DA VINCI: antes de Mona Lisa

347 16 0
                                    

****nota da autora:
- Decidi colocar a oneshot antes do prólogo, já que coloquei os demais contos durante a história. Ela veio muito antes de eu começar a escrever Mona Lisa.
- O personagem no início pode parecer homofóbico (até mesmo em alguns capítulos de Mona Lisa), mas é ele e não eu. Eu sou contra e não acho que a morte da namorada e seu ódio e ciúmes do amigo dela seja uma justificativa para preconceito, mas, apesar de estar corrigindo a história, não irei mudá-lo. O personagem vai crescendo conforme a história e acredito que seja essencial mostrar que ele não é perfeito.
- Se é seu primeiro contato com o livro: a história não é narrada por ele.
****

JUSTIN

Eu já tentei fazer uma pintura com o número PHI. Saiu um desastre total. Já tentei pintar uma pessoa que de um lado parece um homem e do outro uma mulher, outro desastre. Já tentei pintar uma mensagem subliminar e o resultado foi quase bom, se eu não tivesse deixado um pote de tinta vermelha escorrer pela tela.

Ultimamente tenho muito tempo livre. A escola ocupa uma pequena parte, e eu já não tenho mais vontade de ir para a faculdade, então não estou me preocupando com isso e nem trabalho, ou seja, muito mais tempo livre.

Meus amigos de vez em quando passam por aqui. Tentam me distrair, fazer com que eu saia de casa e faça alguma coisa. Eles pensam que eu fico deitado na cama, ouvindo músicas depressivas e chorando o dia inteiro. Na verdade, foi assim no primeiro dia. Mas eu parei, decidi me dedicar a uma nova técnica de pintura.

Isabel gostava de me ver pintar. Fiz vários quadros dela, que hoje estão cobertos por uma lona preta no canto do meu pequeno ateliê improvisado.

Aqui, onde estou, era o meu quarto de brinquedo. Minha mãe queria que eu fosse uma criança que pudesse ter tudo que quisesse, pois ela tinha orgulho de dizer que conseguiu me criar sem a ajuda do meu pai. Aqui tinha tudo o que eu mais gostava quando era pequeno, mas não resta quase nada agora. A lousa mágica é um dos poucos que ainda não me livre, não apaguei meu último desenho nela, é um milagre que esteja bem nítido, lembro-me de ter desenhado quando eu tinha dez anos. É um dinossauro gigante destruindo a cidade e tem um super-herói soltando raio laser dos olhos, quando desenhei, imaginei que ele era o meu pai, só que uma semana depois pensei melhor e acrescentei traços femininos colocando a palavra "mãe" na roupa. Sabia que minha mãe não ia ver o desenho e por isso eu não tinha motivos para esconder que no começo o herói era meu pai, só que eu me senti melhor vendo-o como minha mãe. Mesmo que ninguém nunca entrou aqui, com exceção de Isabel.

Ah, minha linda Isabel. Até a pronuncia de seu nome é uma doce música em meus lábios. Não sei quantas vezes sentei na sacada do meu quarto e cantei para ela versos de suas músicas preferidas, as vezes quando podia, trocava algo na música pelo seu nome. Ela tinha o sorriso mais lindo de todos, mas assim como a pintura de Da Vinci, era o mais misterioso para mim. Eu gostava do modo como seus cabelos loiros caiam perfeitamente com seu rosto arredondado e sua pele bronzeada. Sua voz era inebriante e toda vez que ela sussurrava meu nome em meus ouvidos eu podia jurar que tinha ido e voltado do céu.

Tudo estava tão bom. Por que as coisas não podiam continuar daquele jeito?

Hoje, tudo que tenho são memórias. Boa parte delas eu recupero quando estou nas pedras. Perto do mar. O barulho das ondas são uma lembrança de Isabel. Ela sempre dizia que as ondas era um fundo musical perfeito para qualquer situação, até mesmo para uma briga na praia. Ri de seu comentário no começo, dificilmente entendia suas metáforas, mas agora eu estou começando a entender...

MONA LISA {JB} ✓Onde histórias criam vida. Descubra agora