh...?

– Banshee é uma prima distante das fadas. São mulheres muito lindas. Elas poderiam ser comparadas a sereias, pois podem enfeitiçar os homens e fazer com que eles as obedeçam.

– Elas podem enfeitiçar qualquer tipo de homem?

– Como assim?

– Tipo... Gays?

– Talvez. Eu sei que homens que realmente amam outra pessoa são imunes a elas. O que achou do mundo imaginário? – Ele indicou o lugar onde estávamos.

– É lindo. – Continuei admirando a paisagem. – Você pode materializar bichos?

– Que tipo? – O Sr. Coulson riu.

– Pássaros, leões...

– Quer um rato falante também? – Ele soltou uma gargalhada e eu o observei com raiva. – Desculpe. – Ele fechou os olhos e logo em seguida senti algo pousar no meu ombro. Era um cardeal com as penas tão vermelhas, que parecia brilhar.

– Que tal voltarmos à sala?

– Ah, não! Aqui é tão lindo. E o ar parece limpo e suave. – Parecia que ela irradiava algo mágico. Então entendi o que ele quis dizer com “senti o cheiro”.

– Estou cansado e um pouco doente. Não quero abusar.

– OK. – Em questão de segundos tudo voltou ao normal. – Sabe fazer outras coisas?

– Tipo? – Ele soltou minha mão.

– Materializar dinheiro?

Ele começou a rir.

– Infelizmente, só posso criar coisas relacionadas com a natureza. Mas posso fazer uma coisa.

– O quê? – Perguntei ansiosa.

– Consertar a porta. – Ele estalou os dedos três vezes e a porta ficou novinha em folha. – Bem, agora que conversamos e consertei a porta, vou embora. – Ele caminhou em direção a porta.

– Espera! – Corri em sua direção. – Pode responder algumas perguntas?

– Vamos ver. – Ele colocou as mãos nos bolsos e pensou. – Vou responder três perguntas.

– Só? – Agora decepcionei.

– Por hoje. – Ele sorriu.

– OK. – Esfreguei as mãos. – Por que as luzes apagaram? Minha mãe disse que houve um blecaute na cidade.

– Você convidou a escuridão para entrar e pediu a ela para que escondesse seus segredos. Não pode haver luz quando ela entra. Próxima?

– Por que faltou hoje na escola?

– Estou um pouco doente. – Ele suspirou.

– Mas parece bem de saúde. – Observei.

– Andei abusando da magia e fiquei um pouco enfraquecido, mas vou melhorar em breve. Última pergunta.

– Pode me emprestar a continuação do livro?

– Claro. Levo para você amanhã. Agora tenho que ir. – Ele se dirigiu até a porta, mas antes de sair se virou. Como eu estava atrás dele, nós ficamos bem próximos um do outro.

– Posso pedir uma coisa?

– Sim – Ele está perto demais. Perto demais!

– Quando nos encontrarmos fora da escola, não me chame de Sr. Coulson ou senhor. Use Ryan.

– OK. E o mesmo vale pra mim. Nada de Srta. Kilvert. Hayley.

– Combinado. – Ele abriu a porta e saiu.

Engraçado. Ele não veio de carro. Será que ele vai a pé daqui até a casa dele?

Antes de trancar a porta ele se virou e acenou. Retribui e logo em seguida tranquei a porta. Sentei-me na escada. Precisava recuperar o fôlego, na verdade, precisava recuperar o juízo. “O mesmo vale pra mim. Nada de Srta. Kilvert”. Quando é que eu fiquei besta?

Voltei para meu quarto e comecei a arrumar a bagunça. Tentei apagar o círculo, mas não consegui. Tive que escondê-lo com o tapete. Mamãe vai ficar feliz quando ver.

Dei uma última olhada para ter certeza absoluta de que nada estava fora do lugar. A única coisa que precisava ser guardada era aquela chave. Peguei-a de cima da cama. Pensei em escondê-la na cômoda, embaixo da cama. Até cogitei a ideia de escondê-la numa bota velha que havia no guarda-roupa, mas minha mãe podia dar uma de louca e arrumar minha bagunça e jogar a bota com a chave e tudo. O melhor lugar era guardá-la na sala. Minha mãe tinha uma coleção de potes de cerâmica, que ficava na mesinha do telefone. Escolhi um pote marrom com tampa preta e coloquei a chave. Foi incrível, assim que ela atingiu o fundo se tornou invisível. Como não podia tocar no pote, peguei uma colher na cozinha e remexi o pote, e nada saiu. Vazio. Era assim que ele parecia.

(Indra)


Já estava há mais de uma hora seguindo meu alvo. Apesar de ser um homem de vinte e poucos anos, ele ainda mantinha traços jovens. O que a mistura do sangue de elfos e bruxos é capaz de fazer? Sem dúvida ele era um ser raro. Não só pela beleza, mas pelos seus poderes.

