Capítulo 10 - Não havia inocentes naquela história.

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Eu evitei responder às perguntas de Luna. Ela percebia que eu não estava bem, comentando meu abatimento e palidez. Mas eu desconversava. Pela primeira vez não desabafei com ela nem contei o que me preocupava. Tinha vergonha que ela soubesse o modo humilhante e violento com que eu fora tratada.

Há quase três dias eu não via Simón. Desde quarta-feira de manhã bem cedo, quando ele me acordara avisando que Jonas me levaria para casa com Sophie. Fora incrivelmente frio. Eu saíra de lá humilhada e dolorida, com um ódio imenso dele. Passara aqueles dias apavorada, com medo que ele me chamasse e me machucasse novamente.

Era impossível comparar aquele Simón bruto e violento ao homem que me dera tanto prazer anteriormente. Mas eles eram o mesmo homem frio e que me desprezava.

Na madrugada de sexta para sábado, ao ver que Simón não me ligaria, eu dispensei Clara. Dormia em meu colchonete, por volta das quatro horas da manhã, quando acordei com a voz baixa e fraca de Benício a me chamar. Levantei de um pulo, olhando-o. Meus olhos encheram-se de lágrimas ao fitar seus embaçados e foscos olhos castanhos.

- Sim, meu bem. Sou eu. – Segurei carinhosamente sua mão fria e inerte e beijei-a. – Estou aqui.

- Não consigo... me mexer.

Notei que ele estava consciente da realidade que o cercava. Há muito tempo isso não acontecia e um medo atroz me dominou. Lembrei que os médicos haviam dito que ele teria uma melhora relativa antes de falecer, recobrando a consciência.

- Sente dor, Benício?

- Sede? Eu...

-  Não. Não consigo ver você direito. – Seus olhos sem vida tentavam se fixar em mim. Percebi o desespero em seu rosto. – Acabou, não é? Eu cheguei ao fim.

  -   Não! Você está aqui comigo! Vivo!

- Isso não é vida. – Sua voz era muito fraca e baixa. – Não posso nem tocar em você. Não posso mais nada. Acabe com

-isso, por favor. Acabe com meu sofrimento.

Fiquei muda e surpresa, fitando-o. Benício foi mais explicito:

- Deixe-me morrer, Àmbar. Ninguém vai saber. Por favor. Estou implorando. Você pode fazer isso.

- Não! – Exclamei horrorizada, começando a chorar. – Nunca! Acha que eu poderia matar você?

- Eu já estou morto. Por favor. Sempre foi minha amiga, agora...

-Não! Vou cuidar de você, Benício. Farei de tudo para que não sinta dor e não volte para o hospital. Mas não me peça para ser a sua assassina. Isso nunca. Vamos esperar a hora que Deus quiser.

Apesar de seus olhos meio paralisados e de sua fraqueza, percebi sua expressão de raiva. Por um momento eu me lembrei que ele costumava ficar assim quando se sentia contrariado. Sempre fora mimado e voluntarioso, pois gostava que tudo fosse feito do seu jeito.

- Você é uma egoísta! Esperar a vontade de Deus! Essa é boa! Diz isso porque não é você nessa cama! Merda, não posso nem me mexer! Quando fiquei assim? Não consigo me lembrar...

    -Você sempre me amou. Sempre acabava fazendo o que eu queria. Eu quero morrer, Àmbar. Ajude-me agora.

-Perdoe-me, meu amor, mas eu não posso. Não posso.

-Estarei com você sempre, até o final. Farei de tudo para que não sofra. Mas não posso matá-lo.

Olhei-o bem de perto, tentando controlar meu desespero. Como uma pessoa podia se acabar tanto, sofrer tanto? Ele era tão jovem!

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