3 de Agosto de 1914

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  Hoje meus pesadelos invadiram o cenário real. Os conflitos invadiram nosso país e se estabeleceram.
  Alemanha declarou guerra à nossa pátria.
  Mortos bombardeados.
  A cidade de Lunéville fora bombardeada. Sangue inocente e francês derramou-se. Com isso, o instinto selvagem e francês está crescendo. O ódio percorre até mesmo os civis. Tanto que nem ouso visitar os botequins.
 "A faca da vida sempre tem dois gumes, de um lado você atinge, e de outro, você é atingido. Não há quem ganhe", lembro de meu avô dizendo isto a mim ainda moleque.
  Minha esposa retirou-me dos devaneios com um baque ensurdecedor da porta. Suas feições eram de profunda melancolia, os olhos encharcados, e quem dera fosse das águas do riacho. Essa memória já me parecia tão distante, tão irreal.
  "Michelle morava em Lunéville, Nique. Ela havia se mudado em poucas semanas. Minha amiga, minha doce amiga", ela disse aos soluços, com palavras atropeladas.
  Michelle. Era a moça bonita que entregara-me o convite do baile de debute de Lotte. A mulher, que se não fosse de seus feitos, talvez Charlotte e eu seríamos somente conhecidos. A morena simpática que alcançou o buquê em nosso casamento e pulava de alegria mais do que os próprios noivos. Seu sonho era casar, e este lhe foi arrancado por pólvora.
  Cancelei todas as minhas tarefas e passei o dia de luto com minha esposa.
   "Lotte, roguei muito pouco para a santinha. Devia ter lhe feito mais novenas. Agora entendo o porquê de pensar nela em tão longo prazo", eu dizia já à noite na cama, acariciando suas costas, com voz chorosa feito menino.
  Charlotte olhou-me no fundo da alma e depositou o beijo mais profundo de sentimentos. Quase podia escutar um "não me deixe" aos intervalos em que voltava a me olhar.
  Nas ruas da Revolução, não era eu que a lhe perdia. Eu a lhe deixava. Seguindo a multidão.

Diário de um SoldadoOnde histórias criam vida. Descubra agora