02 - Êxodo

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Êxodo

 

Nanquim, China, 1937

Uma suja e fria cela de prisão. As paredes de tijolos de pedra possuíam como abertura para o mundo externo, além de uma pesada e maciça porta de metal, somente uma alta janela gradeada – através da qual tímidos raios solares invadiam o ambiente e se projetavam sobre o chão. Procurando manter-se longe deles, sentado encolhido num canto, um jovem japonês de cabelos negros e curtos tamborilava os dedos de uma mão contra os da outra. Uniforme militar em frangalhos e repleto de manchas de lama, também tinha a pele machucada e roxa em alguns pontos, indicando socos, chutes e coronhadas de rifles.

         Súbito, alguém bateu à porta, o ferro reverberando. Uma, duas vezes. O prisioneiro sequer se mexeu.

         - Rokubungi Takeo? – perguntou uma voz masculina do outro lado, sotaque estrangeiro.

         O detento respondeu por meio do pouco inglês que sabia, torcendo para que o indivíduo compreendesse:

         - Vá embora!

         Breve silêncio. Até que o misterioso visitante insistiu:

         - Quero ver o sargento detido por insubordinação, Rokubungi Takeo.

         Ele não desistiria. Seria melhor ceder de uma vez, para que ao menos fosse logo embora.

         - Está bem – assentiu o prisioneiro.

         Ouviu-se então o som da porta sendo destrancada pelo vigia no corredor. Este foi o primeiro que Takeo viu quando a entrada foi aberta, o ex-colega de Exército lhe lançando um olhar de desprezo. Ganhou a cela, em seguida, quem havia chamado pelo detento. Tratava-se de um homem branco, loiro e um pouco corpulento, vestindo uma farda nazista. Rokubungi já vira alguns deles antes, posando em suas embaixadas e consulados como verdadeiros representantes de uma “raça superior”. Não simpatizava muito com suas figuras.

         Fazendo um sinal para o guarda, o alemão permitiu que a porta tornasse a ser lacrada. Demonstrava não ter medo de ficar a sós com um suposto criminoso.

         - O que você quer? – Takeo questionou em seu inglês precário.

         - Vocês deram um espetáculo e tanto lá fora... – murmurou o visitante, ar irônico. – Já tinha ouvido falar de cercos violentos a cidades, porém creio que conseguiram superar todos os limites. Até mesmo um nazista, Johannes Rabe, compadeceu-se da população chinesa e vem oferecendo abrigo aos sobreviventes, diante do que vocês vêm fazendo. Nossos progroms são brincadeiras de roda perto do massacre aqui em Nanquim.

         - Os soldados chineses se renderam sem lutar – falou o japonês. – De acordo com o Bushido, não pode haver misericórdia diante de covardes. O alto comando ordenou as execuções.

         - Mas você, sargento Rokubungi, recusou-se a cumprir as ordens. Negou-se a atirar em homens desarmados e estuprar suas mulheres. Por isso foi preso.

         O prisioneiro respirou impaciente. Por um momento pareceu prestes a se erguer e socar o nazista, mas se conteve. Não queria piorar ainda mais sua situação.

         - Veio aqui discutir quem mata mais, Hitler ou o Imperador? – inquiriu, franzindo o cenho.

         - Não, sargento. Apenas chamou-me atenção seu ato. Escute... O mundo caminha para uma nova Grande Guerra. Os países mais uma vez se digladiarão uns contra os outros, incluindo os nossos. Ao término desse conflito, talvez o mais devastador já visto, um novo mundo será erguido das cinzas. Um mundo que não terá espaço para Hitlers ou Hirohitos. Apenas pessoas de bem, comprometidas com a evolução da alma humana. Como eu, e o senhor. Alguém que não quis massacrar chineses inocentes.

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