"Não existem caminhos fáceis, nos filmes, os atalhos sempre levam ao vilão. Na vida acaba mesmo sendo assim." L. Krsna
Recomeçar a sua vida após uma pancada muito forte, colar os pedaços, e seguir em frente. Todo mundo já fez isso – ou vai fazer – alguma vez na vida. Eu lembro bem de uma frase de Hermann Hesse, no livro Demien quando ele diz que para nascer temos que destruir o mundo. Eu só descobri o que isso significava de fato, quando perdi a visão e tive que recomeçar.
Somos como um pássaro, que tem que destruir o mundo que conhece – o ovo – para poder nascer. Assim somos nós, temos que destruir o que conhecemos, o que somos, para renascer no que seremos. Meu mundo eram meus sonhos, meu avião, meus planos. E então quando eles começaram a se destruir, surgiu Hinata, minha luz. E então minha luz se foi, e surgiu apenas a escuridão: Obito.
E eu sobrevivi a ambos.
E no fim tudo estava quebrado, mas eu estava vivo. Eu era um recém-nascido.
Quando eu sai do hospital, naquela primavera, eu não fazia ideia do que faria da minha vida, mas de uma coisa estava certo: eu estava vivo, e não iria desperdiçar isso.
Porque até conseguir esse feito – de estar vivo, de estar bem, de ter renascido – meu mundo inteiro havia ruído, e eu vivi na completa escuridão.
.....................
Eu estava doente, não era difícil de se perceber. Me sentia enjoado a todo instante, minha cabeça parecia um chão perto de rachar por um terremoto. As dores eram tão fortes, que minha visão se tornava escura. Quando falei isso a Obito, ele apenas me deu um medicamento que me derrubou por algumas horas, dizendo que devia ser sequela do acidente.
Quando disse que talvez fosse uma boa ideia procurarmos um hospital, ele disse que faríamos isso quando chegássemos em Tokyo. Não era complicado para mim perceber que havia algo errado. Ir para Tokyo de carro era estranho, e ele parecia estar tomando estradas longas demais, desertas, mas sempre que eu perguntava algo, eu recebia uma resposta confusa, ou acabava tomando o medicamento. Eu não recusava, a dor realmente era horrível demais, dormir era um alivio.
Algo no topo da minha mente me alertava para ficar acordado. Quase nunca parávamos, e quando o fazíamos, eram em lugares beira-de-estrada, desertos. Quando uma semana se passou, eu sabia que não estávamos indo para Tokyo, e não conseguia ficar acordado por mais de meia-hora.
Havia algo de errado.
Algo de muito errado.
Era comum acordar com ele tocando meu rosto, com um misto estranho de adoração e nostalgia que eu não consegui entender. Ele dizia coisas estranhas. Eu nem mesmo conseguia tomar o medicamento por mim mesmo mais, ele sempre me fazia tomar, mesmo eu não querendo. Comecei a perder a noção do tempo. E sempre que estava apagado, eu lembrava de coisas. De uma garota de cabelo rosa, dois meninos de cabelo preto e olhos negros como Obito. E havia uma mulher da cabelo vermelho, um homem loiro, um velho e uma mulher loira. E havia sempre lá, olhos opacos, cheiro de jasmim, mas nunca um rosto, e era esse que eu mais queria ver. Havia uma voz doce na minha cabeça, me falando coisas sábias. E havia muita dor. Quando perguntava a Obito quem eles eram, ele sempre dizia que eram um delírio, e embora sempre fosse calmo, até gentil, ficava irritado.
Eu não sabia quanto tempo havia se passado. Quando dei por mim, estava deitado em uma cama de madeira perto de uma janela,e tudo que eu via por ela eram montanhas, e árvores. Eu não lembrava como havia parado lá, e não conseguia me levantar da cama. Sempre que precisava, Obito me ajudava. Para ir ao banheiro, tomar banho, tomar sol. Ele dizia que eu estava doente e que cuidaria de mim, e passava todo o tempo por perto, lendo capítulos de livros como se eu fosse uma criança, me falando sobre coisas que não lembrava, brincadeiras que não pareciam minhas, sempre dizendo "nós sempre fizemos isso".

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Da tua retina
FanfictionAviso de imediato que essa não é uma história triste e depressiva, apesar de ser narrada por um cara que acabou de ficar cego e teve uma estranha experiência de quase morte. Essa é a história de uma cara que só acreditava no que poderia ver, e por...