Por cima do cadáver

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Sorri fraco enquanto via Ruy brincando com outras crianças de pega-pega, correndo pelo salão. Como eu adorava essa brincadeira na minha infância...
Amanda também o observava atentamente e qualquer tentativa de desvio de rota, o alertava para voltar.
Confesso a você que ter filho não é nada fácil, mas é extremamente prazeroso. O mais interessante é sentir um amor gigantesco por alguém que ainda se formava em meu ventre. Esse amor que chega a transbordar quando se tem o bebê nos braços. Quando o vi pela primeira vez, tive a certeza que só me faltava aquela coisinha linda para ter conhecimento da verdadeira felicidade. Ruy havia se tornado a razão da minha vida.
- Ele está ficando cada dia mais lindo... - Rodrigo parou ao meu lado, fazendo-me erguer a cabeça para olhá-lo. Reconheci sua voz de primeira.
Suas mãos estavam no bolso da calça azul marinho forte, acompanhado de um terno da mesma cor, aberto, sobre a camisa azul fraco com alguns botões desabotuados. Já havia tirado a gravata, estando sobre seu pescoço. Mantinha os olhos fixos em Ruy e então, voltei a observar o meu pequeno, acompanhando-o na admiração.
- Verdade. Está crescendo tão rápido...
- Sonho com dia em que o ouvirei me chamar de pai.
Suspirei um pouco. Também almejava aquilo, mas não podíamos. Seria conveniente que soubesse quando alcançasse uma idade que podesse compreender isso, apesar de já sentir antecipadamente o meu coração sangrar quando soubesse que seu pai era seu próprio tio- avô. Que loucura!
Voltei a erguer minha cabeça para vê-lo:
- Tenha paciência, Rodrigo! O importante é que você é presente na vida dele. Quando souber, isso contribuirá para que não se revolte conosco por termos escondido tal informação por tanto tempo.

Ele respirou fundo. Sua frustração era evidente e eu compreendia sua tristeza. No entanto, seria bom que entendesse a situação e tivesse impassibilidade. Caso contrário, estaríamos em apuros com nossa família.
Sem nada a dizer, se retirou da minha presença e dei de ombros. Acreditei que já estava chateado comigo mas Vinícius havia retornado, trazendo-me uma outra taça de champanhe. Sentou-se ao meu lado na mesa e sorri assim que peguei o copo da sua mão:
- Obrigada pela gentileza, Vinícius!
- Disponha! - desviou o olhar rapidamente do meu e perguntou:
- É impressão minha ou o Rodrigo saiu daqui assim que me viu chegar?
Franzi as sobrancelhas, virando-me para ele:
- Claro que não! Ele só veio me falar algo e já teve que voltar para sua acompanhante.
- Muito linda por sinal!
Ouvir aquilo me deu nos nervos. Detestava saber que Rodrigo estava com uma mulher tão bonita quanto eu, pra Vinícius também achá-la linda? Impulsivamente, quase gritei com ele:
- Tem certeza disso?
Ao perceber meu tom, Vinicius gargalhou um pouco, tomando uma dose da sua bebida:
- A beleza de outras mulheres não diminui a sua. Você é fantástica.
Então me dei conta do meu comportamento. Mas fingi não ter sido algo demais, tentando mudar de assunto depois de ter dado um gole:
- Está gostando da festa?
- Com certeza! - exclamou, olhando para frente - Fiquei muito contente ao receber o convite. Torço pela felicidade de vocês depois do que minha mãe fez.
Ri com meiguice, pondo minha mão sobre a sua, que estava na mesa. Com aquele contato, me encarou com suas esferas azuis e com o olhar sensual típico que utilizava nas publicidades para conquistar consumidores:
- Sua felicidade poderia ser ao meu lado, Samanta.
Ergui as sobrancelhas, realmente surpresa. Com certeza, o excesso de álcool estava o desinibindo. Sorri rapidamente e não pude deixar de me imaginar na cama com ele. Com certeza, já havia ficado com outras mulheres e agora estava mais experiente. Seria interessante relembrar os velhos tempos...
Nós nos encaravamos quando meu pai chegou de repente, sentando-se ao lado de Vinícius, que deu-lhe a mão em felicitações:
- Parabéns pelo casamento, Ricardo. Desejo o melhor para você e sua esposa.
Ricardo sorriu ao ponto de fechar seus olhos. Achava tão lindo, pois era semelhante ao sorriso sincero de Rodrigo:
- Obrigado, Vinícius! E você já casou?
Pareceu ruborizar com aquela pergunta, seu rosto ficando levemente vermelho. Eu apenas prestava atenção nos detalhes. Sempre adorei observar as expressões das pessoas:
- Ainda não. Mas caso sua filha queira um pretendente, estou à disposição.
Meu pai gargalhou imediatamente daquilo e eu levei a mão a boca, perplexa, notando que Vinícius já estava bêbado:
- Se ela quiser, tenha certeza que faço muito gosto.
Meu pai respondeu-lhe divertido com aquela situação. Vinicius passou a mão nos cabelos e olhou para mim rapidamente.

IRMÃO DO MEU PAIOnde histórias criam vida. Descubra agora