Eu podia sentir que ele está mais do que pronto. O que não é nada bom. Meu senhor quer protegê-lo. Mas como fazer isso, se ele não aceita ajuda?

Estávamos próximos de uma mansão antiga, quando ele parou de andar e olhou para trás. Tentei me esconder, mas fui vista por ele, que com uma das mãos invocou a magia, me prendendo contra uma árvore.

– Quem é você? – Perguntou ele ao se aproximar.

– Não me reconhece, garoto? – Ele olhou para mim e após alguns segundos começou a me sufocar com a magia.

– O que faz aqui? – Ele olhou para os lados.

– Meu senhor não está aqui. E você não pode sufocar algo que já está morto. – Disse.

Devia ter ficado calada. Mal acabei de falar e comecei a sentir uma onda de calor atingir meus pés.

– Mas posso te queimar. – Ao olhar aqueles olhos azuis vi algo terrível. Talvez ele não tenha salvação. Talvez nem precise de Invocações. Talvez o mal já faça parte dele. E não há nada que possa salvá-lo, quer dizer, quase nada.

– Não vai ganhar nada me matando. Não sou a única que o procura. – Ele olhou para mim e me soltou.

– Levante-se e dê o fora daqui. – Ainda de joelhos comecei a rir. – Qual é a graça? – Ele me observou com raiva.

– Antes de ser o que sou, já fui igual a sua mãe. E acabei de ver o que esconde, o que deseja. Você se apaixonou por uma protetora e não é qualquer uma.

Ele se aproximou de mim e apertou meu pescoço com força.

– Fique longe dela.

– Por que a protege? Sabe o que ela vai fazer.

– Não me importo. Desde que ela nasceu, eu soube. Ela é a única coisa que pode me ajudar. Não é você ou seu senhor. É ela. – Ele continuou a apertar meu pescoço. – E se tentarem algo contra  ela,  eu  mato. Seja  quem  for.  Até  mesmo  meu próprio sangue. – Ele soltou meu pescoço e me empurrou.

Quando levantei a cabeça para olhar ao meu redor, ele já havia desaparecido.

(O Bruxo)


Antes de começar a contar o que estou vendo, vou me apresentar. Quero que as pessoas me conheçam, assim podem simpatizar comigo ou não.

Meu nome é Logan Henry Atkins. Tenho trinta e dois anos, vivo na Terra dos Livres (Humanos sem poderes mágicos) há quatro anos. Antes disso vivia nas Terras de Eliyah. Um lugar bacana, com um ar mais limpo do que dos humanos. Não tinha uma residência fixa. Não sou cigano, mas desde que o relicário, ou a chave que representa os bruxos me escolheu, quando tinha dez anos, não sei o que é ter um lar.

Durante seis anos eu e meus pais fugimos de meu tio Charles Rossdale. Ele ficou tão obcecado em destruir os relicários, que não se importou nem de perseguir a própria irmã e sobrinho.

Há dezesseis anos meus pais foram mortos. Consegui escapar, mas meus esconderijos ficaram escassos, então doze anos após a morte deles tive que atravessar o portal e me integrar à comunidade humana.

Primeiro, fui morar na cidade de Madrid, onde num belo dia acabei trombando com a figura mais maluca. Uma fada, que também acabara de chegar de Eliyah. Junto com ela estava o irmão. O pobre rapaz foi atingido por um feitiço no momento de atravessar o portal e acabou perdendo a fala, mas não o bom humor.

Depois de dois meses vivendo os três num quartinho em Madrid, Nikki e eu sentimos a presença do relicário que representa os dragões, na cidade de Los Angeles. Enfim... Partimos para lá, onde encontramos dois irmãos, Claudia e Lestat (Gêmeos, mas nem tanto).  Isso mesmo, Lestat e Claudia, a mãe dos dois é fã de Anne Rice e vivem na Terra dos Livres há vinte e um anos. O mais engraçado é que o relicário escolheu ambos os irmãos e ainda na barriga da mãe.

Vocês devem estar se perguntado, como é que ela conhecia as obras de Anne Rice num mundo mágico? Bem, a Sra. Kari Hilliard não conhecia. Ela abandonou o marido e atravessou o portal ainda grávida. Como não tinha amigos, encontrou abrigo na casa de um livre chamado August e foi ele quem a apresentou as obras de Anne Rice.

Ficamos em Los Angeles por um ano, quando novamente sentimos a presença de mais um relicário. Agora era o que representava a fênix. Ah! Esqueci-me de dizer uma coisa, Nikki é a protetora do relicário das fadas. Um pequeno desvio. Desculpe.

O relicário da fênix se encontrava perdido há dez anos, desde que a família que deveria guardá-lo foi assassinada. Adivinha por quem? Sim, meu titio querido.

