Depois de passarem por três casas torres e suas plantações, mais de uma hora mais tarde, já que Yearnan não podia andar normalmente, viram a vila ao longe. O terreno se mostrara mais frutífero no decorrer do caminho, com pastos e árvores variadas. Os arcos em pedra haviam ficado para trás, antes da Assolação.
Ao se aproximarem, viram que a vila era um aglomerado de casas bem construídas, com canos e tubulações expostas nas quinas, ao redor dos batentes das portas, acompanhando as vigas exteriores do enxaimel, contornando chaminés ou abaixo dos peitoris das janelas. Haviam jarros de flores na frente de quase todas as casas, quando não estavam pendurados nas paredes. Grossas estacas presas ao chão tinham no topo uma vela de cera de dragão queimando, com suas chamas das mais variadas cores. O chão da vila era coberto de pedra e algumas varandas dos estabelecimentos comuns estavam abarrotadas de pessoas, rindo e ouvindo música. Máquinas preenchiam os becos, guardadas até o dia seguinte, quando novamente seriam colocadas em funcionamento.
Era uma vila grande.
Ecco entrou numa estalagem, onde uma moça veio logo atendê-lo. O ambiente tinha o chão de madeira polida, assim como a maior parte das paredes. Não havia ninguém ali e as mesas estavam muito bem arrumadas.
– Bem-vindo, senhor. Gostaria de comer?
– Há quartos? – Ecco foi direto.
– Sim. – Ela respondeu. Para quantos?
– Três. Quanto fica?
– Três alanges.
– Feito.
Ecco foi até a porta chamar os dois amigos, que o seguiram até o quarto que a moça os levou. Era uma moça muito bonita, da idade deles, provavelmente. Tinha o cabelo escuro e longo, um olhar sério e intimidante, que se perde em memórias antigas. A boca dela era muito pequena, mas, quando sorria, se alargava incrivelmente. Suas roupas eram comuns, assim como ela: um vestido de lã de carneiro que ia até o chão de cor marrom e cinza, com um cinto na cintura. O braço direito trazia uma fita azul amarrada.
O quarto era confortável, uma grande cama para quatro ou cinco pessoas, uma lareira e uma bacia para banhar. A má iluminação dava um ar de mistério ao lugar. Ecco deu três das muitas moedas que tinha para a garota, que sorriu maliciosamente e disse.
– Por mais uma moeda, eu posso lhe fazer companhia esta noite.
– Mais tarde, talvez. – Ele respondeu, e esperou que se fosse para fechar a porta.
– Galanteador. – Nthaír o provocou.
– De maneira alguma. – Ecco gostava da sensação, ainda assim.
– Eu vou tomar um banho. – Disse Yearnan.
– Eu irei até o refeitório para estudar esses desenhos.
– Conheço o desenho. – Nthaír caçoou.
* * *
– Ecco? – Ochantgar perguntou. Duas visitas em um único dia era mais do que tivera em toda sua vida na prisão.
– Nós não terminamos o que começamos. – Respondeu o intruso.
– Vá embora, Ian. Não arrancará nada de mim.
– Claro que vou. – Duvidou. – Eu sempre consigo o que quero.
Ochantgar limitou-se a desdenhá-lo mais uma vez.
– As pessoas só conhecerão o teu nome por causa de uma balaena estupidamente grande.
– Não há maneiras de dar cabo a mim mesmo. – Retrucou. – Estive em tantas batalhas que não sou capaz de explicar a origem de muitas cicatrizes minhas.
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O Voador
Fantasi(Sobre)vivendo pelas ruas de uma ilha pouco importante ao norte da grande Tormadelli, Ecco se vê entre o dilema de se tornar um aprendiz na Casa do Voador para seguir os passos de seu saudoso pai, ou fugir para longe dos domínios dos érujos. À medid...