Capítulo 28 - Por favor, não se aproxime

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"Então me desculpe, meu amante desconhecido. Desculpe-me por não acreditar que alguém realmente comece a se apaixonar por mim..." — Sorry // Halsey

     Eu estava deitada em minha cama naquele dia. Meus pensamentos voavam de Heitor para Victor e no quanto eu estava magoada comigo mesma.

     Victor havia me ligado pela manhã. Conversamos e ele havia falado que havia brigado com a sua avó de novo. Fiquei preocupada e tentei dar o meu apoio da maneira que pude, mas eu odiava ter que fazer isso. Gostaria de não ter a responsabilidade de segurar o mundo de outra pessoa.

     Eu também estava pensando que eu sentia falta de Luan. Ele estava um pouco distante e eu estava com medo de que Kell pudesse ter feito algo para o afastar de mim, mas talvez fosse só paranoia da minha cabeça. Kell não chegaria a tanto.

     Cassandra estava passando mais tempo com o namorado, então por isso eu e Victor estávamos muito próximos. Próximos demais.

     Senti as lágrimas surgirem em meus olhos. Gostaria de parar meus pensamentos por um tempo. Pensar que Victor poderia agora está morto também igual Heitor me deixava inquieta. No momento em que Victor apareceu em meus pensamentos novamente, como se tivesse sido chamado, a porta do meu quarto foi aberta repentinamente e eu o vi entrar rapidamente com uma expressão desesperada que não percebi de imediato.

— Que intimidade é essa pra entrar no meu quarto desse jeito, Victor? — perguntei, assustada, Sentando-me na cama.  — Karla te deixou subir?

— Eny... — ele disse baixinho, ignorando minhas perguntas.

— O que aconteceu?

— Eu acho que estou apaixonado — falou e eu suspirei sentindo algo que não sabia na época, mas descobri com o passar dos anos que era ciúmes. Sabia que o perderia se ele encontrasse outra pessoa, assim como perdi Luan.

— Por quem? — indaguei, embora isso não fosse realmente importante para mim.

— Por uma garota que eu conheci faz algum tempo. — Ele sorriu.

— Ah... — Foi tudo que consegui dizer.

— Ela é linda... — ele falou, suspirando no final. — No começo ela era chata, arrogante... Mas eu sabia que no fundo ela era parecida comigo. Só havia apanhado muito da vida, assim como eu — ele disse, e eu franzi a testa.

— Então vai dizer isso pra ela. Não pra mim — respondi, simplesmente.

     Victor havia se tornado meu amigo, entretanto eu sabia que um dia ele encontraria alguém para ele e me deixaria sozinha com a minha dor enquanto uma pessoa iria cuidar da dele. Amigos não ficam grudados em nós para sempre. É uma verdade cruel e difícil de engolir, porém absoluta.

— Eny... essa garota é você. — Ele pronunciou essas palavras como se fosse uma coisa boa, mas não era. Victor sorriu. Um sorriso verdadeiro depois de dias, após o seu quase suicídio. Merda.

— Como assim? — questionei, quando finalmente consegui formular as palavras após um tempo de silêncio.

   Ele estava maluco, só podia ser. E podem dizer o que for, mas eu não queria fazer parte dessa maluquice.

— Eu te amo, Enya.

     Paralisei onde estava quando o vi se aproximar de mim. Eu sabia que ele não me amava, ele só estava confundindo as coisas. E, além disso, minha mente repetia excessivamente o nome do meu namorado morto. Heitor. Victor não esperou que eu dissesse alguma coisa. Simplesmente se aproximou de mim o bastante e me beijou. Minha mente só gritava que aquilo era errado e eu precisava continuar amando Heitor. Foram miséros 3 segundos, mas pareceu uma eternidade antes que eu finalmente me desse conta do que estava acontecendo e afastasse Victor imediatamente.

— Eny — começou ele, enquanto eu o olhava assustada. — É só um beijo — completou, segurando minhas mãos nas suas.

— Não pra mim! — gritei, levantando-me da cama.