Descobrimos que o poder do relicário estava concentrado numa cidade no estado de Montana. Pegamos nossas tralhas e partimos. Logo que chegamos à cidade foi difícil localizar o poder, a essência. Tudo indicava que o relicário queria se manter oculto. Sentíamos sua presença, mas não conseguíamos localizá-lo.

Nikki já tinha perdido as esperanças, quando num dia sentiu a presença do relicário num determinado ponto da cidade. O local era uma escola. Primeiro, pensamos em invadi-la e começar a cavar buracos, caso ele tivesse sido enterrado na propriedade, mas Arthur, irmão de Nikki, nos convenceu a colocar alguém disfarçado na escola. Fizemos uma pesquisa e descobrimos que a diretora procurava por um novo orientador. Falsificar documentos para fazer Nikki se passar por uma orientadora, não foi difícil. Difícil foi convencer funcionários, alunos e a diretora, que Nikki, mesmo com sua aparência peculiar era ideal para o cargo. Como uma boa conversa não iria adiantar, decidi  jogar  um  feitiço  na diretora e funcionários. Os alunos ficaram de fora por que... Bem, sou apenas um bruxo amador, ainda tenho que aprender as manhas. Afinal, aprendi tudo sozinho. Não existe escola de magia e bruxaria em Eliyah. Talvez eu crie quando voltar. Isso se meu tio não me matar primeiro.

Chega de ladainha e vamos ao que interessa. Neste exato momento estou sentado numa cadeira, na sala de jantar, tendo uma reunião com Nikki e o pessoal. O pessoal consiste... Os outros protetores, Arthur e o nosso novo guarda-costas, Ian Ward, que para não ouvir a briga, colocou os fones de ouvido e a música no último volume.

Nikki estava com a macaca, enquanto Claudia carregava fotos no Facebook e Les comia uma travessa de frango empanado.

– Logan, pare de ser fresco! – Nikki gritava como uma louca no meio de um show.

– Eu já disse... Esquece o tal indeterminado. – Bufei. – Temos outras prioridades. Como por exemplo, descobrir como é que uma livre acabou com o relicário da fênix.

– E não se esqueça dos ataques. – Disse Claudia do outro lado da mesa.

– Eu e Claudia podíamos investigar. – Disse Les comendo mais um frango. – É tedioso ficar nesta casa.

– Tedioso é não saber quem é aquele cidadão. – Nikki cruzou os braços.

– Por que ficou tão obcecada pelo cara? – Perguntou Claudia, agora fechando o notebook.

Nikki olhou para todos nós com um olhar perplexo. Como se quisesse dizer “Beberam?”.

– Vocês são tapados ou o quê?

– Não ofende. Sua controladora de... – Claudia se levantou num salto. – Nós fazemos tudo o que pede. Podia mostrar um pouco de consideração. Você não é a única que perdeu algo.

Nikki  tinha um olhar tão  feio,  que já esperava pelo momento em que ela e Claudia fossem rolar no chão. O que não era de todo ruim. As duas eram loiras e o melhor de tudo, gostosas.

– Eu sei o que todos perdemos, mas vocês ficam nesta casa fazendo de tudo, menos colocando a cabeça para funcionar. – Nikki suspirou. – Você – Ela apontou para Claudia. – Fica o dia todo no Facebook. Les só come e o Príncipe Caspian ali. – Ela apontou para mim. Não entendi a piada, mas tudo bem. – Quer perder tempo pesquisando sobre fênix e deeva. Sendo o que deveríamos fazer era matar aquele cara. Ele pode manipular os elementos. Todos nós sabemos o que diz a lenda.

– Mas o cara controla os quatro elementos? – Perguntou Les pela primeira vez sério.

– Eu só vi dois.

– Então, ele não é elfo. Eles foram extintos. Graças a nossa espécie, devo admitir. – Les suspirou.

– Mas a lenda não fala de um puro sangue.

– Nikki, a gente não pode matar o cara sem um motivo. E se ele for inocente e o único crime foi ter pais safados, que sabiam que não podiam misturar o sangue de espécies diferentes porque dá zica. – Disse Claudia séria.

– Quer saber, não dá. – Nikki se levantou num salto, mas antes de se retirar, gritou...

– DA PRÓXIMA VEZ VOU USAR O MEU CHICOTE. QUEM SABE ASSIM ALGUÉM ME ESCUTA!

Depois de ouvirmos a porta de seu quarto bater, voltamos aos nossos afazeres sem importância.

– Não entendi a piada. – Disse a Arthur, que estava do meu lado me ajudando com a pesquisa. Ele sorriu, pegou um pedaço de papel e escreveu.

Que piada?

– A do Príncipe Caspian. – Disse.

Arthur voltou a escrever.

Quem matou os seus pais?

– Meu tio. – Franzi a testa.

Quem te persegue e quer te matar?

– Meu tio. – Então a ficha caiu.

Entorpecida (A Chave Mestra #1)Onde histórias criam vida. Descubra agora