Décimo Quarto

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— É diferente, sabe?! Tipo, antes a gente tava junto, mas não tava de verdade e agora parece mais real. Entende?

Meu amigo sentou-se no balcão e revirou os olhos para mim. Hoseok tinha ido passar a tarde na floricultura, obviamente não para me ajudar, apenas para fofocar e não estava o poupando de detalhes sobre meus sentimentos quanto ao meu mais novo relacionamento.

— Não vai sair disso agora porque ficou sério, né? — perguntou. Sabia que já estava preparando o sermão caso minha resposta fosse sim. — Yoongi gosta de você de verdade, eu vi isso. Não pode pedir o cara em namoro e desistir dois dias depois.

— Primeiro, desce daí. Minha mãe vai te matar se ver isso — reclamei, bati nele com o pano que usava para limpar o balcão. — Não estou dizendo que vou desistir, só tô falando que é diferente. É estranho, mas não é ruim.

Na verdade, estava longe de ser ruim. Namorar Yoongi era maravilhoso.
Faziam exatamente dois dias que estávamos juntos de verdade e as coisas entre nós não tinham realmente mudado, exceto pelo fato dele gostar de me chamar de "namorado" — segundo ele, a ideia ainda não parecia real e tinha que ficar ressaltando pra se acostumar, mas sabia que ele só estava muito feliz.

Estava lidando com aquilo muito melhor que imaginava, as vezes parecia uma mentira e as vezes me perguntava se estava certo em ter o pedido em namoro. Porém, sabia que gostava de Yoongi e queria ficar com ele, já não conseguia imaginar como seria ficar sem ele.

Não estávamos mais próximos desde a viagem porque seus estudos não permitiam que nos víssemos sempre, mas também não estávamos mais distantes. Tudo indo maravilhosamente bem.

Hoseok havia gostado de saber que eu tinha tomado uma atitude pela primeira vez na vida, e nossa família — que havia descoberto assim que voltamos para a casa — tinha comemorado apesar de terem dito coisas como: "como assim estão namorando? Vocês já não estavam?"

Aquela viagem havia sido boa para nós de várias formas. Agora eu tinha um namorado de verdade, estava mais próximo dos meus irmãos, meus irmãos estavam mais próximos e minha mãe tinha uma nova amiga. Ela e a mãe de Yoongi se falavam o tempo todo.

— Okay, você me contou todos os detalhes de como foi se preparar pra pedir ele em namoro, mas não me disse nada do que aconteceu depois do pedido — Hoseok disse, parando bem do meu lado. Ele começou a me cutucar com um sorriso idiota. — Diz pra mim, o que vocês fizeram depois? Hein?

— Hoseok, sei que você é desocupado e não entende a responsabilidade de um emprego, mas preciso trabalhar — reclamei indo na prateleira de trás pegar alguns vasos para colocar as flores novas.

— Nem tem movimento hoje e você trabalha pra sua mãe — começou a andar atrás de mim. — Aconteceu alguma coisa e não quer me contar? Jiminie, achei que fossemos melhores amigos. Sempre te contei tudo.

Larguei as coisas de vez no balcão e me virei para encara-lo. Não tinha nada interessante para contar, mas sabia que ele continuaria a insistir se não lhe dissesse.

— Nós só ficamos lá e comemos, conversamos e nos beijamos. Feliz?

— Não! — berrou. Uma senhora tinha acabado de entrar, ela nos olhou assustada e então seguiu para um corredor, ainda olhando para trás. Dei meu melhor olhar de repreensão, mas ele deu de ombros e sorriu. — Desculpa, mas não é possível que preparam um puta encontro pra vocês, pede ele em namoro, tem um sofá prontinho e vocês usam ele pra sentar e conversar! Seria uma primeira vez muito romântica.

— Mas n...

— A primeira vez de vocês dois, idiota.

— Por que está tão irritado com isso? — Disse mais baixo. Não queria que uma senhora escutasse sobre minha vida sexual inativa. — De qualquer forma, começamos a namorar agora, não vamos apressar as coisas.

Hoseok assentiu e suspirou. Puxou a única cadeira disponível ali e se sentou, como se fosse ele que estivesse cansado por ter estudado a manhã inteira e trabalhado até o momento.

— Tudo bem, respeito sua decisão. Nunca conversaram sobre isso?

— Nunca. Isso seria um pouco constrangedor — fiz uma careta. A senhora parou no balcão com uma cara horrível, talvez ela tivesse ouvido toda a nossa conversa, ela deixou o dinheiro no balcão e saiu. — Tenha um bom dia, senhora.

— Não sei como consegue atender esse povo mal-educado e ainda ser gentil, eu teria mandado ela i...

