Capítulo 19 - Talvez seja mesmo a hora de voltar

201 49 18
                                    

"Vem depressa. Vem me salvar!" — Salva-me // RBD

      Acordei com a luz do sol entrando pela janela do meu quarto e praguejei baixinho ao notar o calor que já se manifestava naquela manhã de sábado. Olhei a hora em meu celular e ainda eram 6h30. Como o sol podia já está tão quente? Eu definitivamente odiava o meu Estado.

     Levantei ainda sonolenta e fui direto para o chuveiro. Após tomar um banho gelado de aproximadamente dez minutos, vesti um short jeans com uma blusa preta de manga comprida e desci as escadas para comer alguma coisa. Karla já estava acordada preparando o café.

— Bom dia. Dormiu bem? — perguntou ao me ver. Apenas assenti, pois ainda estava chateada.

     Ela me olhou por um longo momento e balançou a cabeça negativamente.

— Tudo que faço é para te ver bem, Enya — disse ela. — Você não sabe o quanto amo você e sua irmã. Vocês duas são tudo que tenho.

— Eu sei, Karla — respondi, pegando uma maçã mesmo sem ter intenção de comer.

      Minha tia se aproximou de mim e beijou minha testa delicadamente.

— Marquei sua consulta com a psicológa local — disse. — Você vai na terça de manhã e de tarde você vai pra escola.

— Mas tia...

— Sem mas, Enya — interrompeu-me. — Falei com a direção da sua escola ontem, eles vão passar trabalhos para você recuperar suas notas. Segunda você volta às aulas.

— Karla, eu...

— Não se fala mais nisso, Enya Betim — disse minha tia. Ela estava irredutível, porém eu sabia que ela estava certa. Talvez fosse mesmo a hora de dar um jeito em minha vida. — Agora vá acordar sua irmã para o café.

     Concordei com ela e subi as escadas rapidamente para acordar Eva. Ela dormia tranquilamente abraçada ao seu jacaré de pelúcia. O mesmo que eu havia comprado para ela quando levei-a ao zoológico.

— Ei, Bela adormecida! — eu disse no ouvido dela. — Acorde!

     Ela mexeu-se na cama resmungando, mas não abriu os olhos.

— Vamos Eva, acorde!

— Não quero! — ela disse com irritação.

— Vamos, levante-se menina!

— Tá bom. — Ela sentou-se na cama e me olhou com a cara de sono mais fofa que eu já havia visto.

— Eva? — chamei, enquanto minha irmã terminava de acordar. — Eu te amo, tá?

     Ela não disse nada, apenas sorriu e me abraçou. Fiquei abraçada ao corpo frágil da minha irmã por alguns segundos e então senti vontade de chorar em seguida.

— Eu não tô bem, mana — falei. — mas eu prometo que vou tentar ficar, okay? Não precisa ficar preocupada comigo.

— Tudo bem, Eny — ela disse, com uma expressão triste. — Eu te amo.

     Sorri para ela e beijei suas mãos.

— Agora vá tomar seu café.

     Ela assentiu e saiu do quarto. Eu fiquei ali pensando sozinha, até que meu celular vibrou com uma mensagem de Luan:

"Estou te esperando aqui fora, Eny."

      Desci as escadas rapidamente e encontrei-o do lado de fora.
Ele estava montado em sua moto com o celular na mão.

— Podemos conversar em outro lugar? — indagou, quando me aproximei.

— Claro.

     Luan me entregou o capacete e pôs o outro, me convidando a fazer o mesmo. Pus o capacete e montei na moto.

      Ele pilotou velozmente em direção a praça mais próxima e parou já com lágrimas nos olhos. Abracei-o, também chorando. Chorando pelo que havia acontecido comigo desde a morte de Heitor. Deixei que as lágrimas rolassem por minhas bochechas como se fosse a única coisa que eu pudesse fazer naquele momento. E talvez fosse.

     Sabe quando a gente desaba e não existe um motivo concreto para isso? Você só começa a pensar em tudo de ruim que aconteceu em sua vida e simplesmente chora. Chora como se o mundo fosse acabar. Acho que era isso que estava acontecendo naquele breve momento.

— Tá doendo, Eny — disse Luan.

— Eu te entendo. — Eu estava sendo totalmente sincera, pois eu realmente entendia.

— Eu gosto dela de verdade. Por que tudo tem que ser tão difícil?

     Eu sabia que tinha a ver com Kell, por isso não perguntei detalhes sobre o que havia acontecido. O amor de Luan por Kell o machucava demais, lembrar de tudo detalhadamente só o faria sofrer mais. Disso eu sabia.

— Por que não fica com ela? — perguntei, mesmo sabendo a resposta.

— Porque não dá, Eny — respondeu ele. — Só me abraça, por favor.

     Assenti e permaneci abraçada a ele. Passamos um bom tempo apenas abraçados e chorando, até que ele se afastou, enxugando as lágrimas.

— Me conta como você tá — pediu.

     Suspirei e sentei-me no banco mais próximo, olhando para nenhum lugar específico.

— Minha tia quer que eu volte pra escola — contei. — Quer que eu vá a uma psicóloga também.

     Luan me olhou com um meio sorriso e sentou-se ao meu lado.   
Deitei minha cabeça em seu ombro e fechei meus olhos.

— Acho que eu quero morrer — sussurrei para Luan.

— Para com isso, Eny. Você não quer morrer... — respondeu ele.

— Então acho que só quero que minha vida pare por um tempo — chorei. — Minha tia pegou minhas lâminas ontem, não tenho mais nada para aliviar a dor.

— Você se cortava? — perguntou Luan, parecendo surpreso.

     Concordei com a cabeça.

— Você não?

     Luan balançou a cabeça negativamente.

— Então vai me julgar? — perguntei.

     Ele balançou a cabeça novamente.

— Não vou cometer o mesmo erro novamente — falou.

     Concordei com ele e senti lágrimas em meus olhos novamente.

— O que vou fazer, Luan?

— Faça o que sua tia quer — começou ele. — Ela está certa, Eny.

— Acho que não estou preparada.

— Eu te levo na escola. Me comprometo a te levar e te buscar todos os dias.

— Você faria isso por mim? — perguntei.

     Ele assentiu.

— Sim — disse. — E quanto ir à psicóloga, garanto a você que vai se sentir melhor se for.

— Mesmo?

— Mesmo. Falo por experiência própria. — Sorriu ele.

— Eu te amo, seu idiota.

— Eu também te amo, sua chata.

     Luan me abraçou de novo e beijou o topo da minha cabeça.

— Vamos superar isso juntos, não vamos? — Ele não esperava uma resposta, era mais uma pergunta para si mesmo do quê para mim.

— Eu espero que sim... — E eu realmente esperava.

Por favor, não se aproximeOnde histórias criam vida. Descubra agora