"Você levou tudo que tinha direito, mas esse amor você não tem mais"
– Shout Out To My Ex
Perrie dirigia pela Interestadual 5 não acreditando que havia ido tão longe para terminar o seu noivado. As cartas guardadas no porta-luvas do carro mantinham uma certa curiosidade sobre a loira, apesar de achar que no fim poderia ser um conjunto de textos aleatórios sem um significado específico ou até mesmo um experimento escolar antigo, pois já havia ouvido falar de alguns encontrados no mar ou enterrados em dunas.Ao abrir a porta de casa, logo sentiu uma leve pressão contra seu colo após ajoelhar-se no chão. Hatchi lambia todo o seu rosto enquanto fazia carinhos em seu pêlo alaranjado; ela deveria tosá-lo o quanto antes.
— Oi, meu amor — o cumprimentou em um sorriso sem ao menos tentar-se desvencilhar de suas lambidas. Perrie precisava delas.
Hatchi era um anjo em sua vida. Por vezes era seu único companheiro, e naquele momento era o único capaz de fazê-la sorrir. Animais de estimação têm esse poder... Estão sempre ao seu lado e nunca lhe criticam. Em qualquer situação revelam a magia de colorir nem que seja um único quadrado em um mosaico preto-e-branco que pode ser o seu dia; isso faz diferença. Perrie era imensamente grata por ter o cachorro em sua vida e o pobre animal ao menos fazia ideia do impacto que tinha sobre a sua sanidade diária.
A mulher jogou a bolsa no sofá e colocou as folhas abertas no balcão central da cozinha para que secassem o suficiente e serem examinadas com segurança. Enquanto aguardava, encheu a banheira em uma temperatura agradável e, por mais que fizesse isso com pouca frequência, procurou por alguns sais de banho preferidos.
Dia longo. Dia horrível. Perrie respirou fundo tentando se livrar do que havia acontecido até o momento, ou pelo menos digerir o suficiente para não se sentir sufocada. A vontade de chorar ainda permanecia ali presa em sua garganta, mas não tinha forças para tal. Ou talvez a ficha ainda não tivesse caído e seu cérebro precisasse de um tempo para processar o baque de mais cedo. A loira aos poucos sentiu seus músculos relaxarem e acomodou-se ainda mais na banheira. Ali permaneceu por cerca de meia hora e até mesmo permitiu-se tirar um breve cochilo, já que suas pálpebras pesadas insistiam em relaxar por pelo menos um instante.
Logo fora acordada pelos latidos de Hatchi pela casa e dali saiu decidida a não pensar em Henry ou qualquer coisa que pudesse acabar com o pouco psicológico que ainda lhe restava. Para isso, precisava distrair sua mente. Vestiu um roupão e assim desceu as escadas em direção à cozinha, onde se serviu de uma taça de vinho tinto. De onde estava, tinha a vista das cartas abertas no balcão e resolveu aproximar-se.
Precisava distrair sua mente, por que não?
Juntou as quatro folhas já totalmente secas e começou a ler brevemente a primeira que encontrou:
"Minha Querida Janice,
A ensurdecedora rua não te traz mais
Tu já não passas com seu cabelo dançante ao vento.Como um relâmpago, a verdade me atinge:
Te reencontrarei na incerteza da distância.É tarde demais! Nunca talvez!
O cascalho do navio és tão duro quanto a verdade.Ó, Janice que eu teria amado, deveria ter ousado"
— J. Thirlwall.
Perrie largou a folha imediatamente assim que terminou de ler a última palavra, fazendo uma careta. Aquilo parecia ser uma carta real com um texto real. Nada de experimento escolar ou brincadeiras de navegantes. Sentia como estivesse invadindo a privacidade de alguém e isso não lhe fazia nada bem. Sendo assim, começou a pensar duas vezes se realmente deveria ter quebrado a garrafa, porque se encontrava um tanto arrependida. E se fosse uma história real para uma pessoa real? As emoções potencialmente reais que a carta carregavam, envolvidas em toda uma história de vida até então desconhecida por ela... Será que tinha algum direito de ler algo tão pessoal de outrem? E se não, o que faria? Jogaria no lixo? Devolveria para o mar?
