Capítulo 1

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Beatrice Dias mais uma vez se abaixou para pegar seus livros que foram jogados no chão, não fez questão de encarar a garota que desde o primeiro ano infernizava sua vida. Agora no terceiro ano do Ensino Médio, a ruiva não via a hora de poder finalmente terminar seus estudos para ficar longe do monstro de saltos altos.

Primeiro Dias achou que eram apenas brincadeiras da loira e que ela apenas queria irritá-la, algo infantil que com o tempo passaria. O que aconteceu foi que ela estava enganada, pois se passaram dois anos de pegadinhas e brincadeiras idiotas e a rica estudante não demonstrava nenhum sinal de que iria parar.

— Com todo o respeito Dias, mas por que você não se vinga? — Rio apareceu enquanto prendia os cabelos castanhos em um rabo de cavalo, logo em seguida ajeitou a franja.

— Porque fazer o mesmo só ia tornar isso ainda mais infantil do que já é. — Beatrice suspirou e caminhou em direção ao seu armário que ficava ao lado das portas do refeitório. Ela colocou pacientemente a senha no armário antes de se virar para Rio que a encarava entendendo o ponto de vista.

Rio sabia muito bem que Beatrice era boa demais para o mundo real e que um dia isso ainda ia acabar com ela, mas permaneceu em silêncio para não estragar as boas intenções da amiga. Lembrou-se de uma situação na infância em que Beatrice havia a consolado, as outras crianças eram preconceituosas e malvadas — Como os pais delas eram — e diziam para  Rio o quão anormal era que ela tivesse dois pais. Beatrice interviu e desde então as duas não se largaram mais.

O problema só ficou sério quando chegaram no ensino médio e não podiam mais ir para as mesmas classes pela mudança dos horários, o que aconteceu foi que Beatrice se viu isolada, e por ter uma personalidade bondosa foi pega facilmente pelo demônio feminino que praticava bullying. Antes Rio estava sempre ao seu lado com sua língua afiada, pronta para responder a qualquer insulto, e durante dois anos, ela não esteve mais.

Isso não balançou a relação das duas mas Rio sabia o quanto aquilo prejudicava sua amiga. Ela era boa demais para pagar na mesma moeda.

— Quem te deu esse direito? — A frase ecoou pelos corredores e todos os alunos se viraram na direção da voz grossa e cheia de raiva.

Johnatan Müller estava ali. Beatrice sabia quem John era porque havia estudado com ele na infância e tinha a memória muito boa, nenhuma daquelas pessoas devia se lembrar dele, nem mesmo Rio. Mas Beatrice lembrava.

— Você acha que está me assustando aberração? — O garoto do time de basquete respondeu enquanto dava uma risada e John sorriu ainda mais largo que o garoto, mostrando as covinhas que em outra situação seriam adoráveis e não ameaçadoras.

— Eu não dou a mínima pra que tipo de fetiche você tem Fernandes, mas se te pegar usando essa merda — Muller segurou o celular no alto e o balançou, Fernandes tentou inutilmente se igualar a altura de John que passava da altura normal de um jovem da sua idade. — pra tirar fotos minhas, eu vou ter o prazer de te fazer engolir.

Beatrice colocou as mãos sobre a própria boca assustada e virou-se para Rio, assistindo a garota prender sem sucesso uma risada.

Müller esticou o celular em direção à Vitor Fernandes e o encarou com uma fúria que parecia ser de outro mundo, quase como se seus olhos estivessem em chamas.

— Senha. — Sua voz soou estrondosa e ele pressionou o pescoço do garoto com uma das mãos, o que já era força o suficiente para deixar o mais baixo totalmente sem ar e sem saída. Ainda resistindo a humilhação que estava passando, Vitor balançou a cabeça negativamente enquanto sorria, tentando em vão tirar a mão de Müller de seu pescoço. — Não reclame então.

Johnatan Müller tirou os dedos do pescoço de Vitor e se afastou, em poucos segundos o celular foi jogado no chão e um barulho alto de metal esmagado foi ouvido quando sua bota preta pisou o celular, quebrando-o e deixando o interior do mesmo à mostra. Nesse momento, Beatrice pode jurar que os olhos de John haviam se tornado escuros como a noite.

