Capítulo 15 - Baile

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Gabriel ficou aos cuidados do Sr. Coulson, que o colocou sentado num sofá nos fundos do anfiteatro recém-reformado. Karen ficou ao seu lado, para garantir que ele não fizesse mais nenhuma bobagem, o que era difícil. E eu fui até os bastidores do Buffet, para ver se estava tudo em ordem.

Os alunos do último ano estavam animados, dançando na pista ao som de Rihanna, enquanto eram observados com um olhar carrancudo de Madame Stratford. Além do Sr. Coulson presente, os únicos professores presentes eram: Moody e a Srta.  Zelnick, nossa professora de História. A mulher era alta, magra e tinha a pele pálida. Nós costumávamos chamá-la de Rainha Jadis. Já que ela era a cara da feiticeira branca de As Crônicas de Nárnia. Ao vê-la ao lado de Moody, comecei a rir. Aquilo era perfeito. Jadis e Moody, o encontro perfeito entre dois personagens de histórias de fantasia.

– Posso saber qual foi a piada? – Dei um pulo ao ver a Srta. Weiss ao meu lado.

– O que faz aqui?

– Eu trabalho aqui, esqueceu? – Ela usava um vestido preto de alças finas. A saia tinha um corte lateral, que vinha até quase o quadril. Quem ela pensa que é? Angelina Jolie?

– Descobriram alguma coisa sobre os ataques ou sobre mim?

– Descobrimos algumas coisas. – Ela disse com um sorriso cínico. – Mas nada que te interesse.

– Tem um louco matando garotas da minha idade e não devo me preocupar?

– Você é virgem? – A Srta. Weiss me observou séria.

– Não.

– Então, ele não virá até você. – Ela parecia compenetrada em algo. Concentrei-me na direção que ela olhava e percebi que observava o Sr. Coulson, que conversava com alguns alunos.

– Por que está olhando para ele?

– Não estou apaixonada, se é isso que está pensando. – Ela olhou para mim. – Estou intrigada, só isso. Algo não cheira bem nele. Até mais, Srta. Kilvert.  – Ela tocou de leve nos meus ombros e se retirou.

Continuei levando bandejas para a mesa instalada no anfiteatro. Estava acomodando uma bandeja com sanduíches, quando ouvi uma voz as minhas costas.

– Srta. Kilvert. – Era a voz de Madame Stratford. “O que eu fiz agora?”, pensei.

Virei-me lentamente.

– Sim?

– Vejo que está trabalhando direitinho. – Ela sorriu. Não curtia aquela mulher, até mesmo seu sorriso me causava raiva. – A Srta. Weiss disse que você colaborou muito nas sessões com ela. E me recomendou a suspendê-la do castigo.

– Sério? – Perguntei incrédula.

– Sim. Devo admitir que você não se meteu mais em brigas, e isso é um progresso. Vejo que se vestiu de forma adequada para a ocasião. Enfim... Estou orgulhosa.

– Ainda preciso trabalhar na festa? – Perguntei antes que ela se afastasse.

– Não. – Ela deu as costas e foi em direção do Sr. Perry.

Terminei de arrumar a bandeja de sanduíches e fui ver como Gabriel estava. Ao que tudo indica, bem melhor. Ele e Karen estavam no maior amasso. Como não queria ficar lá de vela, voltei até a mesa com as comidas e procurei por algo.


Os sanduíches não pareciam confiáveis, mas havia uns espetos de frango empanado e pareciam bons. Peguei um prato e coloquei dois espetos. Em seguida peguei outro prato e me servi de uma bela fatia de bolo de chocolate.

Procurei por algum lugar para sentar, mas parece que todas as cadeiras estavam ocupadas. Sem outra alternativa, peguei meus pratos e saí do anfiteatro. Andei pelos corredores vazios da escola à procura de uma sala aberta para sentar e aproveitar meu lanche e tirar esses sapatos, que estavam me matando.

Sério! Sapatos de salto não foram feitos para o conforto feminino. Eles foram criados por algum homem sádico, que queria se vingar da esposa. Só pode! A cada passo que dava meus dedos gritavam por socorro.

Depois de tentar seis salas, encontrei uma com a porta destrancada. Ela estava escura, mas entrava uma boa claridade pela janela. As luzes do pátio e a lua cheia a iluminavam bem. Entrei. Coloquei meus pratos na primeira carteira que encontrei. Depois fechei a porta, pendurei minha bolsa na maçaneta e tirei os sapatos.

– A felicidade existe. – Disse ao mexer os dedos dos pés.

De repente ouvi uma gargalhada vinda do fundo da sala. O Sr. Coulson estava sentado num canto.

– O que faz aqui? – Perguntei surpresa.

– Me escondendo daquela fada maluca. E você?

– Estou querendo descansar um pouco e comer. – Levantei os pratos.

– Sente-se. – O Sr. Coulson empurrou uma cadeira que havia ao seu lado.

Peguei meus pratos e caminhei até lá.

– Quando saem as notas? – Perguntei ao me sentar.