— Por isso que você não tem um emprego — o interrompi. — Por que está aqui afinal? Não tinha um trabalho pra fazer com aquele seu amigo esquisito?

— Namjoon não é esquisito, ele só não foi com a sua cara e não é pra menos. Tínhamos marcado algo naquele dia e você apareceu três horas depois, complicou nossa vida — lembrou. E na verdade a culpa nem tinha sido minha, mas ele gostava de fingir que sim. — Mas o assunto aqui é você e o Yoongi. Vocês têm que conversar sobre isso!

— Hoseok! — repreendi. — Será que você pode deixar minha vida sexual em paz? Vamos falar sobre isso quando a gente quiser falar sobre isso.

— Jimin! — ouvi a voz da minha mãe. Agora iria me ferrar por causa do meu amigo enxerido. Que maravilha! — Não te pago pra ficar falando essas coisas em horário de trabalho. Já terminou suas tarefas?

— Sim, mãe. Desculpa, mas a culpa é toda dele — apontei para meu amigo que colocou a mão no peito com uma expressão falsa de choque. — Não se faça de desentendido.

— Te conheço, Jung Hoseok. Sei que vem aqui pra fofocar e tirar meu filho de foco — ela disse com os olhos entreabertos. Aquele olhar de julgamento realmente assustava. — Ou você ajuda aqui ou vai embora. Não vai ficar atrapalhando.

Ele murmurou um "sim, senhora" baixinho e começou a organizar as prateleiras.  Ri discretamente daquela cena, mas nada passava despercebido pela minha mãe, ela me lançou um daqueles olhares que significava que se não voltasse ao trabalho iria me arrepender amargamente.
Pelo menos agora faltava pouco para o fim do meu turno e tinha um pouco de ajuda extra.

Hoseok foi convidado para o jantar, porque mesmo sendo um fofoqueiro desocupado, minha mãe o adorava e não ligava de verdade pro fato dele me atrapalhar as vezes.

Ela comentou que havia conversado com o meu pai — o que era um avanço enorme, eles não se falavam de verdade há quase um ano — e que haviam concordado em Taehyung vir para nossa casa no próximo final de semana. Também disse que isso seria ótimo e que o próprio tinha falado que estava muito estressado em casa, aparentemente as coisas não iam bem entre ele e a mãe.

Imaginava que seria muito bom agora que nos dávamos bem melhor. Jihyun também não se importou, aparentemente Jungkook é ótimo em unir as pessoas.


Depois do jantar, e de Hoseok ir embora, terminei algumas atividades super atrasadas da faculdade. Não era uma boa ideia deixar a matéria acumular, mas eu era mesmo um procrastinador de primeira.

Lá para as três da manhã, quando estava prestes a acabar a última pesquisa, recebi uma mensagem de Yoongi. Ele tinha acabado de chegar em casa e estava falando sobre o quão cansado estava.
Respondi pedindo para ele comer e ir descansar, não economizei emoticons de coração, apesar de eu não gostar de emoticons.

Os próximos dias se seguiram assim. Ia para a faculdade, estudava, trabalhava e conversava com Yoongi vez ou outra no meio do dia ou durante a madrugada. Confesso que sentia saudade de todo o contato que tínhamos antes, mas eu entendia que ele ainda era um estudante e precisava de todo o tempo, até o que não tinha, naquele hospital.


Na sexta à noite, Yoongi foi me buscar para me dar uma carona até a casa do meu pai. Isso foi ótimo porque não nos víamos desde a viagem e eu realmente sentia muito sua falta.

Os vinte minutos que levavam da minha casa para lá, eram pouquissimo tempo para quem tinha se passado tantos dias longe. Aproveitamos para conversar sobre nossa semana durante o caminho.

Ele estava muito animado contando sobre as coisas do hospital, não entendia metade dos termos médicos que ele usava, mas sua empolgação era tão adorável que não seria capaz de interrompê-lo.

— É uma pena que tenha que passar o final de semana aqui, vou ter bastante tempo livre — comentou. Tínhamos acabado de chegar, mas me agradava a ideia de passar mais um tempinho no carro com ele.

— Use esse tempo para estudar, podemos nos falar por telefone — falei colocando minha mão sobre a sua. Yoongi apenas riu baixo.

— Sabe, eu estava pensando... já conheço quase toda a sua família e ouço falar de todos, menos o seu pai — disse virando-se para me olhar melhor. Isso era um assunto realmente complicado.

