Capítulo Dois - O vigia de pedra

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O ensaio deu bons resultados quando comentou com o pai na manhã do dia 29.

— Toma cuidado — avisou Breno, sorrindo. — Eles podem ler a sua mente e fazer ela virar purê antes de te enviarem pra Tyibá.

Estava rindo, mas quando Jânio desviou o olhar de seu pão com manteiga e café para o filho mais velho o sorriso desapareceu. Foi uma bela sensação para Hugo, embora não quisesse demonstrar.

— Legilimência só é permitida quando o país se encontrar em guerra — respondeu ele, tomando seu café com leite. — Mas não é pra pensar que isso suavize o quão ruim isso é, ouviu?

O nervosismo pareceu queimar Hugo e fazer a marca em seu rosto arder um pouco. Seu rosto ficava ligeiramente mais feio assim, achava ele, embora nenhum remédio mágico ou feitiço conseguisse esconder muito bem.

A marca estava fina e cicatrizada no momento, mas era só por causa da Azaração de Ofuscamento que o pai lhe lançara. Na verdade continuava vermelha e aberta, e Hugo sentia que não tinha menor intenção de curar-se sozinha.

Não tinha muito o que fazer, embora planejassem leva-lo ao Hospital Bruxesco de Doenças Mágicas nas férias de fim de ano ou páscoa. Não era uma boa decisão sair do Brasil enquanto não se visse livre da intimação.

Como já havia dito para a mãe, ferimentos feitos com magia eram muito mais complicados de curar.

Finalmente, após passar horas de pura ansiedade, o pai o chamou a porta de casa.

Estava com um terno fino e arrumado, com uma gravata branca que escondia um broche em forma de losango embaixo do paletó, levando na mão direita a maleta esfarrapada.

Hugo colocou os antigos sapatos sociais de Breno, uma calça social que jazia em seu armário e uma camiseta azul de botões, uma vez que não tinha um terno completo. A mãe lhe passara gel no cabelo e o escovou para trás, o que pareceu deixa-lo bem estranho.

Saíram na tarde fria e vazia, em completo silêncio.

A Feirinha da Madrugada não era tão longe do apartamento em que moravam, então só tiveram de cruzar algumas esquinas e atravessar algumas ruas até o galpão onde a feira acontecia.

Apesar do nome, estava a todo vapor quando cruzaram a entrada com rapidez e se espremeram por uma multidão ansiosa e cheia de sacolas.

Hugo percebeu que o pai agitava as mãos em alguns momentos, fazendo com que as sacolas se afastassem com uma lufada de vento e os deixassem passar.

O pai olhava atento para as lojas, até que pegou um pequeno objeto dourado com uma flecha vermelha que simplesmente flutuava em seu centro.

A Bússola Paredro apontou para a direita de onde estavam, andando mais rápido e parando em frente a uma loja que vendia camisas estampadas, bijuterias e pacotes com oito meias cada.

República das Bijuterias, dizia uma placa logo acima da entrada.

Roupas coloridas e algumas bem bregas estavam dobradas em estantes, espremidas na única mesa no recinto e em manequins na fachada. O único nu era um que estava com os braços abertos no meio da loja.

Era pintada de branco e não tinha teto, sendo iluminada por uma lâmpada no teto do galpão.

Uma máquina velha para passar cartão de crédito e uma gaveta com fechadura eram guardados pelas pernas de uma mulher entediada sentada ao lado da mesa.

Vestia-se com uma camisa larga e calça jeans apertada, tendo um coque mal amarrado segurando os cabelos castanhos.

— Com licença — chamou Jânio, chamando a atenção da moça. — Estamos aqui para a Chave das 16:10.

Saga Castelobruxo - Pratas e Opalas Vol. IIOnde histórias criam vida. Descubra agora