– Semana que vem. – Ele pegou seu paletó que estava jogado na cadeira diante dele, mexeu nos bolsos e tirou de lá um isqueiro prata e um maço de cigarros.

– Você fuma? – Perguntei surpresa.

– Sim. Algo contra? – Perguntou ele ao acender um cigarro.

– Não. O pulmão é seu. Você o mata como achar melhor. – Ele deu um sorriso sem graça.

– Quando chegar aos trinta, eu paro. – Disse ele ao dar uma tragada. E eu fiz uma careta. – Ao invés de me criticar. Por que não come?

Peguei um dos espetos, mas antes de mordê-los os ofereci.

– Quer?

– Não, obrigado. – Mais fumaça. – Como está o Sr. Jones?

– Melhor. Ele até já está dando uns beijos na Karen.

– Bom pra ele. – O Sr. Coulson riu.

– Só espero que dê certo – Dei uma mordida no espeto.

– Por que não ficou na festa?

– Pra quê? – Disse ao engolir o frango.

– Dançar, conversar com os rapazes.

– E por que você não está na festa? – Retruquei a pergunta.

– Não queria mais ter os olhos da Srta. Weiss em cima de mim.

– Você queria era ter ela em cima de você. – Comecei a rir.

– Olha... Ela não é de se jogar fora.

Olhei feio pra ele.

– Tá brincando, não é?

– Não. Ela realmente não é de se jogar fora.

– Você gosta de... Loiras?

– Pode ser. – Ele jogou fora a bituca do cigarro. – Na verdade não tenho um tipo definido. Minha noiva era loira, mas isso não significa, que só gosto desse tipo.

– Já entendi. – Comecei a rir. – Você é do tipo que pega tudo que se move.

–  Não. –  Ele riu.  –  Dizendo assim, parece que eu pego literalmente, tudo que se move. Incluindo mulheres, homens, bichos e sei lá mais o que tem por aí.

– Eu não disse isso! Me expressei mal. O que queria dizer é que você pega qualquer tipo de mulher.

– Talvez. Nunca parei para pensar. Mas voltando a fada maluca. Ela é bonita, mas é meio chave de cadeia. Não no sentido vadia. Ela é perigosa. Por isso me escondi, e também não quero a Sra. Stratford anuncie minha demissão comigo no salão.

Quase engasguei.

– Vai embora? Por quê?

– Porque sim. – Ele deu um sorriso sem graça.

– Isso não é resposta. – Disse brava.

Ele suspirou.

– Vamos dizer que minha permanência nesta cidade se tornou insuportável.

– É por causa da Srta. Weiss?

– Sim e não. Preciso ir embora. Vai ser melhor assim.

– Mas, naquele dia na minha casa, você disse que ia me ajudar, e agora vai embora. – Senti um aperto no peito.

– Hayley – Ele se calou e ficou me observando. – Quer dançar?

– Eu?

– Não. A porta. É claro que é você.

– Eu não sei dançar. – Ele levantou a sobrancelha. – Não é frescura, não sei mesmo.

– Como assim? – Ele riu.

– Tentei uma vez, mas parecia uma doida. Era como ver um macaco epilético perneta dançando.

Ele caiu na gargalhada.

– Então seremos dois. Vem. – Ele se levantou da cadeira e me puxou.

Nós iríamos dançar uma música agitada, mas até eu e ele nos situarmos, o DJ trocou por uma mais lenta.

Só  devo  dizer que foi legal e engraçado.  No começo eu tropeçava nos meus próprios pés. Isso quando não pisava nos pés dele, mas lá para a metade da música, nós paramos de nos “agredir”.

– Prefiro ensinar biologia. – Disse ele rindo. – Dança, não é meu forte.

– Concordo. – Pisei de leve seus pés. – Desculpa.

– Pare de olhar para baixo. – Levantei o rosto, mas preferia ficar com a cabeça baixa.

Ficar olhando para ele não era nada fácil. Tudo bem que eu disse que o nosso relacionamento era platônico, mas isso não quer dizer que nunca vai mudar de status. Como não queria mais olhar para seu rosto, voltei a olhar para baixo.

Ele soltou minha mão e tocou de leve meu rosto. Eu o observei novamente, só para vê-lo se aproximar e tocar de leve meus lábios com os dele. Poderia sair correndo dali, mas não. Fiquei e me deixei envolver. Parece que pedidos de aniversário se realizam.

– Não posso fazer isso. Desculpe. – Ele me soltou e saiu  porta afora.

– Eu é que devia ter feito isso. – Disse para as paredes.

Demorei alguns segundos para acordar. Mas quando acordei, calcei meus sapatos, coloquei minha bolsa no ombro e corri atrás dele.

Encontrei o corredor vazio, mas não diminui o passo. Ao virar à direita, dei de cara com uma cena que demoraria a esquecer. Dois homens imobilizavam o Sr. Coulson no chão, enquanto outro segurava uma seringa nas mãos.

– Vamos ver se você consegue lutar contra isso. – O homem ia agachar e injetar sei lá o que nele. Então fiz a única coisa que podia... Gritei.