— Filho da puta! — Vitor gritou em direção à John e o que ouviu em troca foi uma risada rouca que já se afastava de toda a atenção que havia chamado.

— Da próxima vez que quiser que eu te foda, é só pedir Fernandes.

Assim que a figura com roupas pretas saiu, o corredor se explodiu em vaias e risadas em direção ao jogador de basquete que apenas recolheu o cadáver de seu celular e retornou para o Ginásio de onde provavelmente nunca mais desejava sair.

— Caramba, isso foi intenso! — Rio disse em direção à ruiva sem conseguir esconder a animação que a cena provocara em sua mente.

— E errado também. — Beatrice disse ao fechar o armário e tirar de lá os livros da próxima aula que seria Filosofia.

Rio deu uma risada do moralismo exagerado de Beatrice e segurou a amiga pelo braço, levando-a em direção à sala de história que ficava no andar de cima.

— Qual é Dias, o cara foi errado de querer tirar fotos dele sem permissão.... — Rio defendeu John apenas para ver qual seria a reação da garota em relação à isso e conseguiu exatamente o que queria de volta.

— Eu entendo que deve ter sido ofensivo, mas o que ele fez com o cara do time também não foi legal, existem outras formas de lidar com os problemas além de ser um homem das cavernas. — Dias falou ajeitando os óculos no rosto e a índia ao seu lado se deixou dar um sorriso de lado antes de empurrar Beatrice para dentro da sala.

— Quando lidamos com homens da caverna, também temos que agir como eles! Não se esqueça disso Dias! — A jovem saiu rindo em direção ao ginásio onde teria Educação Física.

Beatrice sentou em uma das cadeiras da frente e respirou fundo, o professor Pedro já havia escrito algumas coisas na lousa antes mesmo de todos os alunos entrarem na sala.

— O trabalho do bimestre é esse seminário sobre o tema Liberdade, e antes que perguntem pois se esqueceram das aulas de português, uma dupla é constituída de duas pessoas. — A sala respondeu à fala do professor com risadas e o mesmo sorriu antes de segurar o seu diário e se sentar na mesa que estava em frente à lousa.

Aos poucos todos os alunos chegaram e se sentaram em suas cadeiras, foi só aí que o professor revelou sua grande surpresa. Era ele quem iria escolher as duplas.

— Não quero ninguém ficando de fora desse trabalho, além do mais, é muito interessante ver vocês surtando. — O professor falou e Beatrice sorriu, não deixou de notar que Johnatan estava sentado logo atrás de Julia, a loira que tornava sua vida escolar um pesadelo.

A única coisa que Beatrice pedia em silêncio era que não fosse colocada como dupla da megera. Nesses seminários ela sempre preferia fazer sozinha, mas o professor estava determinado em estragar seus planos naquele dia.

— O trabalho de vocês vai ser fazer qualquer intervenção que prove seus argumentos, como um experimento. — O professor disse enquanto escrevia a palavra "Duplas" na lousa. — vai ser tudo um sorteio, então vocês não podem me culpar pelo destino.

Assim que o professor começou a tirar os papéis de um chapéu que estava sobre a carteira branca a tensão se espalhou e Beatrice sentiu seus dentes cerrarem, estava mais nervosa que qualquer um dentro da sala.

— Johnatan Müller. — Pedro disse em voz alta e foi possível ouvir um burburinho se espalhar, Beatrice acreditou que a maioria das pessoas também não queriam ser dupla dele.

Müller encarou o professor com uma expressão impassível.

—E Beatrice Dias. — O professor disse com um sorriso em seus lábios e se virou em direção à ruiva, que engoliu em seco o olhar penetrante que recebeu agora do seu novo parceiro de trabalho. Se ele tivesse visão laser talvez tivesse feito um furo na sua cabeça.

Ok, por essa eu não esperava — Beatrice pensou antes de se virar timidamente em direção o rapaz alto.

RuídoOnde histórias criam vida. Descubra agora