Somor abriu um portal assim que saiu da Arena para a sala de estar da arvore lar de Aryen e passou por ele com os três atrás dele. Quando chegou lá se sentou em uma poltrona e fez sinal para que Aster, Aryen e Orfeu fizessem o mesmo. Só falou quando todos estavam acomodados.
— Esta é a primeira vez que me vejo descoberto por uma guardiã em muitos e muitos milênios o que me faz pensar que fiz algo errado quando decidi criar vocês. Deveriam ser capazes de me reconhecer e me encontrar sem tanta dificuldade.
— O quê? – perguntaram Aster e Orfeu juntos e surpresos.
— Conte a eles garota. Não pretendia que soubessem dessa forma, esperava que vissem o que sempre esteve diante de seus olhos, mas pelo menos agora não temos uma plateia. – Somor falou olhando para Aryen.
— Somor não é um bruxo, é o Senhor Dimensional de nosso mundo. – Ela falou olhando para os dois que abriam as bocas incapazes de falar.
— Conte como me descobriu. – Somor incitou.
— Depois que Ast me disse que quando assumiu como guardião dimensional já conhecia o nome de Somor eu fiquei intrigada, porque não era realmente possível isso acontecer. Um bruxo não tem como ser imortal realmente. Eles podem prolongar sua vida, mas não tanto assim, então me lembrei de como o conheci e a pergunta que me fez para concordar em me ajudar com o que eu queria. Depois comecei a analisar tudo que ele me disse desde que nos conhecemos, todo o conhecimento que ele tem sobre magia dimensional e etc., também percebi que ele nunca deixou de me observar, nem enquanto estive aqui e ele na orla exterior de Tér e só existia uma forma dele ser capaz de fazer isso, ou tivesse tal interesse. Porque ele é o senhor desta dimensão.
— Aquela resposta que me deu, me fez ver onde havia errado em minha concepção dos parâmetros estabelecidos para a escolha dos guardiões dimensionais pela magia. Porque até então não havia analisado a questão pela perspectiva que me deu, por isso comecei a observá-la. Queria saber se o seu discernimento era realmente tão bom assim, ou se fora um momento único. Uma epifania momentânea. Àquela altura já sabia que precisaria substituir Eros, mas Orfeu estava muito longe de estar preparado para assumir sua responsabilidade, então precisava encontrar um tutor para prepara-lo. Claro que sempre sei antecipadamente quem a magia dimensional vai escolher, portanto precisava garantir que ele estivesse pronto para isso e não fosse ludibriado por Eros. Precisava de alguém que assumisse porque era preciso, não porque almejava isso, portanto que não teria problemas em devolver-lhe o cargo quando a hora chegasse.
— Espere! Não estou entendendo nada agora. – disse Orfeu.
— E que resposta foi essa que a qualificou tanto? – perguntou Aster aproveitando a interrupção de Orfeu.
— Calma fedelho. Já vai entender. Ensinei Ary a isolar a mente para não ouvir os pensamentos alheios o tempo todo, porque eu mesmo faço isso, é chato, irritante e desnecessário, portanto não me atenho à mente de ninguém. A primeira vez que encontrei Aryen foi porque ela me procurou para tornar irreversível o que já fizera a si mesma para não conceber. Para alguém que estava se candidatando a se tornar uma guardiã galáctica era incomum.
"Então logo de início pensei que ela queria ser guardiã apenas porque era uma criança cheia de sonhos de aventuras e glória e logo se cansaria disso e se arrependeria do que fez a si mesma, querendo voltar aos confortos da vida real. Portanto a submeti a um interrogatório quase interminável. Não queria colaborar, tornar uma menina que mal chegara à idade adulta estéril ia contra os meus princípios, portanto ela teria que me convencer. E ela o fez. Diga a eles o que me disse".
— Ele finalmente me perguntou, depois de umas trezentas outras preguntas: Como se encaixava a pretensão de não procriar com a função de guardiã, vez que esta determinava a proteção e preservação da vida e o que eu queria para mim era o oposto disso? E eu lhe respondi que proteger e preservar a vida não inclui necessariamente conceber, podendo isso inclusive ser prejudicial ao cargo.
"Não conceber me tornava na verdade mais capacitada para a função porque em nenhum momento no futuro poderia deixar de exercer minhas funções ou me desviar delas para beneficiar meus próprios filhos. Sem a maternidade para borrar minhas percepções poderia ser muito mais eficiente, justa e imparcial, sendo capaz de realmente enxergar o que era melhor para a maioria sem ser guiada por sentimentos pessoais".
