Vejo a dúvida que está em ambos os pares de olhos que estão sobre mim. Querem acreditar e ao mesmo tempo acham impossível. Plausível. Eu mesma me senti assim desde que bati na porta dessa casa.
Pessoas que eu julgava mortas desde que me entendo por gente, que já tive a confirmação de estarem mortas. Pessoas que agora estão na minha frente, olhando para mim.
Ela me soltou assim que falei seu nome, e agora sinto falta do calor de seu abraço. Me olha com as sobrancelhas franzidas, assim como ele, tentando engolir a informação. Ou talvez para descobrir se não sou uma espécie de espiã.
- Acho que isso pertence a vocês.
O colar esteve escondido sob minha regata esse tempo todo, em segurança. Ele nunca saiu da minha vista, nunca ficou distante de mim.
Quando tiro ele e o estendo em minha mão, ambos olham para ela. O reconhecimento passa por seus olhos, lembrando o que são essas alianças.
- Minha filha! - Filha.
Uma palavra que sempre ouvi, falei e pensei, mas nunca teve o mesmo peso que tem agora. Ouvir essa palavra vinda de sua... mãe, pela primeira vez na vida, muda sua perspectiva.
- Você voltou para nós! - Ouço os soluços baixos vindos dela.
- Finalmente.
Meus olhos vão até ele, que nos olha atentamente. Minha mão ainda está estendida, os anéis apoiados um no outro. Estico meu braço mais um pouco, sinalizando para que os pegue.
Ele se aproxima e encosta os dedos em minha mão, mas não tira as alianças. Observo enquanto fecha meus dedos em volta delas e envolve minha mão com a sua, reaproximando meu braço de mim.
Então de repente uma lágrima solitária rola por seu rosto. Ele sorri e chega mais perto, me abraçando também.
Mas o momento acaba rápido demais. Um minuto apenas não consegue dispersar toda uma vida de saudade.
Ambos me soltam quase no mesmo instante e sinto um frio que não tem nada a ver com temperatura. Só percebo que estou chorando quando as mãos dela pousam em meu rosto, enxugando-o.
- Não acredito que esteja aqui. - Seu sorriso se ilumina. O mesmo sorriso que eu vi sumindo pouco a pouco de suas fotos.
- No entiendo como estás aqui. - Ele fala, com o sotaque característico, parecido com o de Carmen. Ele cruza os braços e franze as sobrancelhas.
- Como?
- Tem razão. Por que está aqui? - Suas mãos vão até meus ombros. - Devia estar no Brasil, em segurança. Longe disso tudo. - Sua voz mostra preocupação.
- Eu disse que era uma longa história...
- Nós temos tempo. - Ele diz.
- Bem...
- Querido, calma. - Ela se levanta e vai até ele. - Eu também quero saber, mas isso pode esperar. Veja só como você está!
Ela gesticula para mim.
A regata tem um rasgo na lateral, a calça está toda amarrotada, meus braços têm algumas áreas roxas, vejo meu pé um pouco inchado e com calos, além do sangue seco espalhado pelo meu corpo.
- Vamos dar um jeito nisso. Depois podemos entender em detalhes o que se passou em catorze anos.
- Está bien. - Ele suaviza a expressão, parecendo culpado.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Nova Família, Nova Vida
Teen FictionO que você faria se de repente sua vida virasse de cabeça para baixo? Se tivesse que mudar de casa, ganhasse uma família nova e passasse a viver em um mundo totalmente diferente do dia para a noite? ...