Perrie olhava fixamente para a carta em sua frente até que seus pensamentos foram interrompidos por uma notificação de mensagem. O celular estava desligado desde o píer e até aquele momento não havia conferido — não por falta de tempo, e sim, paciência. Verificou o aparelho e encontrou ligações perdidas e dezenas de mensagens de Jesy, Aaron, Sarah e outras mensagens de trabalho. Passou o dedo por algumas procurando pelas mais antigas.
"Jesy Nelson: Não sei se quer conversar sobre o que aconteceu, mas eu estou aqui se precisar"
"Jesy Nelson: Tudo bem, já faz horas desde a primeira mensagem e agora estou ficando realmente preocupada. Me ligue Pezz"
"Jesy Nelson: Você tá bem???? Apenas atenda essa merda de celular caramba!"
[11 chamadas perdidas de Jesy Nelson]
Jesy estava com a loira antes do ocorrido e até então era a única que sabia da história. Perrie suspirou fundo tentando reunir força e coragem para responder, pois se pudesse, enfiaria a cabeça em um buraco de tanta vergonha que sentia naquele momento.
"Perrie Edwards: Oi Jess, eu tô bem. Me desculpe, só vi suas mensagens agora. Retorno mais tarde xx."
Louise respondeu outras mensagens e caminhou até a sala. Só aí percebeu que as cartas haviam lhe distraído de todo o drama de Henry, ainda que momentaneamente. Por Deus, ela havia terminado seu noivado mais cedo! Durante alguns minutos, toda a sua atenção passou a ser voltada para o conjunto de cartas escritas por uma pessoa que ela não fazia a mínima de ideia de quem era. E tem mais: achadas dentro de uma garrafa de vinho tão maltratada pela maresia de San Diego, que não era capaz de identificar a safra — algo que era praticamente especialista.
— Talvez a ideia de passar o resto dos dias boiando na praia não pareça tão ruim — girou a taça entre seus dedos, observando o resto da bebida dançar em sincronia.
A loira acompanhou com o olhar quando Hatchi deu meia volta e cravou os dentes em uma bola de borracha, balançando o fucinho de um lado para o outro. Henry havia comprado o brinquedo meses antes na tentativa de que o cachorro parasse de destruir seus sapatos — curiosamente, apenas os deles.
— Aquele cretino não vai voltar, Hatchi. Acostume-se. — a loira rosnou enquanto ouvia o som do brinquedo.
O som interno aumentava ao passo que o cachorro balançava a cabeça. Perrie fitava impaciente a pequena bola e permaneceu por um tempo até que sentiu um pesar enorme no peito, unindo as sobrancelhas e fechando os olhos para sentir não só a lágrima cair, como a ficha também. Ele não voltaria.
Com os olhos fechados, segurou a taça com ainda mais força e a jogou para longe, ouvindo o som do vidro batendo contra a parede do outro lado da sala. A sensação era nova, libertadora. Os latidos incessantes e assustados do cachorro pareciam aumentar a adrenalina em seu sangue, dando-lhe mais coragem para continuar. Sem pensar duas vezes, arremessou uma pequena escultura que estava em seu alcance, seguida por um vaso de porcelana, e assim fez com o resto da decoração que integrava o aparador, lançando-as com cada vez mais raiva.
Sem mais forças, Perrie encostou na parede atrás de si e deslizou lentamente até o chão com os olhos fechados. Imóvel e em silêncio, ela permaneceu ali até cair no sono esquecendo até mesmo o motivo das lágrimas.
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Wine
RomanceO que você faria se encontrasse uma mensagem destinada a outro alguém? No meio de uma desilusão amorosa, Perrie Edwards encontra uma garrafa na praia de San Diego com algumas cartas dentro. Sua curiosidade a leva até Jade Thirlwall, uma jovem mulher...