— E aí estava a resposta que eu não esperava, mas que explicava todos os infortúnios e erros que eu vinha assistindo por todos os domínios da dimensão. Assisti você Aster lutar e matar seus próprios filhos e descendentes, perder a mulher que amava no processo e sofrer de várias formas diferentes pelo que fizera. Vi Eros tentar povoar o próprio domínio ele mesmo e estava farto de ver por outros domínios erros e abusos pelo mesmo motivo: filhos próprios dos guardiões. Sentimentos sendo colocados muito acima do dever e das responsabilidades assumidas, como no caso dos dois domínios hoje sob sua responsabilidade Aster, o guardião do domínio natal dos devoradores achava que preservar a vida lhe impedia de matar a ameaça, pois esta também era uma vida, mas esqueceu-se da diversidade que é de suma importância para a manutenção da magia e da energia do domínio. E o outro guardião não foi capaz de dar fim às guerras que dizimaram seu domínio por prezar o livre arbítrio acima de tudo, principalmente porque seus filhos estavam envolvidos.
"Mas mesmo diante disso, não conseguia enxergar onde estava a falha, porque jamais tencionei que vivessem tanto sozinhos e sem amor e sempre julguei que o fruto desse amor fosse algo inevitável e imprescindível".
"Precisei ouvir a perspectiva de uma criança para começar a analisar que vocês não precisam estar sozinhos, mas também não precisam povoar um planeta para se sentirem bem. Realmente depois disso me interessei em saber a trajetória que aquela criança percorreria. Ao contrário de todo o resto da dimensão me mantive atento a sua mente, seus dramas e seus pensamentos. Confesso que há muito não me divertia tanto".
"Ela sofreu e se martirizou por suas certezas e convicções, se meteu em problemas e saiu deles, mas sempre de uma forma bem humorada e vendo o melhor de cada situação, aprendendo com elas. Ali estava alguém que realmente amava o que escolheu se tornar, adequou toda sua vida, toda sua percepção, toda sua determinação para atender o que melhor conviesse a sua função de guardiã".
"Fez acordos e se anulou como pessoa, desistiu de tudo que não fosse adequado a vida que escolheu. Mesmo quando se viu apaixonada, tentou de todas as formas sufocar isso em si por achar infantilidade e imbecilidade que seus sentimentos suplantassem seu dever e mesmo depois não deixou de lado absolutamente nenhuma de suas atribuições por esse sentimento".
"A frase que guia sua vida foi o que me fez direcionar o asteroide com sua energia para Vikary. E tudo que assisti desde que mandei aquele asteroide para cá me fez perceber que via pela primeira vez a personificação do cargo guardião. Acertara espetacularmente na escolha, porque nunca em meus incontáveis milênios de existência me deparei com alguém para quem o cargo de guardião representasse verdadeiramente a sua essência".
"Você Aster está muito próximo disso, sua determinação em corrigir o que seu primeiro amor criou e sua preocupação em manter sua criação digna de orgulho e de viver entre as demais espécies de seus domínios é louvável e espelha essa essência. Sua dedicação a seu domínio e a todos que o habitam, e agora aos domínios que lhe confiei temporariamente, também dizem muito quanto à proximidade que está de atingir esse ápice, mas a total entrega que ela demonstra praticamente desde que nasceu não tem precedentes. Quando ela achou que perderia tudo, amor, amigos, familiares, lar... Vi o que nunca esperei. Ela abraçou o que lhe estava reservado e seguiu adiante, nem por um momento pensou em fazer nada diferente, não procurou alternativas, simplesmente fez o que era necessário. Orfeu se lembra disso".
— Sim, me lembro de perguntar a ela e ela dizer que se queria ajudar não poderia fazer nada diferente. – Orfeu concordou.
— Ela nunca soube que seria apenas tutora, pensou que seria permanente e que tudo que conhecia ficara para trás e que não teria retorno, mas mesmo assim continuou, porque era preciso, porque era o certo, porque era o que ser guardiã significava. Confesso que nunca senti tanto orgulho.
— Desculpe Somor, mas estou curioso, que frase que guia a vida de Ary? – perguntou Orfeu.
— Quero estar e agir onde seja necessária e não em um só lugar, não por um só povo, planeta ou espécie. – Aryen respondeu a ele por Somor, então olhou para Somor – Fico muito mais do que lisonjeada por tantos elogios vindos de você, principalmente o conhecendo.
Somor gargalhou.
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Batalha da Aliança
Ciencia Ficción"OBRA COMPLETA" Depois de treinar, se aperfeiçoar, encontrar seu verdadeiro amor e descobrir a origem do mal que ameaça seu mundo, Aryen se vê em um mundo totalmente diferente do seu, com problemas sérios e que precisa de sua ajuda para se recuperar...