Dizem que segunda-feira é o pior dia, pois é quando se acaba a folga do fim de semana. Para mim, o pior dia é terça, pois na segunda ainda estamos descansados, e é na terça que cai a ficha que ainda temos longos dias pela frente até a próxima folga. Agora acrescente a este dia tedioso o fato de ter que acordar cedo para ir á escola e ainda em um dia nublado.
Minha nova casa era mais perto da escola, mais ao mesmo tempo longe do trabalho da minha mãe, o que significa que eu tenho que vir andando. Como contava com sua carona, e calculei mal o tempo de caminhada, aposto que chegarei em cima da hora. Quando estou perto do portão da escola, vejo o mesmo aberto. Percebo que não há alunos perambulando ali na frente, o que só pode significar que o sinal já soou. Tudo o que eu preciso fazer é entrar sorrateiramente por aquele portão, chegar a minha sala sem ser vista e inventar uma boa desculpa para a professora, dizendo que não encontrei a diretora para anunciar meu atraso. Com um pouco de sorte, tudo dará certo.
Mas, é claro, eu não possuo sorte.
Mal cheguei no portão e encontrei a diretora a uma certa distância dali. Não consegui reconhecer a mulher que a acompanhava e um garoto que devia ter minha idade por causa da distância. O novato. Com certeza.
A diretora estava de costas para mim, assim como a mulher que julgava ser a mãe do meu mais novo colega de sala e o próprio garoto. Ela devia estar mostrando algo para eles. Eu podia me aproveitar da situação e passar ali de fininho, sem que ninguém reparasse em mim. Mas, como já mencionei, não tenho sorte.
-- Senhorita Sophia, o que faz aqui fora, em seu horário de aula? -- Sua voz retumbou em meus ouvidos. Amaldiçoei-a baixinho ao me virar para encará-la.
A senhora Velazque era uma mulher baixa e rechonchuda, com os cabelos ondulados curtos, e um olhar sempre afiado na direção dos alunos. Eu era seu alvo dessa vez. A mulher de antes já havia se retirado, e seu filho me encarava com olhos curiosos. Ele era alto, como a maior parte dos rapazes da minha idade, com cabelos castanhos ondulados e levemente compridos. Seus olhos castanhos possuiam cílios grandes, que causaria inveja na maior parte das meninas, seu nariz longo e fino, os lábios levemente cheios.
Victória já podia descruzar os dedos.
-- Eu...cheguei atrasada, e como não queria atrapalhá-la... -- Precisei de um grande esforço para inventar uma boa desculpa na hora e não gaguejar -- pensei em esperar a senhora em sua sala.
-- Bom, isso já não importa. -- Ela suspirou. -- Preciso resolver algumas coisas quanto á matrícula do Mateus. Creio que não será problema acompanhá-lo até a sua sala e ajudá-lo no que for preciso, não é Sophia?
-- De modo algum, senhora. -- Fiquei aliviada por ela não se importar com meu atraso.
Assim que ela saiu, eu e o garoto permanecemos em um silêncio constrangedor. Antes que aquilo continuasse, ele se apresentou.
-- Meu nome é Mateus. E você é a ...
--Sophia Bleinn. -- O interrompi, encarando-o antes de voltar minha atenção para o chão.
Encarar pessoas não é meu forte, principalmente depois do modo como ele me olhou quando me apresentei, com mais curiosidade do que antes, e algo que não soube decifrar no olhar. Esse garoto é esquisito. Não conversamos mais enquanto eu o conduzia até a sala, apontando vez ou outra algum lugar importante na escola. Quando chegamos à porta, ele me pediu se podeia acompanhá-lo até a biblioteca durante o intervalo, coisa que não recusei.
Eu me sento na fileira do canto, próxima a porta, e por ironia do destino, o garoto se sentou atrás de mim, que era um dos poucos lugares vagos na sala. No início ele não falava nada, até que depois de quinze minutos de aula ele começou a fazer perguntas sobre o conteúdo, sobre a escola, e passou para assuntos mais aleatórios. Tentei ser o mais sucinta que pude, respondendo com poucas palavras, mas ele não pareceu se importar. Não podia julgá-lo por querer fazer amizades, eu já passei por essa fase quando cheguei aqui. Mas, para o azar desse garoto, eu não era de muita conversa. Ele deve ter notado isso também, pois parou de perguntar e passou a puxar conversa com outros alunos. Vick olhava para o garoto quando ele não podia ver, avaliando-o. Lancei um pequeno sorriso quando me olhou, o que ela retribuiu.
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O Som Mais Bonito
RomanceAção. Percepção. Emoção. Esses eram os três pilares da vida de Sophia Bleinn. Houve um tempo em que seu mundo era repleto de cor e forma. Suas mãos viviam sujas de tinta ou grafite, seus cadernos cheios de esboços. Suas camisas preferidas pareciam u...