Os dois homens que seguravam o Sr. Coulson no chão levantaram a cabeça e olharam para mim. Já o homem que segurava a seringa caminhou em minha direção.

Por alguns segundos fiquei plantada no chão feito um poste,  não mexia os pés,  mesmo  sabendo que o perigo se aproximava. Só despertei quando o Sr. Coulson gritou.

– Corre!

Obedeci. O problema foi correr num chão escorregadio e de salto. A cada segundo olhava para trás, só para ver que o homem estava cada vez mais próximo. Virei à esquerda e continuei correndo. Ao dar a curva escorreguei e o homem acabou me alcançando. Ele tentou me imobilizar, mas dei-lhe um soco no nariz. Numa pessoa normal (Coisa que aquele homem não era) um soco no nariz faria seus olhos lacrimejarem e assim deixando-o mais lento. Só que naquele cara o soco o deixou mais irado. Tanto que ele segurou minha nuca com força e me jogou em direção aos armários. Fui arremessada com tanta força, que um dos armários caiu no chão.

Minha cabeça doía. Ao tocar minha testa, senti que a mesma sangrava. Arrastei-me pelo chão. Precisava ficar longe dele.

O homem passou por cima do armário caído. Deu mais alguns passos e sem tirar os olhos de mim, tirou de dentro de seu casaco uma adaga com a lâmina curva. Tentei me levantar, mas sem sucesso. Ele estava se aproximando mais e mais. Então algo aconteceu, não ajudou muito, mas me deu tempo para levantar.

– O que está acontecendo aqui? – Madame Stratford apareceu. O homem de negro se virou e a encarou. – Quem é você? O que faz na minha escola?

Eu poderia gritar para Madame Stratford dar o fora e salvar sua vida, mas estava muito mais ocupada tentando me manter em pé. E mesmo que a alertasse, ela não me ouviria e teria aquele fim.

O homem se aproximou dela, segurou-a pelo pescoço e com a outra mão livre a golpeou com a adaga três vezes. Quando a soltou, ela já caiu sem vida no chão.

Quando ele se virou em minha direção, já tinha me levantado e me escondido na sala mais próxima. Olhei em volta à procura de qualquer coisa que pudesse servir como arma. Remexi de cabeça para baixo um arquivo, que havia no fundo da sala. Depois olhei dentro de um armário. Já estava cogitando sair pela janela, quando vi um machado preso na parede, atrás de um vidro, com aqueles avisos “Quebre em caso de emergência”.

– Que se dane! É uma emergência! – Dei alguns socos no vidro e nada. – Quebra, maldição! – E como mágica o vidro se quebrou. Poderia ficar um tempo meditando sobre o que aconteceu, mas meu pescoço estava correndo risco.

Com o machado em mãos saí do meu esconderijo. O homem poderia estar em qualquer lugar. Quando virei no corredor, alguém me segurou por trás, cobriu minha boca e me puxou para dentro de uma sala.

– Quieta. – Disse o Sr. Coulson no meu ouvido.

Fiquei tão feliz em vê-lo, que não me importei, o abracei com força.

– Vem. – Ele pegou na minha mão e me levou para o fundo da sala.

Ele afastou algumas carteiras e abriu a janela só até menos da metade.

– Droga! Está emperrada!

– Deixe te ajudar. – Subi numa carteira e tentei abrir mais a janela, que cedeu um pouco, mas não o suficiente para os dois.

– Vai você. – Disse o Sr. Coulson.

– Não! – Segurei sua mão.

– Eu me viro. Agora vá. – Olhei para ele por alguns segundos, até tirar meus sapatos e passar pela janela.

Meu vestido ficou preso no vão da janela. Puxei-o com tudo e acabei caindo do outro lado.

– Tudo bem? – Mal podia vê-lo do outro lado.

– Sim. – Disse ao arrumar o vestido.

– Hayley? – Olhei para a janela. – Meu carro está no estacionamento. Pegue-o e vá para casa. – Ele jogou a chave.

– E quanto a você? – Perguntei.

– Como já disse, eu me viro. Vá para casa, nos encontramos mais tarde. Anda! Rápido!

Corri pelo gramado da escola até chegar a cerca de arame. Por sorte havia um buraco e a usei para chegar até o estacionamento.

O carro do Sr. Coulson estava estacionado nos fundos. Destranquei a porta. Infelizmente, não pude entrar. Alguém apareceu e me deu uma gravata por trás.

– Aonde pensa que vai, Protetora? – Olhei para baixo e vi uma mão próxima da minha cintura, segurando uma adaga toda ensanguentada.

– Seu amigo fugiu, mas ainda temos uma surpresa para você. – Uma van preta entrou com tudo no estacionamento. – Agora você vai ser uma boa menina e me acompanhar.

– Ou? – Perguntei.

– Sua família morre.

Ele me arrastou até a van. Deu algumas batidas na porta lateral e logo em seguida a abriu.

– Entra. – Fui atirada para dentro.

Um pouco antes de a porta ser fechada, pude ver o Sr. Coulson correndo em direção a van.

Entorpecida (A Chave Mestra #1)Onde histórias criam vida. Descubra agora