Primeiro Grão de Areia

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Foi apenas um sonho

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Foi apenas um sonho.

Só um sonho.

Um simples sonho.

Sob as nuvens fictícias de um céu avulso, há uma cidade perdida, inalcançável e tímida, a qual se esconde dos olhares esbugalhados dos tantos mapas mundanos. E é nesse mesmo lugar, onde o Sol tem a estranha mania de, à tarde, tomar três xícaras de café sem açúcar, que também se encontram inúmeros prédios brincando de quem beijará a Lua primeiro - fato que, supostamente, exige que eles ultrapassem a pele azulada e cheia de pintas cintilantes situada sobre seus crânios de concreto. Entretanto, eu confesso que existe algo ainda mais fascinante que as construções desnecessárias do município de Cedro-Rosa: as tais figuras minúsculas e frágeis que, ditadas por ponteiros viciados em atletismo olímpico, circulam de um lado ao outro, seja para comprar, destruir ou dominar coisas. Elas, sem perceberem, à noite se refugiam entre paredes frias e, pelas janelas - algumas quebradas, enferrujadas, empoeiradas ou entreabertas -, observam seus próprios corações, antigamente pulsantes, organizarem um strip-tease entre os postes de luz.

Mas, nós, que estamos do lado de fora (embora eu cá e vocês em um outro lá) e com os estômagos ronronando após sentirmos o cheiro de confusão pré-assada se espalhar pelo ar, permanecemos quase tão perdidos quanto essas criaturas de papel que desafogam seus carros das garagens e dirigem para local algum.

Porém, como eu disse, quase. Um quase tão perturbador que nos faz fingir poder ouvir as mesmas canções que elas ouvem em suas mentes, apesar de, no fundo, sabermos que nos encontramos em ritmos cada vez mais opostos.

Assumo, no entanto, que vocês têm conhecimento de algumas coisas, por mais que tudo lhes assemelhe a um jogo em que precisam combinar peças de quebra-cabeças distintos. A gente tenta, ou melhor, vocês tentam juntar as informações: corações que antes pulsavam com lugares não registrados em atlas amassados; Sol tomando café com strip-tease; nada com nada, formando-se, assim, pares que não se encaixam somente para encontrar uma lógica.

Aliás, quando vocês vêm para cá, ainda não aprenderam a enxergar que, possivelmente, a lógica nem sempre é bem-vinda. Nem sempre devemos recebê-la com flores e casa limpa. Às vezes, a gente precisa falar: repare na sujeira, sim. Olhe todo esse caos que há dentro de mim. Olhe todas essas dúvidas. Agora, pode ir embora; pode sair. Você não é quem estou esperando, desculpa.

Sim, desculpe-me.

Desculpe-nos por estarmos exaustos de colecionar respostas racionais para coisas que não deveriam ser perguntadas pela Razão.

Se eu desse ouvidos demais à minha amiga Razão, certamente não estaria aqui, observando, através do horizonte e de nuvens macias, o contorno do arranha-céu que abriga as duas moças que, como vocês, são as heroínas e as vilãs do enredo a que compõem.

Agora que me recordei delas, sinto que estou, esse tempo todo, simplesmente enrolando-me com palavras e fazendo vocês perderem tempo. Estou, honestamente, embaralhando os nós um no outro, a fim de uma saída boba para fugir do amanhecer que se aproxima.

A verdade é que, embora eu ainda não posso contar a vocês o motivo, não quero que o dia desperte. Não quero porque eu sei que isso iniciará, pela vigésima terceira vez, o ciclo de turbulências sentimentais entre as jovens que, de alguma maneira, se tornaram partes marcantes da minha existência infinita. E, toda vez que o processo recomeça, vem à tona a possibilidade de, finalmente, ser uma despedida.

Não, não me perguntem a que processo e ciclo refiro-me. Não perguntem, pois a probabilidade de a resposta ser considerada mentira é maior agora do que será depois. A única coisa que importa, nesse instante, é elas.

Vocês não a conhecem - pelo menos, eu acredito que não -, mas quando eu as vi juntas, pela primeira vez, logo percebi que, mesmo havendo muitas feridas a serem tratadas, nem a própria eternidade seria forte o suficiente para separá-las. No entanto, depois de tantos reinícios, já não tenho mais certeza. Não tenho mais certeza se elas e vocês são capazes de, instintivamente, sentirem a vida.

Vida. Eu não deveria estar usando esse termo, tampouco adentrando nesse tema, afinal, não acredito que vocês se encontrem prontos para compreender o que os espera. De qualquer maneira, uma hora ou outra, vocês irão estar lá, encarando, pela janela, seus corações dançando sobre o asfalto e escutando canções que ninguém mais ouvirá.

Enquanto isso, resta-me apenas contar que, nesse exato momento, o dia está se expandindo feito um bolo que cresce descontroladamente no forno velho, ocupando tanto espaço que, se depender de mim, irá rachar-me e desistir de continuar em frente. Mas, se depender das nossas queridas protagonistas, trata-se somente de mais uma data comum, de uma vida comum em um planeta comum.

Talvez, seja mesmo só isso.

Ou talvez não.

Independente de qual for a resposta, nada mudará. O céu já se mostra mais claro do que estava minutos atrás, combinando com a tinta que desbota no cômodo das meninas e com a cor do edredom que as une em um ninho artificial.

Serenas e com a mente por enquanto sem nenhum pesar, elas se apertam em um abraço que aparenta mantê-las longe de qualquer perigo. Contudo, o que fazer quando você mesma é o seu maior desafio? Elas, obviamente, ainda não notaram isso. Então, por mais cruel que seja, apago aos poucos cada migalha daquela sensação intensa que as espera, transformando-a em um mero sonho, o qual, entre os ventos alísios e o Equador, retrata exatamente a jornada que elas podem enfrentar.

O que era sentimentos e emoções, lentamente, desenha-se em pensamentos imaginários que preenchem o subconsciente. A mente humana, infelizmente, não é livre o suficiente para entender as pistas do Universo, por isso, ela provavelmente não perceberá tão cedo a minha presença, mas um dia, de repente como Hiroshima, irá notar-me.

E, um dia, vocês também irão me ver e compreender a dívida que possuem com os mundos.

Até lá, a viagem ao paralelo central da Terra e a certeza de que um amor é tão impactante quanto à natureza não passam de uma narrativa durante um sono tranquilo na cidade de Cedro-Rosa.

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NOTAS

Olá, meus amores!

Se você já leu esse livro antes de hoje, junho de 2018, provavelmente deve estar sem entender esse capítulo. Ok, eu também estava perdida. Porém, depois de passar um bom tempo decidindo se tirava ou não o livro da plataforma, decidi que vou fazer as alterações que almejo, mesmo que isso signifique acrescentar capítulos no início da obra (como é o caso desse).

Não, não precisam querer me matar porque vou estar sempre avisando se a atualização tiver sido feita entre capítulos publicados, porque a única coisa fundamental é você saber em que contexto se encaixa a atualização. E se ficarem com dúvidas, bora mandar mensagem no privado e bater um papo! Hahah

Obrigada por quem está aqui, quem já esteve e quem um dia pensou em estar mas desistiu. É isso: beijo na alma e no coração 💗

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