Invictus

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"Eu vejo bem agora que isso acontece o tempo todo na vida. Você pode ver bem quando algo começa, onde se inicia o primeiro parágrafo das coisas, mas o último, ah o último pode ser 200 páginas depois, 20, ou até do outro lado da folha. " L. Krsna

Pior do que uma dor é a antecipação dela. Aquele momento que você sabe que o golpe virá e você não poderá fazer nada para impedir. Senti a respiração forte e rápida em meu ouvido, o agarre de ferro e o peso em cima do meu corpo era sufocante. A mão que agarrava minha nuca, jogando meu rosto no colchão e que me impedia de respirar.

Na minha cabeça, outras cenas se passavam, ainda piores. Eu via Hinata caída no chão do asfalto, lutando para respirar. Seus olhos opacos cheios de medo da morte, os gritos de Neji. Uma dor sob outra dor.

-Eu te avisei Damian. Eu avisei.

Eu nunca me sentia tão fraco, tão derrotado e tão sozinho. Naquele momento que você sabe que não adianta chorar, não adianta pedir ajuda. Que só se pode esperar e juntar o que sobrar dos pedaços.

-Pare...pare com isso!NÃO NÃO!

Abri meus olhos com o grito que saia da minha própria garganta, mas tudo continuava na escuridão. Alguém estava me chamando, repetidas vezes, e quando senti a mão em meu braço tentei golpear, fugir, gritar. Senti um baque quando meu corpo foi ao chão, e então braços tentando me imobilizar.

-NÃO!

-Somos nós! Naruto! Somos nós!

-Por favor...

-Respire! Sou eu, é a mãe Naruto! Você está seguro.

As vozes aos poucos me alcançaram, e relaxei. Minha respiração ainda acelerada e senti braços ao redor de mim, seguidos por outro par conhecido. Tentei não sucumbir a vergonha, por ter tido aquele tipo de ataque e estar chorando na frente do Sasuke e da minha mãe. O cheiro dela me fez relaxar. O toque frio de Sasuke em meu ombro me trouxe de volta a realidade. Eu estava em casa. Eu estava bem.

-Ele está melhor?

Ouvi outra voz, a de Neji, e dessa vez afundei a cabeça no ombro da minha mãe, ainda no chão, envergonhado. Eu havia esquecido que ele estava na minha casa. Só agradecia que Senhor Hiashi havia ido embora mais cedo, que Neji havia ficado para a noite por ceder vaga na caminhonete para os outros e voltaria pela manhã, quando Hanabi viesse buscá-lo.

Eu não queria que ele pensasse que eu era fraco. Era apenas que tudo que acontecera no dia anterior, trouxera lembranças ruins demais.

Fora o último dia do julgamento. O pior dia, em que tive que dar o testemunho. Sentar na frente de todos não era o real problema. Nem mesmo saber que Obito estava ali, mesmo que eu não pudesse ver, me olhando.

O pior era contar tudo o que havia acontecido. Reviver tudo aquilo. Responder todas aquelas perguntas, ouvir laudos.

Após o capotamento do carro, pelo o que os legistas do acidente chamaram de milagre, nós dois sobrevivemos. Obito em melhor estado do que eu, que fui cuspido do carro. Logo que foi liberado, ele foi imediatamente para a prisão preventiva enquanto o julgamento não era realizado. Eu fiquei em coma durante um bom tempo ainda, tanto pelas sequelas do acidente, como pela realização de emergência da cirurgia em minha cabeça. Sofri duas paradas cardíacas, mas despertei, mesmo que cego, mesmo que repleto de traumas. Eu estava vivo.

Eu era um milagre.

O fato de ele ser um Uchiha, mesmo que de um ramo mais distante da família, gerou muita repercussão no caso. O julgamento durou uma semana, os advogados de defesa queriam atestar um distúrbio psicológico, e que ao invés de Obito ser preso, ele fosse enviado para uma clínica psiquiátrica. Foi desgastante. Eu estava esgotado. Eu queria fugir da sala, e mesmo que minha mãe houvesse me dado a opção de gravar meu testemunho, eu ainda assim quis fazer isso. Contei sobre o sequestro, a tortura, o abuso. Sobre o que ele havia me dito sobre a morte de Rin e Damian. Contei em detalhes, cada parte, tudo o que podia lembrar. E ele apenas ficara em silêncio. Para horror dos advogados de defesa, ele nem mesmo se defendera. Não havia como.

Da tua retinaOnde histórias criam vida. Descubra agora