     Ele me olhou por um instante e depois se aproximou de mim de novo, me beijando em seguida. Por um momento me vi correspondendo ao beijo dele, até que os gritos de minha mente se tornaram insuportáveis e eu o afastei com todas as forças que pude juntar. Lágrimas já escorriam pelo meu rosto.

— Eu tenho namorado! — Minha voz saiu mais desesperada do que eu pretendia.

     Eu sei que ele está morto. Sabia naquele instante também, eu não estava ficando louca. Contudo a culpa ainda estava presente em minha alma, parecia ter sido marcada a ferro lá dentro e eu não podia deixar de pensar que beijar Victor era traição. Doía pensar que talvez eu estivesse sendo egoísta em tentar ser feliz enquanto Heitor tirou a sua vida porque não estava. Victor me olhou confuso, mas logo depois pareceu compreender.

— Seu namorado morreu faz um ano, Enya — disse, me fazendo chorar compulsivamente.

— Não. — Essa foi a única palavra que consegui dizer.

— Não o quê? — Victor questionou.

— Não quero ficar com você. Saia daqui! — exclamei, abrindo a porta do quarto para que ele saísse. Ele continuou parado e isso me fez gritar mais alto para que ele saísse. O rapaz me olhou magoado, mas depois me lançou um olhar compreensivo.

— Por que, Eny? — perguntou, apenas. — Você não gosta de mim?

     Eu gostava dele? Sim, eu gostava dele. Não o suficiente para namorá-lo, mas gostava o bastante para decidir que mantê-lo perto só iria machucar a nós dois.

— Vai embora, Victor — falei, fazendo-o me olhar decepcionado.

— Eu pensei que gostasse de mim...

— Por favor, Victor... sai daqui — falei, sentindo as lágrimas insistentes.

— Eny... Se você gostar de mim vamos cuidar um do outro.

— Não — falei. — Não sirvo pra ser namorada de ninguém.

— Mas Eny, você vai me fazer feliz... — ele disse, tentando se aproximar novamente.

— Por favor, não se aproxime — pedi, em meio as lágrimas, colocando as mãos na frente do corpo de maneira defensiva.

     Pude ver lágrimas nos olhos de Victor também e o vi magoado comigo antes de sair sem dizer mais nada.

— Por que, meu Deus? Por que eu sempre machuco as pessoas? — questionei, sentando no chão, abraçando meus joelhos e olhando para o teto. — Eu sou um monstro... — concluí para mim mesma.

Já chega! Chega de machucar as pessoas, Enya.

Meus pensamentos eram confusos e tristes.

— O que eu faço? — perguntei para mim mesma.

Acabe logo com isso.

— Não posso...

Com o tempo eles superam.

— Não posso...

Sabe que você pode...

     Os últimos sussurros de minha mente insana me fizeram gritar. Era como se tivesse mais alguém vivendo dentro de mim. Alguém que eu não podia controlar. Isso me matava.

     Corri para a cozinha e peguei uma faca grande, Karla devia está no jardim com Eva, pois eu não as vi em lugar algum.

     Fui para o banheiro e fiquei na frente do espelho, me sentindo a pior pessoa do mundo. Talvez eu fosse mesmo.

     Fiz o primeiro corte com as mãos trêmulas e soluçando descontroladamente. Quando vi a profundidade do corte me desesperei. Eu não podia fazer isso, podia? Não, não podia. Porém não conseguia parar, então fiz outro e outro. Talvez fosse tarde demais para arrependimentos. Ver tanto sangue escorrendo pelo meu pulso esquerdo me assustou. A dor era tamanha que me vi gritando. Em alguns segundos a quantidade de sangue escorrendo aumentou numa proporção extrema. Tudo que eu conseguia pensar, enquanto minha visão se tornava embaraçada, era que eu sangraria até a morte.

     Senti a escuridão me dominar e tudo que me lembro depois disso foi do impacto do chão contra meu corpo, enquanto eu pensava como seria para minha irmã me encontrar daquele jeito.

— Por favor, me desculpem — sussurrei antes de perder a consciência.

Por favor, não se aproximeOnde histórias criam vida. Descubra agora