"Fique comigo por um dia. Eu não tenho ninguém para me abraçar..." — Fragile // Gnash ft. Wrenn
Acordei tarde no outro dia. Olhei para as novas marcas em meu braço esquerdo e procurei em meu armário uma das muitas blusas de manga comprida que eu tinha para esconder.
Depois de tomar um banho e me vestir, parei e me olhei no espelho por um tempo. Meus olhos estavam inchados e cheios de olheiras pela noite mal dormida. Eu havia tido insônia e, quando finalmente senti sono, meu braço estava ensanguentado e com cortes finos que eu mesma causei em uma tentativa frustrada de fazer a dor ir embora. Eu sei, eu sei. Não faz muito sentido, não é? Mas é isso que penso enquanto a lâmina desliza por minha pele. "A dor está indo embora." Sei que isso é uma mentira. Uma constante mentira que está deixando marcas em meus braços. Marcas de fracasso, como eu mesma dizia para as pessoas antes de começar a fazer o mesmo que elas. Antes da minha vida virar um completo caos.
Chorei depois de ver todas os cortes. Me sentia um lixo, mas eu precisava fingir que estava tudo bem mesmo assim. Como eu faria isso? Todo dia eu me perguntava o porquê eu não era forte como Heitor. Forte e corajosa, para fazer o mesmo que ele.
Quando desci para comer, minha irmã já estava me esperando com o uniforme da escola e a mochila do lado, enquanto tomava seu suco.
— Onde está nossa tia, Eva? — perguntei sentando-me à mesa também.
— Lá fora, no jardim. — respondeu ela, parecendo meio triste.
Eu me sentia muito culpada por tudo que havia dito na noite anterior e mais culpada ainda por não conseguir pedir desculpas à minha irmã.
— Já terminou? — perguntei, referindo-me ao almoço dela.
Ela assentiu sem olhar para mim e senti meu coração doer.
— Então vamos? Já estamos atrasadas...
— Você não vai comer nada? — perguntou Eva, sem se levantar.
Neguei com a cabeça.
— Estou sem fome.
Ela me olhou estranho e levantou-se devagar, pegando a mochila em seguida.
— Você está muito magra, Enya. — disse depois de alguns segundos em silêncio.
Senti o nó se formar em minha garganta, mas engoli.
Precisava ser forte ou pelo menos fingir que eu era. Eu realmente estava muito magra, não negava isso. O espelho não me enganava.
Eu não tinha obsessão por magreza como as meninas da minha escola. Eu apenas não sentia vontade de comer e sabia que se comesse sem vontade eu passaria mal imediatamente. Como sempre acontecia.— Eu sei... — disse eu e tentei sorrir.
O ar do lado de fora estava quente e abafado. Ouvi a voz de Karla antes mesmo de vê-la.
— Enya você está louca? Tá um calor infernal aqui fora. Vista algo mais fresco.
Olhei para minha própria roupa e dei de ombros.
— Não estou com calor, Karla.
— respondi.Era uma tremenda mentira. Eu estava fervendo dentro daquele casaco que, pra piorar, era preto.
Mas eu não podia deixar que alguém visse as novas marcas em meu braço. Não suportaria ver todos os olhares de nojo e desprezo que provavelmente me lançariam a partir do momento que notassem a idiotice que eu estava fazendo comigo mesma.Karla me olhou de um jeito estranho, mas não disse nada.
Sabe, é uma sensação horrível ter que esconder todo o sofrimento por baixo de blusas de manga comprida. Esconder cicatrizes que não deveriam existir é... exaustivo.
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Por favor, não se aproxime
Teen Fiction"Tentativas frustradas de ser feliz também matam." Enya e Luan são dois jovens frustrados pelo passado. Após Heitor, melhor amigo de ambos, cometer suicídio, deixando uma mensagem onde explica os motivos para ter desistido de viver, eles começam a q...