Jungkook estava nos braços de Taehyung, respirando lentamente. Dessa vez, não estavam na linda caverna atrás da cachoeira, e sim, deitados na terra quente em meio a milhares de videiras.
"Pertencem ao meu pai" dissera o semideus. Disse calmamente, como se aquela fosse só uma vinha pertencente à sua família. Mas todas as vinhas pertencem ao pai de Tae.
O sol estava alto. Era quase meio dia. Insetos zumbiam aqui e ali e o vento quente balançava as plantas. Eles faziam muito isso: só existir no mesmo espaço. No início de sua relação, achavam que deveriam manter conversa o tempo todo. Não faltava assunto, é verdade, mas logo descobriram que não havia nada a provar. Sua existência conjunta já era uma benção por si só.
Taehyung suspirou.
— Ei. Você está acordado?
— Sim — sussurrou Jungkook de volta. — Só estou pensando.
— Em que?
— Em você.
O semideus não fez nenhum som, mas era fácil sentir seu sorriso bobo atrás da sua nuca.
— Em que de mim?
— Que quero te apresentar aos meus amigos.
A sensação do sorriso dele permanecia, mas mais fraca.
— Eles sabem sobre mim? Que eu sou...
— Um garoto? Sim. Um semideus? Não. E acho que prefiro manter assim.
— Bom. Eu também quero conhecer seus amigos. Eles parecem legais.
— Diferente dos meus pais.
Taehyung se desvencilhou do enlace deles e se levantou até estar sentado de pernas cruzadas. Um pedaço de grama estava colado em sua bochecha. Sorrindo reconfortante, com sua silhueta marcada contra o céu azul da tarde virgem, seria impossível negar que ele era em parte deus.
— Meu pai é deus de todas as coisas estranhas e incomuns. De tudo e todos que não se encaixam nos moldes da sociedade. Quer dizer que ele é seu patrono também.
Jungkook entendeu exatamente o que ele estava dizendo, e sorriu também, se levantando até estar sentado. Um passarinho cantava em alguma das árvores perto dali. Ainda sorrindo, ele se deixou inclinar até que seu fôlego se misturasse com as expirações do outro, o sabor das uvas que antes comeram ainda presente no ar.
— Eu te amo.
— Eu também te amo.
Seus lábios se comprimiram um contra o outro, permanecendo assim por um tempo, até começarem a se mexer. Não havia nada esfomeado e selvagem naquele beijo. Tudo era lento, pacífico e morno, como o ar quente e parado daquela tarde de verão. E tudo era lindo.
—
Apolo disse a Yoongi que dormisse uma noite inteira antes do que estava por vir. O mortal, chamado Jin, concordou com um sorriso. "Uma boa noite de sono" disse ele "É remédio até para os deuses".
Yoongi não dormia.
Ele estava deitado na areia, as ondas quebrando a poucos metros dele, seu ritmo constante como uma canção de ninar. Lembrava-o de sua mãe e sua voz suave e doce como a primavera. Ela lhe fazia carinho nos cabelos em noites como essa e cantava até que ele dormisse. Ele nunca dormia de verdade, entretanto. Só fingia o fazer para que ela pudesse ir embora sem se sentir culpada.
Era também deus da insônia, afinal. E combinava muito com o papel.
A caixa estava ao seu lado, deitada embaixo das estrelas como ele queria que Jimin estivesse. Afrodite explicara tudo com a voz cansada, e ele ainda estava tendo dificuldade em acreditar. A única coisa que sabia é que suas mãos estavam implorando para se enroscarem no pescoço de Eco.
— Não consegue dormir?
Uma voz grave e reconfortante soou perto de sua cabeça. Ele abriu os olhos e viu seu pai, em pé atrás de seu corpo deitado, seu corpo vestido de preto lembrando um arranha-céu daquele ângulo.
— Eu nunca consigo.
Hades suspirou e se sentou bem ali, atrás de sua cabeça.
— Eu sei.
Então, sua mão foi até a caixa. Mesmo que fosse seu pai, o coração de Yoongi parou. O deus dos mortos então a abriu e pegou a estalactite.
— Nêmesis é estrume — ele disse. Yoongi teria rido se seu coração não batesse tão forte. Ele nem ousara tocar ele mesmo no gelo. Então, o deus assoprou e a estalactite pareceu se tornar mais dura. — Vou lhe dar mais dois dias de presente. É o máximo que eu consigo. E claro, passagem pra todos os cantos do submundo.
— Você não pode só fazer os Três Juízes aceitarem Jimin como bom e tudo pronto?
— Por caminhos sem destino e rios sem curso, carrega a brisa pútrida a juventude, em jornada mais longa do que ela espera. Vem nela a arte, a dor, a morte e a verdade, na forma de dois deuses. Quando Perséfone volta para casa, um encontra a paz em braços quentes e ao outro só resta o gelado de um cadáver.
Yoongi levantou de uma vez só e encarou seu pai nos olhos. Suas costelas pareciam estar rachando com as palpitações do seu coração.
— As Parcas me contaram. É uma profecia. — disse Hades.
— Eu... eu só tenho até o início do outono?
— Eu não posso interpretá-la para você. Só posso dizer que te amo. E te desejar boa sorte.
Então, ele se desfez no ar e deixou para trás nada além do leve perfume de terra úmida. Yoongi chorou embaixo das estrelas até que, finalmente, depois de décadas, adormeceu.
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NARCISO | MYG + PJM
Fanfic"meus lábios suplicam pela morte nos teus" Como uma garrafa jogada ao mar, Yoongi é uma aparição repentina e mística no Olimpo. Filho de Hades e sua mulher, Perséfone, o deus dos artistas, da inspiração e da melancolia carrega uma aura doce e pesaro...