O início do caos

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Guardiões. Seres imortais que têm o dever de proteger as crianças, seus sonhos, suas esperanças, enfim, a infância. 

Como eles surgem? É bem simples. São escolhidos pela Lua. 

Sim, a lua. Aquela bola branca que brilha no céu durante a noite, ou melhor, o cara que vive nela. O Homem da Lua.

Se uma pessoa fez coisas muito boas em sua vida, se ela sempre teve sobretudo o amor ao próximo em seu coração então o Homem da Lua a transforma em um ser imortal após sua morte e se ele encontrar algo de muito especial nela, algo que ele ache que mereça ser perpetuado e compartilhado com o mundo, então ele o escolhe e o torna um guardião.

Meu nome é Jack Frost e eu tenho o dever de levar neve às crianças e fazê-las se divertirem, mas antes disso passei trezentos anos sendo invisível para elas. Durante todo esse tempo fiz de tudo para que me vissem mas nada nunca funcionou, porque no fim das contas elas não acreditavam em mim, até que eu conheci Jamie Bennett, a última luz. 

Há quatro anos, o Breu, mais conhecido como o Bicho-Papão, fez todos deixarem de acreditar nos guardiões, Jamie foi o único que continuou acreditando do fundo do seu coração e graças a isso, foi o primeiro a acreditar em mim, foi o primeiro a me ver e por meio dele, as outras crianças foram capazes de acreditar e começaram a me ver também mas tudo começou com ele. 

É isso o que eu protejo nas crianças. Seus corações puros capazes de acreditar em algo mesmo quando todos dizem ser impossível. Protejo seus sonhos, suas esperanças, a alegria, a diversão. Afinal... 

Eu sou um guardião.

Sobrevoo o estado da Pensilvânia, indo em direção a cidade de Burgess, depois de uma longa noite de trabalho finalmente estou chegando ao meu destino final. Por ser o primeiro dia de inverno, meu trabalho começou lá para a madrugada, passei a noite inteira congelando lagos, mudando as cores das árvores e das gramas de verde para branco, resumindo, levando neve para praticamente todos os Estados Unidos e agora estou indo levar neve para a minha cidade natal, onde o Jamie e seus amigos moram. 

Depois que me tornei um guardião, não passei um inverno sequer sem aparecer por aqui pelo menos uma vez para brincar com eles, então deixei para passar aqui por último  na esperança de que já estivessem acordados para ver a neve cair pois sei como eles gostam disso e eu também gosto de ver o sorriso deles vendo os pequenos pontos brancos caindo sobre eles. Não demoro muito para chegar e como eu esperava, já amanheceu aqui, porém tendo uma visão da completa da cidade, sou pego de surpresa.

Ela... já está toda coberta de neve! Todas as árvores estão brancas, os lagos congelados a neve com uma boa expessira no chão como se tivesse nevado durante horas... Como isso é possível? Ainda não passei por aqui, então... como é que...

-JACK! - ouço alguém gritar o meu nome e na mesma hora sou arrancado de meus pensamentos

É o Jamie, ele está brincando no meio de toda a neve com seus amigos na floresta e quando eles me vêem começaram a me gritar. Sorrio, embora ainda esteja perplexo com relação a como essa neve veio parar aqui e desço até eles.

-E aí, pessoal! Como vão? Jamie, Pippa, Cupcake, Claude, Caleb, Monty! - digo seus nomes enquanto os abraço, com exceção do Cloude e do Caleb, que preferem trocar um high five comigo

É muito bom saber que as crianças gostam de mim. Depois de séculos sendo invisível, finalmente ser visto e amado por elas é uma sensação muito boa! Esses últimos anos têm sido os melhores da minha existência, tenho minhas memórias de volta, sou visto, sei finalmente o porquê de estar nesse mundo, tenho tudo o que sempre quis! Mas o estranho é que... sempre que penso assim, não me sinto completamente feliz. É como se... sentisse falta de algo...  

-Obrigada por trazer a neve! - Cupcake fala e todos concordam

-Não tem de quê - digo sorrindo, apesar de não ter sido eu exatamente

-Eu disse para eles que você ia aparecer hoje, Jack! - diz o Jamie - Mas ninguém acreditou em mim. Disseram que você estaria ocupado demais por ser o início do inverno.

-Mas é claro que eu viria! Acharam mesmo que eu não apareceria para uma... - faço uma pausa - Guerra de bola de neve! - grito, formando uma bola de neve na minha mão e jogando no Jamie 

E então todos começam a gritar e a jogar bolas de neve uns nos outros. Com o meu cajado, faço fortes de neve para todos, inclusive para mim, pra tornar a guerra mais interessante além é claro de fazer várias outras bolas como munição. Neve vai para todo o lado, algumas vezes acertando o alvo e outras se perdendo entre as árvores. 

Se tem uma coisa que eu gosto é de brincar com eles, pois eu me sinto uma criança de novo! Toda a responsabilidade de ser um guardião vai embora, tudo o que resta é a diversão e eu posso até ouvir. As gargalhadas de felicidade deles são música para os meus ouvidos, afinal, se estão rindo é porque estão se divertindo e esse é o meu trabalho. E sempre que eu o faço me sinto muito feliz, pois não há nada mais satisfatório do que saber que você é bom naquilo que faz, no meu caso eu sou excelente, modéstia à parte. 

Passamos algum tempo brincando, não sei quanto exatamente pois sempre perco completamente a noção do tempo quando o assunto é diversão. De repente, tenho uma sensação estranha, estremeço levemente sentindo meu coração acelerar muito como se algo ruim estivesse prestes a acontecer. É uma sensação tão ruim que até mesmo me faz parar de brincar! Olho ao redor apreensivo me preparando para tudo o que pode acontecer e tendo em mente que preciso proteger as crianças a todo o custo mas torcendo para que seja apenas coisa da minha cabeça.

-Está tudo bem? - ouço a voz do Jamie ao meu lado, provavelmente percebeu o meu nervosismo

-Não tenho certeza... - falo sem olhar para ele

Ouço um barulho muito alto vindo de longe, como uma explosão, todos param de brincar com o susto que levam e começam a olhar na direção do som curiosos.  Então uma ventania passa por nós trazendo consigo folhas e muita terra, o que me obriga a fechar os olhos e apenas ouvir as crianças gritando assustadas. Quando ela passa, os abro novamente e me dirijo para as elas o mais rápido possível.

-Vocês estão bem? - pergunto preocupado e todos concordam ainda que um pouco ofegantes

-O… o q-que foi isso? - Monty pergunta temeroso enquanto ajeita seus óculos e eu suspiro irritado por não poder dar uma explicação decente

-Eu não sei… 

Volto a olhar para a direção em que ocorreu o barulho e vejo por entre as árvores, um pouco distante de nós, algo enorme saindo do chão e subindo cada vez mais ao céu, parecem tentáculos gigantes tentando agarrar qualquer coisa que apareça em sua frente…

Merda…

É a única coisa que consigo pensar quando entendo o que está acontecendo. Eu não havia percebido antes, mas o lugar onde nós estamos é perto da prisão! Eu devia ter visto isso antes e levado as crianças para brincar em outro lugar mas acho que estava distraído demais com toda essa neve misteriosa que veio parar aqui para notar. Até porque, para ser sincero, uma parte minha por um momento até havia esquecido de sua existência. Mas de onde os tentáculos saem, a cor tão negra quanto a mais completa escuridão, só podem significar isso…

Breu.

Assim como euOnde histórias criam vida. Descubra agora