A SENSAÇÃO DE QUE EU CONHECIA AQUELE LUGAR SÓ CRESCIA. Eu sentia frio e isso era o suficiente para me causar tremores constantes. Abracei meu próprio corpo para que pudesse me sentir um pouco mais quente. Olhei para o alto e só conseguia ver as copas das árvores, ali não havia céu estrelado nem mesmo céu. Tudo que eu conseguia ver era o emarenhado de galhos retorcidos acima. Eu estava na Floresta.
Eu conhecia parte da floresta, apenas o necessário, assim todos diziam. Era uma regra: todos deveriam conhecer uma parte da floresta, para que assim soubessem o que temer. Mas eu já havia ido além alguma vez? Eu não lembrava. Rivana e eu sempre exploramos juntas muitas partes da floresta e aos arredores do rio Nê. Muitas vezes nós duas íamos sozinhas, Uggo tinha receio e não parava de falar que éramos duas loucas, mas ele nunca nos impediu nem mesmo nos denunciou a outras pessoas. Sempre que estávamos sob as árvores e sendo observadas pelos animais ocultos ali, andávamos de mãos dadas e parecia que ali estava a nossa coragem. Era como se a minha força e a dela formasse um escudo. Eu estava protegida se estivesse com ela ao meu lado e sabia que ela também se sentia assim.
Mas Rivana não estava comigo agora. Eu queria gritar seu nome. Pedir para que ela surgisse como num passe de mágica e segurasse minha mão. O que eu estava fazendo ali?
A neblina era densa e serpenteava por entre as árvores subindo e descendo. Eu podia sentir o peso do ar úmido nos meus pulmões. Olhei para o chão e percebi que estava descalça. Ótima maneira de visitar uma floresta durante a noite! Andei um pouco hesitante e só agora sentia meus pés sendo espetados por galhos e folhas secas, não era uma sensação muito incomoda. Só torcia para não pisar em nada venenoso. Ter a incerteza de onde estava era outro fator que me fazia tremer. A cada passo que eu dava, via mais e mais árvores altas e de aspecto sombrio. Ainda assim, eu sentia como se já tivesse visitado aquela parte da floresta. Quando estive ali? Os sons dos animais noturnos eram abafados e tão distantes e por um instante jurei ter ouvido a neblina sussurrar como se me pedisse para segui-la. Caminhei saindo de onde estava, pisava cautelosamente e já não enxergava o chão sob meus pés. A neblina noturna era fantasmagórica e azulada como se estivesse banhada por uma luz fria de muito longe, da lua ou das estrelas, quis acreditar. Eu conseguia ouvir minha própria respiração descontrolada e também ouvia meu pisar sobre as folhas e gravetos. Pouco me importava se eu seria facilmente percebida por qualquer animal feroz e faminto, meus sentidos estavam determinados apenas a seguir aquele caminho traçado pela neblina pela floresta. Ela serpenteava entre muitas árvores e arbustos altos, andei por elas buscando apoio com as mãos em seus troncos frios. Minhas unhas das mãos estavam cheias de musgo por ter cravado-as em diversos troncos de árvores para não cair, eu também não me importava com isso.
Conforme seguia o caminho indicado pela neblina, logo percebi que estava em uma clareira e o céu acima era estrelado. Me senti aliviada com a visão. As estrelas me faziam lembrar de Uggo e tê-lo em pensamentos naquele lugar era tranquilizador. Minha atenção foi roubada de repente quando ouvi passos se aproximando e grunhidos abafados. Procurei me esconder atrás de uma árvore de tronco largo o suficiente. Novamente eu estava ofegante e cansada, os olhos estavam marejados. Mas eu conseguia ver com nitidez quem se aproximava.
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Além da Floresta | Versão Wattys 2020
Fantasy🏆 VENCEDOR THE WATTYS 2020 NA CATEGORIA FANTASIA🏆 Ellaija vive em um vilarejo isolado e desde sua infância teve consciência dos perigos que se espreitam na misteriosa Floresta que rodeia seu lar. Durante algum tempo todos acharam que a paz havia f...