— Ah, é que... bem, você sabe... — disse sem encara-lo. Eu não era muito próximo do meu pai, ele não sabia sobre meu gosto por homens e muito menos que estava envolvido com um, não tinha a menor ideia do que ele pensaria sobre isso e não achava uma boa ideia apresentar Yoongi ainda. Seria algo como: "Boa noite, pai. Como tem passado? Eu estou ótimo, aliás, sou gay e esse aqui é meu namorado." — Ele ainda não sabe sobre... isso.

— Não sabe que estamos namorando? — perguntou. Um sorriso mínimo surgia em seu rosto todas as vezes em que dizia isso. Simplesmente adorável!

— Não, Yoon. Ele não sabe que sou gay — tive que rir da cara de surpresa que ele fez. — Ah, pensar sobre isso me deixa um pouco nervoso. Mas acho que já está na hora, não é?! Você vai conhecê-lo.

— Jiminie, qualquer coisa te deixa nervoso — Segurou minha mão e a acariciou. — Não tem que fazer isso se não estiver pronto, pelo menos não por mim. Não me importo de demorar um pouco pra conhecer o meu sogro.

— Tem que parar de sorrir assim toda vez que diz essas coisas — brinquei, não queria que realmente parasse, além de ser fofo, adorava quando fazia isso. Ele deu de ombros e me deu um selinho.

— O que posso fazer se adoro lembrar que sou seu namorado — falou em um tom orgulhoso que me fez rir um pouco mais alto. Seu rosto ainda estava bastante perto do meu, isso me deixava com muita vontade de beijá-lo de verdade.

— Hm, eu também gosto bastante disso — respondi. Segurei seu rosto com uma das mãos e o puxei para um beijo, nada muito demorado como eu gostaria, mas o bastante pra compensar todos esses dias sem nenhum beijo sequer. — Preciso ir, tá ficando tarde e não quero que liguem pra minha mãe pra saber onde eu estou.

— Ela provavelmente chamaria a polícia na mesma hora — Apesar de saber que provavelmente era verdade, nós dois rimos juntos.

Yoongi fez questão de sair do carro comigo. Deu a volta no mesmo e parou na minha frente para me abraçar.
Ficamos ali, juntinhos encostados no carro dele, mesmo sabendo que deveríamos ir logo. Enrolar e ficar ali me parecia muito mais atraente que entrar em casa.

— Seria ótimo se pudesse passar o fim de semana na sua casa em vez disso — confessei me aconchegando naquele abraço. O cheiro dele era tão bom que estava torcendo pra seu perfume ficar na minha roupa.

— Seria mesmo, mas você tem que entrar em casa e eu tenho que ir para minha — suspirou antes de me afastar apenas o suficiente para me olhar.

Resolvi que seria uma boa ideia dar um beijo de despedida, então apenas juntei nossos lábios. Planejando um beijo rápido porque estávamos no meio da rua e ainda tinha algum movimento por lá.

— Jimin?

Se tinha pensado que apresentar o meu namorado para o meu pai, que não sabia sobre a minha sexualidade, do nada era uma má ideia, então o que era beijá-lo na frente dele acidentalmente?

Me virei para ele completamente chocado. Meu coração batia tão rápido que parecia querer fugir tanto quanto eu naquele momento.

Meu pai com toda certeza estava bastante surpreso. Ele nos encarava com a boca entreaberta e os olhos um pouco arregalados.
Eu não entendia muito sobre linguagem corporal, mas acho que aquilo não era tão bom sinal.

Era compreensível, não é sempre que ele chega em casa e encontra o filho, até então considerado hetero, beijando um homem no meio da rua.

Graças a Deus, Yoongi não levou mais que alguns segundo para entender toda a situação e me afastar delicadamente. Isso porque eu estava ocupado demais em estado de choque para me mexer sozinho.

— Você... O que... — meu pai gaguejou. Ele estava claramente nervoso, suas orelhas estavam ficando vermelhas. Mau sinal. — Quem é você?

— Sou Min Yoongi, senhor — falou se curvando em seguida. Ao menos ele saberia que estava com alguém muito educado, isso podia amenizar alguma coisa.

— Min Yoongi — repetiu baixo. Assentiu algumas vezes e ajeitou a postura. Quando ele olhou diretamente para mim, senti um calafrio correr todo o meu corpo, acho que seria um bom momento pra começar a orar. — Entrem.

— Entrar? Nós dois? — perguntei apontando para mim e depois para Yoongi, apenas para ter certeza que tinha ouvido certo.

— Sim, os dois — disse alto, claro e grosso.

Sem esperar por uma resposta, começou a andar na nossa frente. Olhei para Yoongi e sorri, de nervoso é claro, ele se aproximou e afagou minhas costas, me incentivando a começar a andar.

— Bom, pelo menos agora ele já sabe — sussurrei.

* Vênus * Myg + Pjm *Onde histórias criam vida. Descubra agora