XIX

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Morte. O som dessa palavra era como música para mim, me lembro de quando ele me ensinou o valor de uma alma para a minha coleção. Me lembro como se fosse hoje da primeira alma que colhi, a dele. Balançando a foice com a pedra d'alma fortemente cravada nela eu fico a imaginar qual o sentido de permanecer vivo, ele poderia ter me deixado ir e ficado com ela mas preferiu morrer.

- Quando vai largar essa de cosplay de Tanatos?  - Ana se sentou em meu colo rindo da minha situação. Para uma simples humana ela é muito bonita, embora burra e desprovida de sentimentos. O que um cara deve fazer para viver em paz?

- Quando vai deixar de ser oferecida?  Odeio esse tipo de gente. - da mesma forma que se sentou ela foi embora sem retirar um pingo da minha atenção. Gostava de ficar próximo a ponte de pedra enquanto os motoqueiros corriam de um lado para o outro,  bebiam e morriam me dando energia.

Fui atraido para cá por causa das mortes recentes, embora Japão não seja meu país predileto tem alguém cuidando da minha alimentação diária e eu preciso agradecer por isso. Eu sempre soube embora achasse que era um garoto louco por falar que os deuses da mitologia grega existiam, aqui estou eu sendo a prova concreta disso. Me escondendo na escuridão da noite e perambulando pelas ruas tentando ser uma pessoa sociável embora ninguém ache minha aparência convidativa.

Não tenho o costume de sair durante o dia e por esse motivo me alimento aqui mesmo do medo das pessoas. As vezes é legal assusta-las e roubar seus lanches. Mas nada se compara com a força que as almas me dão.

[···]

Odeio cidades populosas, odeio ruas lotadas mas meu estomago roncava de fome de um jeito ensurdecedor. Dei uma escapada do apartamento comprar algo que não estivesse cru, esbarrava em várias pessoas e por fim avistei um carrinho de peixe frito. Já estava no meu sexto espetinho quando ouvi um garoto gritar.

- Não adianta correr Kouta, nós vimos você!  - minha atenção foi roubada por ele, estava acompanhado de uma garota ruiva. Minha nuca formigou e eu soube que eram semideuses.

Sairam correndo atrás de um garoto e eu me apressei para alcança-los mas a multidão me atrapalhava. Estava quase me aproximando deles quando um ferro apareceu em minha frente e eu não consegui desviar, minha cabeça se encontrou com um ferro em um abraço forçado e me jogou bruscamente no chão. Lembro de pessoas dizendo que viam coisas estranhas quando batiam a cabeça como aves brancas e seres lindos, eu vi Harpias voando com uma garota ruiva pendurada. Me levantei devagar e os segui com os olhos até ela cair no teto de um dos prédios.

- Parabéns Christian, agora você esta maluco também, que maravilha. - corri até a saida do prédio e segui eles três devagar sempre indo contra o vento para evitar ser descoberto.

A floresta ia ficando mais densa a medida que eles iam andando e por alguns segundos pensei que tivessem me visto e tentando me despistar mas entre as árvores eu avistei uma pequena fazenda com alguns seguranças em volta e um pequeno avião. Os três seguiam naquela direção mas eu não podia os acompanhar ou seria feito de peneira, fiquei escondido entre as árvores esperando anoitecer para ter uma chance significativa de conseguir me aproximar.

Não havia movimentação do lado de fora mas eu sabia que eles estavam ali, a minha nuca ainda formigava mas agora estava ficando um tanto desconfortável tentei me virar para subir em uma das árvores quando fui atingido por um corpo menor. Segurei em sua roupa e embolamos alguns metros abaixo até pararmos em uma árvore.

- Oh caramba! - reclamei passando a mão na minha cabeça machucada.

- Cala a boca e me fala agora quem é você! - eu estava encrencado, eu acho. Estava escurecendo mas não era o suficiente para que eu usasse ao meu favor, minha foice também estava longe então teria dificuldades. Minha visão embaçada não me permitiu ver direito quem tinha pulado sobre mim mas agora eu quase engasguei quando vi quem me derrubou. Pele bronzeada, cabelos negros, olhoz azuis e olheiras profundas. Era uma garota. - Fala agora ou te faço de refeição! 

- Ta bem, não precisamos nos alterar. Sou Christian, filho de Tanatos e totalmente inofensivo. - me defendi sorrindo para ela. - Sua vez.

- Estou faminta. - seus labios estavam rachados como se a muito tempo não bebesse água, não passou pela minha cabeça que ela fosse algum tipo de semideusa canibal então comecei a listar os deuses mentalmente para ter certeza disso. Minha distração foi tanta que só senti a dor dos seus dentes em meu pescoço, não podia negar que gostei daquilo. Seu corpo em cima do meu e seus dentes em meu pescoço estavam fazendo alguns lugares criarem vida. Não demorou muito para que ela me soltasse e limpasse a boca com as mangas da jaqueta marrom que usava, seus lábios não estavam mais rachados e nem as olheiras evidentes.

- Meline? - perguntei sorrindo de lado e sentindo a dor do corte no pescoço.

- Hades. - ela se levantou e me ofereceu a mão que eu rapidamente segurei para me apoiar sobre minhas pernas novamente.

- Também viu a Harpia? - perguntei tentando soar gentil, tinha algo nela que me chamava a atenção.

- Vi quase tudo, e como você eu os segui mas não sei nada mais do que isso. - falou se ajoelhando e tentando olhar dentro da casa. Eu ia fazer o mesmo quando uma mão apertou meu ombro levemente.

- Instrusos ou visitas? - era o garoto que eu tinha visto gritando mais cedo. Tentei correr mas ele me empurrou fazendo com que eu rolasse o resto da ladeira abaixo e logo em seguida perdi minha consciência

Relíquias Do Olímpo (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora