Capítulo III

831 63 9
                                    

Meu rosto não deve demonstrar uma expressão muito boa, a julgar pela reação da diretora. Ela me encara, confusa com a minha preocupação.

— Que foi? Não queria que te adotassem? — Ela se aproxima, apoiando a mão em meu ombro.

— Não. Quer dizer, não é isso. Eu... Não sei. Eu estou surpresa. Não achava que realmente aconteceria.

— Então você quer? Sabe que a opinião da criança conta muito. Se você não quiser, não irá.

Eu não sei porque estou aflita. Talvez a perspectiva de ter uma família; talvez a de ter outra casa; talvez por ter que mudar de rua, bairro ou até de cidade. Eu não sei porque não estou pulando pelos cantos e cantando de felicidade, por finalmente conseguir o que fiquei oito anos esperando, até desistir. Eu não sei por que fico encarando a parede, pensando em tudo e nada ao mesmo tempo.

— E então? — Lurdes consegue me devolver à realidade.

Eu também não sei por que me levanto, olho em sua direção e digo para Lurdes:

— Eu vou.

— Tem certeza, Valentina? — Assinto, quase convencida de que é a decisão certa.

A diretora abre um sorriso genuíno e me abraça, me fazendo perder o ar. Ela não demora muito a me soltar, para me fazer respirar.

— Conhece os procedimentos, não é? Vai ter uma semana para poder arrumar suas coisas e se despedir de quem quiser. Depois vai passar o primeiro mês com a família adotiva, sob observação. Se tudo der certo, depois você vai estar livre do orfanato.

— Certo. Entendi.

— Você deve ter muitas dúvidas. Mas deixe para depois. Agora você tem que descansar.

— Está bem. Boa noite, senhora. — Me levanto e vou em direção da porta, parando antes de sair. — Ah, e eu não sou mais criança.

Não consigo ignorar os olhares dos outros órfãos

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

Não consigo ignorar os olhares dos outros órfãos. Com certeza a notícia se espalhou e todos já estão sabendo. Alguns vieram me parabenizar, outros apenas não param de me olhar com inveja ou até raiva.

Sinto as dezenas de pares de olhos sobre mim até durante o café da manhã, já que estamos todos reunidos na mesa da sala de jantar como é o costume. Tento ficar com os olhos abaixados durante toda a refeição, mesmo não sabendo o porquê de eu estar me escondendo.

O peso dos olhares vai diminuindo à medida que os outros se retiram da sala.

Finalmente sinto que posso relaxar, quando fico sozinha na coxinha com Maria, a cozinheira. Para minha sorte, ninguém precisa lavar a louça comigo.

Cada um de nós que tem uma idade avançada, tem que ajudar com as tarefas do orfanato. Eu acabei ficando com os pratos sujos. Mas, apesar da pilha de coisas para lavar, é o que eu prefiro fazer.

Nova Família, Nova VidaOnde histórias criam vida. Descubra agora