Capítulo XXIII

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A mulher me guia por um corredor fechado, com muitas portas em toda sua extensão. As paredes pintadas de verde-água em uma metade e de azul claro na outra fazem com que o lugar se pareça mais com um manicômio do que um hospital, mas o cheiro característico não deixa dúvidas.

- Fui encarregada de te vigiar, já que sou a única por aqui capaz de me comunicar com você.

O lugar todo está vazio, mas consigo ouvir vozes abafadas, provavelmente vindas dos quartos. As palavras são rápidas e um pouco confusas, dando-me a certeza de serem em outra língua.

Isso me faz lembrar de uma pergunta.

- Como sabe falar português fluentemente? É brasileira, ...? - Então percebo que não sei o nome dela.

Eu preciso saber o nome dela? Isso realmente importa? Ela tinha que ser o inimigo. Todas as pessoas aqui deveriam ser o inimigo. Ainda assim, não consigo encontrar perigo nas vozes animadas e felizes por trás das paredes. Não sinto perigo ao lado da pequena mulher em trajes médicos.

- Carmen de Mairena. - Ela diz seu nome com a pronúncia castelhana. - E não. Eu sou argentina. - Ela suspira. - Convivi muito tempo com sua mãe. Ela me ensinou a sua língua. - A simples menção a ela faz meu coração acelerar.

- Como souberam quem eu era? - Não é exatamente o que eu queria perguntar, mas essa questão também me deixa inquieta.

- Que pergunta. - Ela ri, desacelerando o passo por pouco tempo. - Você não sabe o que fazem os serviços secretos?

- Espionagem. - Minha voz sai num sussurro, sabendo que foi uma pergunta retórica.

- Você facilitou tudo, na verdade. - A mulher continua ao ver minha incompreensão. - Quando foi à gravadora de Arthur. Foi fácil para Júlio obter uma amostra do seu DNA. - Ela alisa meus cabelos. - Foi ainda mais fácil descobrir quem era, já que tínhamos suas informações em nossa base de dados.

Passamos em frente à uma sala com uma janela de vidro enorme, que mostra todo seu conteúdo. As pessoas dentro dela param para nos ver passar, largando os computadores, microscópios e outros aparelhos de laboratório que desconheço o nome.

- Por que têm minhas informações? - Pergunto quando os pesquisadores saem do meu campo de visão. - Eram meus pais quem estavam envolvidos com seu proj... - A visão a minha frente me cala.

Finalmente o corredor chega ao final, despontando em uma sala de estar. As paredes e o piso claros se diferenciam do resto desse lugar, pelo menos a parte que eu vi. A televisão digital e o computador em cima da mesa com os dizeres "recepción" me fazem pensar numa sala de espera moderna de uma empresa privada chique. O que descreve exatamente esse lugar. 

Vejo uma mulher sorridente em frente à mesa da recepção, a recepcionista. Ela acena para Carmen e volta a mexer em alguns papéis empilhados em sua bancada.

A mulher ao meu lado indica o sofá branco para que eu me sente, tomando o assento na frente. Então ela tira algo do bolso de seu jaleco e o apoia na mesa entre nós, bem na minha frente.

- Meu celular? - Por instinto levo minha mão ao bolso dos meus shorts, e constato o óbvio, ele não está lá.

- Vou te dar duas opções agora. - Levanto o olhar para ela. - Você pode ficar aqui e obter as respostas para todas as suas perguntas, ou pode ir para casa.

- Vocês vão me deixar escolher? - Ela assente, me deixando mais insegura.

- Não vamos te segurar à força. Não é nossa refém.

- Não é o que me pareceu até agora. - Lembro da sensação de ser carregada a força e da agulha entrando em minha pele.

- Precisávamos te trazer de algum jeito. Você viria de boa vontade, se tivessem explicado? - Ela não precisa da resposta. Pega o celular e põe em minhas mãos. - Conectei o aparelho à internet. Sua operadora não possui sinal aqui, mas pode se comunicar pela rede social. Acredito que Sharon esteja preocupada.

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